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Opinião: Nenhuma ferramenta é mais importante

15 de novembro às 11 h33
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Um relatório divulgado esta semana pelo Instituto de Educação, Qualidade e Avaliação (EduQA), sobre o Diagnóstico de Fluência Leitora, feito a quase 93 mil alunos portugueses, conclui que um quarto dos alunos do 2.º ano de escolaridade corre o risco de vir a ter dificuldades de compreensão de leitura no futuro. O diagnóstico foi feito através de um exercício de leitura, que contabiliza o número de palavras lidas num minuto e o número de erros cometidos. Embora os resultados da maioria dos alunos esteja dentro do grau de literacia expectável para este nível de ensino – conseguir ler, em média, 75 palavras corretamente num minuto (os critérios de referência internacionais indicam que o desejável será entre 70 e 130 palavras por minuto) – 25% não vai além das 51 palavras. Isto traduz-se em potenciais dificuldades de interpretação e compreensão de leitura, no futuro, e consequentemente numa maior probabilidade de insucesso escolar. Podemos dissecar os números: como é natural, há diferenças entre alunos falantes-nativos de português e alunos estrangeiros; e parece haver também algumas diferenças entre alunos das escolas públicas e do ensino privado (o que é ainda mais preocupante). Mas é a ideia geral que interessa reter: um em cada quatro alunos a meio do 1.º Ciclo do Ensino Básico não entende o que lê.
Quem não compreende o que lê, não lê. E quando uma criança não lê, há consequências no desenvolvimento da linguagem, nas aprendizagens, mas também na criatividade, na curiosidade, no desenvolvimento do pensamento crítico e no entendimento sobre o mundo – no que dele absorve e no que sobre ele consegue comunicar. Não sendo especialista em Educação, parece-me evidente que o mais importante conhecimento que se adquire nos primeiros 2 ou 3 anos de escolaridade são as competências de leitura (e escrita). É a base para a aprendizagem de tudo o resto: é através da leitura que uma criança aprende – e expande – o seu vocabulário e, como pensamos com palavras, quanto mais e melhor se lê, mais e melhor se pensa. Ler é gerar um raciocínio, um sentido, implica questionamento e interpelação. Só depois de ensinarmos a ler, podemos ensinar a questionar. É esse o principal papel da Educação. A leitura é ainda – e provavelmente sempre será – o principal veículo de conhecimento. Uma criança que não entende o que lê está amputada da sua principal ferramenta de crescimento – intelectual e, até, emocional (porque a leitura também nos ensina a sentir).
A responsabilidade de transformar alunos em leitores capazes não é exclusiva da Escola – como em tudo, preparar uma criança para o futuro é um trabalho de equipa. Também aqui é pelo exemplo que se educa (e ensina). Uma criança que só contacta com livros na escola terá sempre dificuldade em olhar para eles como um prazer, uma porta aberta à descoberta de novos mundos. É preciso que a leitura seja parte do seu dia-a-dia em casa, com a família e os amigos, nos momentos de lazer, nas idas às bibliotecas e às livrarias. É preciso que as crianças vejam os adultos à sua volta a ler. E, acima de tudo, é preciso fazê-las entender a importância da leitura – um desafio complexo, é certo, na era dos ecrãs. Mas 25% não é uma percentagem residual e a leitura não é um pormenor quando falamos em competências. Ensinar a ler é ensinar a pensar – e nenhuma ferramenta é mais importante.

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