Opinião – “Lux in arcana”

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Manuel Augusto Rodrigues

Os museus Capitolinos de Roma acolhem desde Fevereiro uma importante exposição com documentos provenientes do Arquivo Secreto Vaticano donde saíram agora pela primeira vez. Trata-se de 100 peças do séc. VIII ao séc. XX, bem seleccionadas e reveladoras da grande riqueza do célebre Arquivo dos Papas que possui uma extensão de 85 quilómetros.

O título escolhido, “Lux in arcana”, significa que se pretende captar com rigor os conteúdos dos textos expostos, entendê-los no seu contexto histórico e trazê-los à sua compreensão autêntica. Desvendar o que por vezes se diz serem mistérios ou fantasia, eis o escopo de tão singular exposição na qual se revelam as luzes e sombras da Igreja, ela que se afirma como depositária da mensagem do Evangelho, encarregada de a anunciar a todos os povos.

São documentos em papel, seda, cortiça, pergaminho, provenientes da Ásia, África., América e Europa, contendo bulas papais, diplomas, cartas, breves, registos, processos e códigos. Podemos admirar a bula “Inter caetera” de Alexandre VI sobre a descoberta do novo mundo, a regra de S. Francisco, o processo de Galileu, o édito de Worms de Carlos V, várias cartas de personagens ilustres dirigidas aos papas, como uma de Miguel Ângelo sobre os trabalhos na basílica de S. Pedro.

As secções “Tiara e coroa”, “No segredo do Conclave”, “Santas, rainhas e cortesãs”, “A reflexão sobre o diálogo”, “Hereges, cruzados e cavaleiros”, “Cientistas, filósofos e inventores e “O ouro e o tinteiro” maravilham-nos igualmente com textos de enorme valor. Alguns exemplos: a falsa doação de Constantino, o “Privilegium Ottonianum”, o Dictatus Papae”, a bula “Unam Sanctam” de Bonifácio VIII, o termo do exército papal em 1870 e os Pactos Lateranenses de 1929.

Mulheres célebres como a “filha do papa”, Lucrécia Borgia, Bernardete Soubirous, a vidente de Massabielle, a abdicação de Cristina da Suécia, a última carta de Maria Stuart a Sixto V, a de Isabel de Áustria a Pio IX e o bilhete de Maria Antonieta escrito do cárcere.

Para exemplificar as relações com as outras religiões, cristãs e não cristãs, temos cartas de altos responsáveis de diversas crenças, os textos severos do Concílio de Trento os mais recentes decretos do Vaticano II com que a Igreja assinalou o seu desejo de “aggiornamento” e adaptação ao mundo moderno. De especial interesse se revestem os processos dos Templários, da excomunhão de Lutero, da condenação de Giordano Bruno e os estatutos de Gregório IX contra os hereges, as cruzadas.

Bem como os textos relativos a Copérnico, Voltaire, Erasmo de Roterdão, a máquina voadora de Bartolomeu de Gusmão, o novo calendário gregoriano de 1582 e a confirmação papal da Universidade de Cambridge. Refiram-se, finalmente, preciosos pergaminhos e miniaturas conservados no Arquivo Secreto Vaticano. Quanto ao “período fechado”, aquele que ainda não está à disposição do público, encontram-se por expressa autorização de Bento XVI alguns documentos sobre a 2.ª Guerra Mundial: histórias de prisioneiros e de famílias, uma carta de um familiar de Rosa e Edith Stein.

Na exposição podemos ainda apreciar a ingente actividade desenvolvia pelo Arquivo Secreto Vaticano nos vários laboratórios: o de restauro e conservação de selos; o de conservação, restauro e encadernação; e o de reprodução digital onde já foram obtidas cerca de 2, 5 milhões de imagens.

“Lux in arcana” é uma iniciativa sem precedentes e vem ao encontro de tantas expectativas que constantemente são criadas no imaginário colectivo. O Arquivo Secreto Vaticano constitui um património cultural da humanidade que tem como epicentro da cidade de Roma.

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