Opinião – De lesado em lesado

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Bruno Paixão

 

Vendo bem as coisas, fazemos parte deste pequeno mas grandioso País em que praticamente todos somos lesados. Ao que parece, não há maneira de interrompermos a cadeia que vai passando de lesado-em-lesado a fatalidade da nossa sina ofendida.
Os lesados mais conhecidos, e que têm merecido honras mediáticas, são os do BES. Estes terão investido dinheiro em algo que alegadamente julgavam protegido até perceberem que afinal ficaram sem nada. Anos depois, o governo chega a uma solução para tornar menos penosa a perda destes lesados. O Estado avaliza o adiantamento de parte do dinheiro perdido e, se algo correr mal, assume a fatura, que é como quem diz, os contribuintes pagam (pois claro) e ganham em troca o seu nome num cartão do clube-dos-novos-lesados.
Sentindo-se lesado com a solução do governo para os lesados do BES, o Governo Regional da Madeira pede que seja encontrado um “desfecho favorável” semelhante para os lesados do Banif. Assim, se tal acontecer, e se algo correr mal, o Estado assume a fatura, que é como quem diz, os contribuintes pagam (pois claro) e ganham em troca mais um cartão do clube-dos-novos-lesados-que-já-haviam-sido-lesados.
Um jornalista da RTP lembrou-se esta semana de perguntar ao governo “e então os lesados do Banco Privado Português?” E perguntou bem (pois claro), porque se o pedido for atendido, e se algo correr mal, o Estado assume a fatura, que é como quem diz, os contribuintes pagam (isso é certo) e ganham em troca um cartão gold do clube-dos-novos-lesados-que-já-haviam-sido-lesados-antes-de-serem-lesados.
O Presidente Marcelo, que tanto gosta de oferecer medalhas e comendas, devia considerar a sugestão de distinguir os contribuintes portugueses com a “Ordem dos Lesados”, pelos seus altos feitos, suados sacrifícios e zelo na manutenção de uma cultura de grosseiras desigualdades infligidas sob a permissão complacente do Estado.
Noutras esferas, o setor agropecuário ter-se-á sentido lesado com as declarações do Ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, que comparou a concertação social a uma feira de gado.
Fruto de sucessivas más opções de gestão, a CGD requer hoje uma colossal capitalização que decerto implicará custos para o défice, prevendo-se que o Estado injete, pelo menos, 2,7 mil milhões de euros no banco público. O que uns ganham, outros (lesados) perdem. É matemática pura… Por falar em perder, a Forbes estima que em 2016 a riqueza dos mais ricos do mundo tenha aumentado 227 mil milhões de euros só em 2016. O mundo não é redondo: é uma reta bastante inclinada. Isto é a confirmação de que a crise faz enriquecer os mais ricos e empobrecer todos os outros. Uma vez mais, o que uns ganham, outros (lesados) perdem. É matemática pura…
Por cá, as operadoras de comunicações fizeram contratos de centenas de milhões de euros com os clubes de futebol e agora precisam de aumentar as receitas, impondo aos seus clientes aumentos na fatura do fim do mês. E os clubes ainda discutem qual deles ficou mais lesado…
Muito mais se podia dizer. Mas estamos a entrar no novo ano e por isso desejo que não percamos a fé e a esperança no futuro, com liberdade, igualdade e fraternidade.

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