“Governo não trata Coimbra com igualdade”, diz Encarnação (na íntegra)

Posted by
Spread the love

P – Concorda que Coimbra perdeu relevo no contexto nacional nos últimos anos?

R – Não se trata de perder relevo. Tenho dito várias vezes, e insisto, que Coimbra tem um problema, de facto, há muito tempo. Porque era um centro absolutamente influenciador do poder, era universidade única, durante muito tempo, o espólio político todo do país estava adstrito a Coimbra, era daqui, e de um momento para o outro isso caiu no chão. Passou a ter concorrência nas universidades, ao nível da representação política, as regras são diferentes, mas muitas pessoas de Coimbra continuam a pensar e a proceder como se ainda fosse possível ressuscitar o tempo antigo. Não pode ser. A pior coisa que pode acontecer a uma cidade é os cidadãos que nela vivem dizerem mal das suas perspetivas, das suas possibilidades, das relações que tem com as outras. Mas tenho visto isso acontecer ao longo do tempo. Na altura das obras na Ponte Rainha Santa Isabel, as pessoas gostavam de dizer: “isto só a Coimbra é que acontece”. Nós só podemos valer por aquilo que somos e conseguimos fazer e é isso que nos deve orientar sempre no presente e no futuro: ser capaz de ser melhor e fazer melhor que os outros. Não há ninguém que nos proteja, e nos últimos tempos, de facto, tem havido gente que nos tem prejudicado, mas penso que agora já todos perceberam isso.

A cidade tem sido prejudicada?

Acho que sim. As condições do jogo agora são diferentes: está toda a gente em pé de igualdade e quem tiver mais argumentos vencerá. A não ser que se introduzam entorses ao equilíbrio do território, ao desenvolvimento, às oportunidades, e essas existem e têm sido instituídas. Não há dúvida que as clientelas de Lisboa e do Porto, grandes regiões, têm sido determinantes no modelo do país e no esquecimento de questões tão relevantes como a posição geográfica de Coimbra e a sua importância como cidade de média dimensão, que tem um papel no equilíbrio do território. Não é possível estabelecer relações de competitividade como eu gostaria, e toda a gente gostaria, partindo de bases tão diversas e em muitas áreas. Nos transportes o Estado dá dezenas de milhões de euros para o Porto e Lisboa e nada para Coimbra. Há uma quantidade de funções que estão a cargo das autarquias e que Lisboa e Porto não têm a seu cargo. Não quero condições de prevalência de Coimbra, mas condições de igualdade. Se há questões para denunciar são estas, que viciam a competitividade entre municípios, e não me tenho cansado de fazer isso.

P – Por isso tem dito que os governos de José Sócrates não gostam de Coimbra.

R – Se houvesse uma atenção em relação a Coimbra, igual à de outras cidades, uma série de problemas já tinham sido resolvidos. Estou a atingir nove anos de mandatos ­- mas se calhar o horizonte até podia ser mais para trás -, e não tenho a estação de caminhos-de-ferro de Coimbra a ser renovada, depois de o concurso ter sido aberto e de estar para ser adjudicada a obra. Não tenho a autoestrada Coimbra-Viseu pronta porque por duas vezes foi colocada a concurso com outras estradas que não tinham interesse e o Tribunal de Contas levantou problemas. E há muitos exemplos. Mesmo nos projetos que foram iniciados e acabados aconteceram coisas extraordinárias. A ligação do IC2 à Ponte Rainha Santa Isabel foi a obra mais demorada por quilómetro deste país, demorou três anos a ser concluída. O IC2 Sul levou outros tantos anos a ser lançado e a ser concluído.

P – A suspensão das obras do Metro Mondego é exemplo disso?

R – Estou a reunir textos que escrevi nestes nove anos para serem impressos e tem sido muito interessante reler o que escrevi sobre o metro. Quando foi estupidamente anulado o concurso público de parceria público-privada para a execução, de uma vez só, do Metro Mondego, desde a Lousã até Coimbra, não me cansei de dizer que o que se iria passar a seguir seria a morte do projeto. Porque era muito difícil realizar o equilíbrio entre tudo aquilo que toda a gente queria e gerar um projeto economicamente rentável e que fosse executado de uma vez só – executando a área mais rentável e toda a restante ao mesmo tempo -, nas condições que se aproximavam. Se havia problemas com a aceitação da solução pela Lousã ou Miranda do Corvo deviam negociar. Hoje em vez do tal circuito alternativo de autocarro entre Lousã e Serpins, já falam em pôr camionetas em toda a linha. Afirmei publicamente que quanto mais se adiasse pior eram as perspetivas para construir o metro.

O que veio a verificar-se…

R – O que aconteceu foi exatamente isso. O senhor presidente do Conselho de Administração da Metro Mondego, que agora está muito queixoso em relação ao Governo, andou três anos a estudar novos percursos, a colocar à câmara alternativas de percurso, para ser mais rentável o projeto em relação a Coimbra, segundo dizia, e esqueceu-se que grande parte do projeto não tinha passageiros no percurso. Se há alguém que não é responsável pela situação a que se chegou é a Câmara de Coimbra e eu em particular. E se há alguém responsável são os governos dos últimos quatro anos e do último ano. Acho que isto deve custar muito ao Partido Socialista, porque a pior coisa que um partido pode ter é um Governo que é da mesma cor atraiçoar aquilo que são os interesses da circunscrição municipal que serve, a pior coisa que pode acontecer a quem concorra pelo PS é perceber que foi envolvido numa trama que tramou a cidade.

P – O novo Palácio da Justiça é uma obra adiada há décadas…

R – Depois de projetos lançados, depois de um projeto de conceção-construção lançado, ainda se está a pensar fazer mais um projeto de conceção-construção. É isto possível numa cidade com a dimensão de Coimbra? E perguntar-me-á se a câmara não pode fazer nada? A câmara não pode fazer mais, porque são questões que dependem do Governo. Por exemplo, não é possível que em Coimbra o Estado não tenha querido participar, como fundador que era, na Fundação Museu da Ciência – tendo saído os ministérios da Cultura e da Ciência e ficado só a câmara e a universidade -, quando em Lisboa e Porto quatro fundações vão receber em 2011, já com os 15% de desconto, 27 milhões de euros do Estado.

P – Empenhou-se pessoalmente no lançamento do concurso do novo Hospital Pediátrico, que também ainda não abriu…

R – Na altura reuniu aqui o senhor ministro Luís Filipe Pereira com os representantes do Pediátrico, e disse-lhe que se queria lançar o novo hospital devia formar uma comissão com eles e o ministério, elaborar o programa e lançar o concurso. E assim foi feito. Depois o Pediátrico teve um momento de completa gaguez, porque alegadamente não havia dinheiro para pagar aos empreiteiros. Houve um hiato de dois anos que teve que ser vencido com uma reunião com o senhor ministro e os empreiteiros. Resolvido o problema do dinheiro, avançou. Agora voltou a parar, porque entretanto passou tanto tempo que surgiram novas exigências, mesmo do ponto de vista construtivo. Nesta altura continuo com uma enorme simpatia a ler o senhor presidente da ARS dizer que o Pediátrico talvez ainda abra este ano. Acho lamentável que abra só este ano.

P – A falta de influência política de Coimbra, apontada por algumas pessoas, pode contribuir para estas situações?

R – Essa é a última das justificações. Eu não tenho que ter um ministro de Coimbra no Governo para poder fazer coisas em Coimbra. Este país é uma democracia que tem de ter em conta os valores da igualdade, do equilíbrio no desenvolvimento do território, da atribuição das verbas com equidade. A influência política até se confunde com falta de inteligência política: então propositadamente não desenvolvem um território municipal? Porquê?

P – Que obras emblemáticas ficam dos seus mandatos para o desenvolvimento da cidade?

R – Tudo aquilo que dependia da câmara foi feito e as obras estão lançadas. Por exemplo, a circular externa foi desenhada há 30 anos e foi executada no meu primeiro mandato. O iParque tinha sido idealizado há muitos anos e foi construído no meu segundo mandato. O Convento de S. Francisco tinha sido pensado há 30 anos e está iniciada a construção durante o meu terceiro mandato. São três exemplos, mas podia multiplicá-los. E aprovámos o primeiro de desenvolvimento estratégico.

P – A aproximação entre a cidade e a universidade tem sido apontada como um caminho para o desenvolvimento de Coimbra?

R – Essa tem sido uma pedra de toque dos meus mandatos e todos sabemos que sem isso é difícil realizar algumas coisas em Coimbra. Por exemplo, no campo cultural, a Fundação do Museu da Ciência é um dos projetos mais ambiciosos que podem gerar. O concurso da universidade a património mundial, suportado e apoiado pela câmara, com condições de desenvolvimento em relação à reabilitação do centro histórico à volta da universidade, é outro dos projetos fundamentais que não podia ser feito sem essa unidade. Os próprios projetos de desenvolvimento tecnológico como iParque não podiam nem deviam ser realizados sem a universidade, e por isso ela é hoje sócia da câmara no iParque, e é um elemento preponderante em relação à aceitação da candidatura de financiamento deste projeto de grande fôlego na região. São três exemplos do que foi feito agora, que não existia, e são fruto de uma relação de grande proximidade e confiança entre as duas instituições. Agora é fácil dizer que este é o caminho, mas quando cheguei à câmara a cidade e a universidade estavam de costas voltadas.

P – Para além da ligação à universidade, que eixos de desenvolvimento são determinantes para Coimbra?

R – Os eixos de desenvolvimento estão definidos, nós aprovámos o Plano de Desenvolvimento Estratégico, porque entendemos que devíamos fixá-los. Dentro da mesma linha de competitividade dos municípios, temos que ver em que áreas podemos ser bons, em que áreas temos vantagens relativas. Se fizermos bem esse exame, não andaremos a desperdiçar noutros sentidos. Por exemplo, o iParque preenchido com empresas de natureza tecnológica significa aproveitar aquilo que é a nossa mais-valia em termos de competitividade. Em relação ao turismo, precisamos de desenvolver o turismo cultural e o turismo de congressos. Mas para isso é necessário ter um centro de congressos, entre outras coisas. Por exemplo, Coimbra recebe grandes manifestações desportivas porque hoje tem condições para a sua prática. Na cultura precisamos de grandes projetos que nos identifiquem, que façam acrescentar àquilo que já temos, do ponto de vista da herança histórica, e outros que consigam desbravar novos caminhos. Quando uma cidade tem condições pode ser competitiva. E a câmara tem um papel muito importante mas não é a dona da cidade, não tem que ter a iniciativa toda, não tem que estar presente em todas as áreas. Tem que confiar na sociedade, nas instituições da sociedade, e pode ajudá-las, mas não pode querer fazer tudo, nem dominar tudo politicamente.

P – Coimbra tem essas condições para ser competitiva?

R – Tem, mas ainda faltam algumas coisas. Por exemplo, no turismo não conseguimos ser competitivos enquanto não tivermos a indústria de congressos montada, enquanto não tivermos uma grande sala de espetáculos como o Convento de S. Francisco. A única sala de espetáculos que tem existido é o Teatro Académico de Gil Vicente que tem mais de 40 anos, foi construído ainda no antigo regime. Sem estas condições não conseguimos ser competitivos.

“Criámos empresas municipais com grande moderação”

P – Foi também nos seus mandatos que foram criadas as empresas municipais…

R – Criámos empresas municipais com grande moderação. Para o projeto das águas e saneamento, que é solidário com toda a região, criámos a empresa Águas do Mondego, que tinha sido impedida de criar pela câmara durante muito tempo. Depois criámos a empresa Águas de Coimbra, a partir da transformação dos serviços municipais, porque elas tinham que estar interligadas, porque havia investimentos nos sistemas de alta e baixa pressão que tinham que ser feitos acompanhados por ambas, dentro do mesmo projeto de financiamento global. E só com base nisso é que conseguimos dar o salto enorme: passámos de 62% para 95% na taxa de cobertura no saneamento. E agora estamos pressionados pelos outros municípios a dar mais dois passos nesta área e foi-nos feita uma proposta pela Águas de Portugal.

Criámos a empresa municipal i Parque, que é sui generis porque tem aberto o seu capital social a outras instituições e empresas e reuniu um conglomerado de instituições sólidas. É uma empresa que foi essencial para realizar o projeto do iParque, não apenas desde o seu início, mas também a partir deste momento, em que vai começar a fazer as construções dos edifícios das empresas.

E criámos a empresa Turismo de Coimbra, porque temos no turismo de Coimbra exigências fundamentais, temos uma marca a defender, a marca Coimbra, que tem um peso enorme na região, no país. E temos uma série de projetos, ancorados nas margens do Mondego, no Convento de S. Francisco, entre outros, que devem ser avocados pela empresa Turismo de Coimbra, com a participação de privados no capital social, que lhe devem dar uma dimensão diferente, suficiente para se afirmar como tal. E a empresa Turismo de Coimbra tem dado resultados, pois seria difícil a câmara desenvolver certas diligências, como a contratação de grandes espetáculos, sem esta unidade empresarial, que por pequena que seja, por modesto que seja o seu gasto, tem de facto um valor acrescentado.

As três empresas municipais são presididas por professores universitários que têm perdido mais dinheiro na sua presidência do que têm ganho. Eles não têm ordenado, têm senhas de presença. Ou seja, não se confirmou a ideia dos que diziam que as empresas municipais eram para dar emprego a uns “boys”, que iam ganhar mais que o presidente da câmara. Para isso bastam-nos as regiões de turismo, cujos presidentes têm vencimentos superiores aos dos presidentes das câmaras.

P – O avanço da verticalização dos sistemas de água, proposto pelo Grupo Águas de Portugal, pode vir a esvaziar de algum modo as funções da empresa municipal Águas de Coimbra?

R – Os dois negócios que a Águas de Portugal propôs à Câmara de Coimbra são a verticalização dos sistemas de águas e a fusão da SIMLIS, que integra municípios da área de Leiria, com a Águas do Mondego. Admitimos estudar estas propostas para verificar que benefícios decorrem daqui. Não é possível financiar os sistemas de saneamento a instalar nos outros municípios da região sem a participação de Coimbra, ou seja, o projeto não pode realizar-se, e isso até recentemente me foi transmitido pela ANMP. Por isso temos de decidir se queremos ou não avançar para a verticalização. Há problemas que se colocam, como a perda de liderança, de relevância da posição. Pode isto ser resolvido por negociações entre as partes, que dêem um estatuto diferente à entidade que se visa criar? Não podemos evitar esta discussão e não podemos deixar de analisar as questões. E não é só porque Coimbra pode receber mais 25 ou 50 milhões de euros, e assegurar a sua independência financeira nos próximos anos, é para analisar se o projeto é bom ou não, se nos convém ou não convém. E o que propomos é analisar o projeto sem preconceitos. Os vereadores do PS – que recentemente nos acusou de não ser solidários com outros municípios em redor – declarou o voto contra em relação ao desenvolvimento do processo da verticalização dos sistemas de água, a proposta que nos feita pela Águas de Portugal para conseguir assegurar o financiamento necessário para resolver problemas de outros municípios. E sem me pronunciar sobre a bondade ou maldade desta iniciativa, porque ela foi aberta à discussão, acho que as pessoas devem decidir se querem ser solidárias ou não. De facto não quiseram ser solidários nas administrações municipais anteriores, durante muito tempo. Passámos a querer ser. Devemos continuar esse caminho ou não?

P – Coimbra está a ser claramente pressionada pelo Governo para integrar a Turismo do Centro. Neste caso os princípios solidários do setor da água não se aplicam?

R – Não, aí a questão é que tem também de haver solidariedade em relação a Coimbra. O que é a região de Turismo do Centro, o que é que ela deveria ser? Deveria ser a unidade de todas as participantes no desenvolvimento turístico desta região. Mas os maiores focos de produção turística na região – Leiria-Fátima, Serra da Estrela e Coimbra – estão os três fora da região de Turismo do Centro, criaram entidades próprias, portanto a ideia da unidade não foi conseguida, foi um falhanço. Quando se faz uma entidade à qual as pessoas são convidadas a aderir, o procedimento de liminar bom senso é votar a localização da sede, que até já existia em Coimbra, tinha um prédio próprio. Foram fazer mais despesa e criar outra sede em Aveiro, mantendo a funcionar a de Coimbra. Portanto, na altura disse que se quisessem que Coimbra participasse seria com igualdade de direitos: votaríamos todos e escolhíamos a localização da sede. Por outro lado, as verbas do turismo têm sido atribuídas de uma forma tal, em que 0,4% e 0,6% cabem respectivamente a Coimbra e a Aveiro. Estamos a falar de uma distribuição das verbas de turismo que se concentra e não é capaz de chegar onde deve. E, nos últimos anos, não vi um programa de promoção turística internacional que tenha Coimbra ou a região Centro. Por último, as verbas atribuídas pelo fundo de turismo. Uma vez, de boa fé, concorri, com um projeto de recuperação da Torre de Anto, e davam-me 10% de comparticipação. Concorri ao QREN com o mesmo projeto e dão-me 70% de comparticipação. Tenho muita pena que a região de Turismo do Centro perca dinheiro não integrando Coimbra, mas não seria necessário que as pessoas percebessem isso antes de decidir o que decidiram? É relevante a entrada de Coimbra ou não é? Ganham todos ou não ganham? Então devem arrepiar caminho, porque com as atuais condições Coimbra continua de fora.

P – Na área da educação justificava-se existir uma empresa municipal?

R – Só admitia a existência de uma entidade desta natureza na área da educação se as condições de atribuição de competências fossem outras. As câmaras municipais, nesta área, têm a capacidade de construir e gerir os estabelecimentos de ensino dos graus mais baixos, até ao 1.º ciclo do ensino básico. Aprovámos a nossa carta educativa e o caminho que determinámos nesta área é o equilíbrio do território, a garantia de satisfação de interesses diretos das populações, designadamente das freguesias, preenchimento do território, aproveitamento de instalações antigas para renová-las para o novo sistema de ensino que está a ser praticado. E nisso temos feito um investimento enorme ao longo do tempo. Com os centros escolares que estão neste momento a ser construídos o investimento é bastante superior a 20 milhões de euros. Portanto, só temos competências de construção e de gestão, não temos competências de pronunciamento em relação ao sistema educativo. O Governo fez há algum tempo uma proposta para abrangermos também as escolas dos graus superiores do ensino básico, mas dissemos que só aceitaríamos essa transferência de competências depois de fazer as contas e se passarmos a ter uma palavra sobre a qualidade do ensino. Se não houver competências transmitidas neste novo modelo não acho necessário desenvolver qualquer mecanismo empresarial. Gerimos esta área com muita dificuldade, de facto, por escassez de pessoal técnico para realizar todas as obras que temos, mas eles têm sido de uma sensibilidade extrema, de uma dedicação sem limites, e têm feito um trabalho exemplar neste esforço enorme em relação ao parque escolar.

“Cada ano que tenho estado na câmara é mais difícil que o anterior”

P – O país e o mundo vivem uma crise económica profunda e o Governo reduziu o montante das verbas a transferir para as autarquias. Esta situação dificulta o trabalho do município?

R – Considero que o trabalho que temos feito é correto, do ponto de vista do desenvolvimento e da preocupação social. Temos estado no caminho certo e com boas soluções, mas os municípios são sempre os elos mais fracos e para o Governo é fácil cortar nas verbas para as autarquias. O Governo diz: não podemos diminuir impostos. Mas depois diz: podemos diminuir os impostos dos municípios. E diminuiu. Há uma absoluta inconsequência.

Cada ano que tenho estado na câmara é mais difícil que o anterior. Gerir o município, o país, num momento de pujança económica é uma coisa, gerir num momento de depressão económica é muito diferente. E aquilo que me anima em relação ao tal balanço hipotético que posso fazer é que temos conseguido fazer tudo aquilo que é essencial, e muito mais coisas, num período particularmente negativo para o país.

P – E a Câmara de Coimbra não é das que está em pior situação financeira. Qual é a dívida da câmara?

R – Não tenho comigo o número exacto, mas é público, está disponível na internet. Mas mais significativo do que esse número é que em função da sua capacidade de endividamento o município de Coimbra está em boa condição. O IMI já é uma parte substancialmente das receitas da câmara.

P – Quanto à região, e ao país, concorda com a regionalização? Com que mapa?

R – Concordo com a regionalização com as cinco regiões plano. Aliás, vivi dois momentos igualmente emocionantes. Quando era secretário de Estado da Administração Interna fiz parte de um Governo que lançou a regionalização. Foi há quase 30 anos, fazia co-equipa com Roberto Carneiro e era meu comissário da regionalização Silva Peneda. Desenvolvemos uma proposta de regionalização, com as cinco regiões, que depois não avançou. Depois, no referendo, participei contra a regionalização, proposta com oito regiões, com as quais não concordava. Nesta altura, se pretendem voltar às cinco regiões plano estou de acordo.

P – Que papel deverá ter Coimbra numa futura regionalização?

R – Coimbra tem esta localização geográfica, está de facto no centro. Tem a sua missão histórica de reequilíbrio do território nacional, entre Lisboa e Porto, tem relações de deslocação, de trabalho, de participação e pertença em relação a outras capitais distritais, que são fundamentais para a densificação da região, e é a maior das capitais distritais desta área. Portanto, Coimbra nunca pode ser ignorada, tem elementos que a tornam um dos núcleos essenciais da região e tem de ser naturalmente o centro da região.

P – Empenhou-se no processo de criação da área metropolitana de Coimbra. O que restou?

R – Tinha lógica a área metropolitana, tinha uma lógica completamente diferente do que nesta altura acontece. O ponto de partida da criação das áreas metropolitanas era dar liberdade aos municípios para se associarem. Mas o ponto de partida que acabou por ser seguido no governo subsequente foi fazer com que as NUT fossem o fundamento da unidade necessária dos municípios, um princípio completamente diferente. O que houve de interessante neste movimento foi que a NUT de Coimbra acabou por ser enriquecida com dois municípios que tinham declarado a sua adesão à área metropolitana – e que não estavam enquadrados na NUT -, que são Mealhada e Mortágua.

P – O Conselho da Região, a que preside, podia ser mais dinâmico na tomada de posições sobre questões que afetam a região Centro?

R – É difícil, depende do que se quer do Conselho da Região. O que eu queria, e insisti para que tivesse esses poderes, era um Conselho da Região interveniente, que tivesse uma palavra a dizer na escolha do presidente da CCDRC, que tivesse outro tipo de poderes na aproximação às questões. Mas o documento constitutivo que foi apresentado pelo anterior Governo está longe disso, e portanto o Conselho da Região tem meros poderes declarativos.

P – O Plano Regional de Ordenamento do Território para a região (PROT-Centro) não foi bem recebido.

R – Os vereadores do PS apresentaram na última segunda-feira, na reunião do executivo, um documento sobre o PROT, mas nós já andamos há cerca de três anos a discordar do PROT e parece que nunca ninguém tinha reparado. O PROT, tal como foi apresentado, é inaceitável para Coimbra. Porque mais uma vez é capturado na lógica do benefício da extensão da área metropolitana do Porto através de Aveiro, na perda de influência da região Centro, no esquecimento das prioridades que deviam ser atribuídas no desenvolvimento das ligações viárias dentro da região Centro, no esquecimento da relevância que Coimbra tem enquanto pólo de desenvolvimento de determinadas valências universitárias. E dizemos isso desde o início, há mais de dois anos. É um processo negocial que é difícil, que é muito conturbado, mas tal como está o PROT-Centro é inaceitável. E estou a dizer isto enquanto presidente do Conselho da Região e da Câmara de Coimbra.

“Continuarei este mandato até que as condições físicas me permitam”

P – Acha que Pedro Passos Coelho é o líder que o PSD precisava para voltar ao Governo?

R – Foi o líder que o PSD elegeu, é o líder do PSD e é o líder que deve disputar eleições.

P – Este é o seu último mandato na Câmara de Coimbra. Está determinado a cumpri-lo até ao fim ou, se fosse solicitado pelo seu partido, poderia voltar ao Governo?

R – O meu partido sabe que tudo o que eu podia fazer por ele já fiz. E portanto o meu partido já não me pode pedir nada, em bom rigor, já não tem moral para me pedir mais o que quer que seja. Fiquei muito agradecido por me ter escolhido três vezes para me candidatar à Câmara de Coimbra, mas nesta altura as condições são colocadas por mim e já não estou disponível para mais nada. Tenho três compromissos absolutamente inadiáveis e essenciais que são as minhas netas, e nesta altura sou avô profissional. Tudo o que fizer a seguir será alguma coisa que farei a par disso.

No meu discurso no Dia da Cidade (4 de julho) disse que iria continuar este mandato até que as condições físicas me permitissem continuar e é isso que volto a dizer. Quando uma pessoa está a assumir uma função tem de saber se está em condições de executar bem a sua missão, do ponto de vista físico, anímico, ou se não está, e deve fazer a sua avaliação. Isto representa uma exigência com nós próprios, de não estar por estar, que é a pior coisa que se pode fazer. Como sabe, eu não pretendia fazer este terceiro mandato na câmara, sempre disse que o objetivo eram dois mandatos e foi esse limite que defendi na revisão constitucional. Só condições excecionais fizeram com que me candidatasse outra vez.

P – Isso significa que pode não ficar até ao final do mandato?

R – Significa que a cada momento tenho de fazer a minha avaliação.

P – Nessa avaliação, neste momento, diria que continuaria em funções?

R – Neste momento, dia 24 de novembro, dia da greve geral, estou em funções.

P – Marcelo Rebelo de Sousa volta a apresentar um livro seu na próxima segunda-feira, em Coimbra…

R – Sim, mas é diferente. Na altura apresentou um livro com crónicas que publiquei, a maior parte delas no Jornal de Notícias. Este é um livro sobre as ações judiciais intentadas contra a Câmara de Coimbra, ou contra mim enquanto seu presidente, e ações da câmara contra outras entidades. Quando era advogado não me pronunciava sobre questões em juízo e continuei a seguir essa regra em qualquer situação. E sempre disse que quando essas ações chegassem ao fim daria conhecimento público delas, embora admita que as pessoas não tenham acreditado, porque acho que nunca ninguém fez isto. E é na exata competência que tenho de dar a conhecer às pessoas, com transparência, o que se passou em cada um dos processos, que entendi que a câmara devia publicar estas peças processuais, também porque a apreciação das questões no tribunal ou em sede de comunicação social é completamente diferente. No livro “A Justiça Transparente” estão as peças finais de 12 processos judiciais, acompanhadas dos pareceres que instruíram algumas das nossas posições, e um resumo dos casos, alguns dos quais envolvem também mandatos anteriores ao meu. São todos casos que já foram julgados, só num deles, relativo à urbanização Jardins do Mondego, existe ainda uma questão em recurso.

P – Falou há pouco de outro livro. Já tem data para a apresentação?

R – Sim, haverá ainda um outro livro, que reúne tudo aquilo que escrevi enquanto presidente da Câmara de Coimbra, e a sua publicação tem também a ver com transparência e a memória histórica. Acho que tudo aquilo que o presidente disse em representação da câmara deve ficar escrito. E alguns textos são capitais para se perceber o que aconteceu em algumas questões, como por exemplo em relação ao Metro Mondego. Admito que esse livro possa ser apresentado uma semana depois deste.

P – O presidente da Académica, José Eduardo Simões, que foi seu diretor municipal, é arguido num processo judicial conhecido. Hoje voltaria a convidá-lo para a sua equipa?

R – Isso não tem sentido. José Eduardo Simões foi diretor municipal durante três anos, deu a sua colaboração à câmara, e depois deixou de o ser. Depois disso já foram nomeados dois diretores municipais. Agora neste processo, nunca me ouviu, ao contrário do que fizeram outras pessoas, constituir-me como vítima dos processos, a ter qualquer palavra contra o Ministério Público, contra a Polícia Judiciária ou contra os juízes. Isso é exemplar para as pessoas poderem ter confiança na justiça.

Leave a Reply

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

*

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.