Opinião: “Novo Palácio de Justiça em Coimbra. Um silêncio ensurdecedor?”
No passado dia 20 de Fevereiro, teve lugar no Centro de Convenções e Convento de S. Francisco a iniciativa Que Rumo para a Justiça em Coimbra? O Novo campus de Justiça. Foi mais um reforço da pressão que o executivo municipal, e em especial o Presidente da Câmara, tem vindo a fazer nos últimos anos, em boa hora e sempre com o apoio da Universidade, da CIM de Coimbra e das instituições judiciais da cidade e da região.
Sabemos que a aspiração é antiga, tem cerca de seis décadas, sempre com altos e baixos, a verdade é que tem recrudescido nos últimos anos. Mas a essa pressão acresce ainda uma outra, a da instalação em Coimbra de organismos judiciais de carácter central e regional, nomeadamente o Tribunal Constitucional e o Tribunal Central e Administrativo do Centro, que, aparentemente, o anterior governo tinha previsto sedear em Castelo Branco.
A comunicação social já tinha anunciado, em Outubro do ano transato, a cabimentação orçamental de um investimento de cerca de 17 milhões de euros para a construção do novo Palácio da Justiça, ao longo dos próximos quatro anos. O Presidente da Relação e o próprio Presidente da Câmara regozijaram-se publicamente. É inegável que o debate teve múltiplas vantagens, reforçou essa vaga reivindicativa local, que tantas vezes se vê tolhida do seu potencial efetivo, devido a cumplicidades e impedimentos atávicos, sobretudo quando o poder central é da mesma família política do poder local. Por outro lado, e numa atitude infelizmente pouco comum, juntou e fortaleceu a unidade entre as diversas instituições da cidade: o Município, a Universidade, a CIM Região de Coimbra e os diversos organismos judiciais, Comarca, Relação, Procuradoria, etc. Finalmente, e pelo que diz respeito à Universidade, serviu para difundir o conhecimento, prestando também um inestimável serviço à comunidade, quer através da Faculdade de Direito, a prestigiada escola jurídica que teve alguns dos seus professores a apresentar o problema e a comentar as soluções, quer através do Departamento de Arquitetura, que veio também apresentar soluções urbanas e arquitetónicas para o local e para o programa em causa, consumadas ao longo de quatro semestres de trabalho de projeto, de índole académica.
Estiveram então presentes muitos cidadãos e muitas cidadãs, mas acresce que o encontro foi tacitamente agendado para um período pré-eleitoral e participaram no debate todos/as os/as cabeças de lista pelo círculo eleitoral de Coimbra. Todas/os sem exceção afirmaram o seu apoio à construção do novo Palácio de Justiça.
Há um mês atrás, a Senhora Ministra da Justiça, uma das cabeças de lista presentes, proferiu publicamente algumas declarações acerca da construção do novo Palácio, reafirmou o seu compromisso, deixando também a ideia que, através da resolução do Conselho de Ministros de Outubro do ano passado, a atribuição orçamental dos 17 milhões estaria, afinal, dependente da alienação de património…
Não sei se percebi bem. O Arquiteto Augusto da Silva Pinto reabilitou o antigo Colégio quinhentista de S. Tomás para residência dos Condes do Ameal, posteriormente, a DGEMN adequou-o às suas funções atuais de Palácio da Justiça. Desde então e até meados da década de 1960, foi cumprindo o seu papel com grande dignidade. Agora, vamos ter de o vender em hasta pública para angariar dinheiro e construir um novo ao lado?
Agora mais a sério, depois de sessenta anos de espera é necessário, é do mais elementar direito que as condições para a construção do novo Palácio da Justiça de Coimbra sejam claras e transparentes. Afinal de contas, o governo socialista anterior cabimentou ou não cabimentou os já célebres 17 milhões? Podemos ficar descansados, como ficámos aquando do debate de Fevereiro? Ou vamos ter mais surpresas a juntar a todas aquelas que ocorreram ao longo das últimas seis décadas?
Sinceramente, não consigo imaginar nenhuma razão para não estarmos otimistas. A não ser que se arranje nova localização e se descubram algumas “vantagens estratégicas” em continuar a pagar anualmente mais de 800 mil euros de rendas em escritórios e apartamentos espalhados pela cidade. Mas mesmo isso já aconteceu no passado, se bem me recordo. Enfim, ao longo de sessenta anos, tudo o que poderia ter acontecido, já aconteceu. É muito difícil pensar em alguma coisa neste processo que não tenha já acontecido antes, por isso, por falta de imaginação confessa, estamos compelidos a ser otimistas.
Mas as declarações da Senhora Ministra da Justiça já foram há cerca de um mês atrás e, num processo como este, o silêncio pode ser ensurdecedor. O Presidente da Câmara voltou a quebrá-lo — agora numa circunstância inusitada, o 10 de Junho na Sala dos Capelos — perante as mais proeminentes figuras do Estado, incluindo o Primeiro Ministro. Compete agora ao Governo quebrá-lo decisivamente e dissipar os nossos mais que justificados receios.