Cinco anos depois: o que mudou e não mudou
Foi em outubro de 2020 que aceitei o convite e publiquei o primeiro desta série de artigos mensais sobre território e transportes. Cinco anos depois, é tempo de refletir sobre o que mudou, e o que não mudou, nas cidades e nos caminhos que nos ligam.
Ao longo deste período, debati planeamento do território, transportes e mobilidade, habitação e reabilitação urbana, transição energética e sustentabilidade, bem como governança e políticas públicas. Este artigo sintetiza os acontecimentos de 2020 a 2025 e analisa o papel do olhar técnico e cívico na vida pública.
O contexto global não facilitou a tarefa. Em 2020 e 2021, a pandemia de COVID-19 alterou radicalmente a vida urbana. Em 2022, iniciou-se a guerra em grande escala na Ucrânia e, em 2023, o conflito no Médio Oriente. Se, em 2020, a inteligência artificial parecia ainda uma “miragem”, agora está no nosso dia-a-dia. Em Portugal, a política evoluiu da “geringonça” de António Costa à maioria absoluta do PS em 2022, seguida já de dois (curtos) governos liderados por Luís Montenegro. Em Coimbra, deu-se a transição de Manuel Machado para José Manuel Silva e, mais recentemente, a eleição de Ana Abrunhosa. Apesar das crises, das mudanças políticas e da evolução temporal, o ordenamento do território, a mobilidade e a habitação permanecem como desafios centrais.
A escala nacional revela fortes tensões entre ambição, racionalidade e execução. Os cinco anos mostram indecisões, decisões altamente criticáveis e atrasos em projetos estratégicos, que, lamentavelmente, coincidem num ponto: o forte prejuízo para Coimbra e a Região Centro. No novo aeroporto internacional, houve várias peripécias. Em 2022, uma iniciativa ministerial foi revogada no dia seguinte pelo primeiro-ministro. Já após o estudo da Comissão Técnica Independente, em 2024, um outro Governo anuncia a localização no Campo de Tiro de Alcochete (que se situa em Benavente!), o que cria problemas de integração modal e de acessibilidade, que se tenta justificar com investimentos adicionais na Alta Velocidade e na Terceira Travessia do Tejo. Uma alternativa a norte do Rio Tejo (Ota, Santarém), onde reside 78% da população portuguesa e se concentra a atividade económica, seria mais benéfica para o todo nacional. A Linha Ferroviária de Alta Velocidade Porto-Lisboa manteve-se consensual, mas a (nova) necessidade de servir o novo aeroporto na margem sul do Tejo implica uma bifurcação com um desvio de 70 km e desarticula completamente a conexão com o Centro e o Norte. Para além disso, na ligação a Madrid e à Europa, a priorização do corredor sul (Lisboa-Évora-Badajoz) sobre o corredor norte (Lisboa-Leiria-Coimbra-Aveiro-Viseu-Guarda-Salamanca) coloca Lisboa na total dependência de Madrid, não permite servir a ligação Porto-Madrid (que se faria bem pelo Centro), e limita os benefícios desta ligação internacional a Évora, em vez de toda a Região Centro e partes da Região Norte. No que diz respeito a infraestruturas regionais de importância nacional e internacional, a beneficiação da Linha da Beira Alta acumulou atrasos sucessivos entre 2022 e 2025, e o IP3 entre Coimbra e Viseu continua sem conversão em autoestrada, apesar da elevada sinistralidade e tráfego superior a muitas autoestradas.
À escala de Coimbra e da sua região, há muito a registar. Saúda-se o início de uma operação bem-sucedida do sistema metrobus – que apesar de ainda só circular num troço urbano de 5 km regista já mais de 7 mil passageiros por dia. Aguarda-se a sua total conclusão, substituindo na plenitude o antigo ramal ferroviário, abrindo definitivamente a cidade ao rio e acelerando a regeneração da Baixa. É pena que não sirva cabalmente os três pólos da Universidade de Coimbra. Na Baixa, sente-se uma maior vivacidade, materializada pela abertura do Centro TUMO, do novo Centro de Saúde da Fernão de Magalhães e a requalificação da frente ribeirinha, a que acrescerá a nova sede da Critical Software e o novo Palácio da Justiça. A nova Estação Intermodal de Coimbra, no âmbito do projeto de Alta Velocidade, promete consolidar ligações urbanas, regionais, nacionais e internacionais, articulando os vários modos de transporte e integrando-se na cidade com base no Plano de Pormenor de Joan Busquets. A questão crítica (para os próximos cinco anos) será com certeza a proposta da nova ponte rodoviária do IC2 sobre o Mondego, a acompanhar a ferroviária, já existente, que será atualizada para a alta velocidade. Se, por um lado, permite eliminar os viadutos da Casa do Sal e resolver o congestionamento tanto na rotunda da Casa do Sal como na do Almegue, por outro, aumenta o impacto ambiental nessa área do Choupal. Saliento ainda o desenvolvimento do Estudo Urbanístico da Margem Direita (do Rio Mondego, na Baixa), do Plano Ciclável de Coimbra, e do estudo da ligação entre o nó da A13 em Ceira e o IP3 em Penacova, que fornecem enquadramento e ambição para o futuro.
Cinco anos depois, o território continua a ser o nosso espelho. Ele expressa materialmente as boas e as más escolhas que são feitas e as indecisões que persistem. Engenharia, planeamento e pensamento técnico são essenciais para melhorar o presente e construir o futuro. Aproximar o debate público do conhecimento técnico é fundamental para decisões que melhorem a qualidade de vida e promovam a eficiência e sustentabilidade, evitando que erros estratégicos se repitam e que oportunidades de desenvolvimento se percam.
Nestes cinco anos, tratei de ruas e estradas, comboios, bicicletas e casas, mas o que realmente procurei foi escrever sobre o modo como o território reflete o que somos — e o que queremos ser.

