Opinião: Religiosidade popular ou global

Posted by
Spread the love

Aires Antunes Diniz

Há poucos dias, estando eu perdido na zona do Pinhal, acabei por me perder ainda mais na Sertã, cuja câmara, estando a fazer obras nos seus Paços do Concelho, tinha colocado os seus serviços algures, e como nenhum dos munícipes sertanenses contatados sabia onde dizer estavam acabei por desistir de os encontrar e decidi-me por ir a Vila de Rei.

Aí encontrei na Biblioteca José Cardoso Pires diversos livros do Padre José Maria Félix, onde encontrei a descrição de como: “A renhida demanda veio a terminar por “amigável composição” das partes litigantes. Os Templários cederam ao Rei a lezíria em questão, a portagem de Coimbra e o padroado da Igreja de S. Tiago de Trancoso, El-Rei, por sua vez, outorgou-lhes o padroado da Igreja de Alvaiázere, o senhorio de Vila de Rei e o senhorio de Ferreira com o padroado da Igreja daquela povoação. Legalizou-se isso em Lisboa no dia 6 de Agosto de 1306.1”

Reencontrei-me assim com as formas históricas que explicam como algumas propriedades foram transitando entre o Rei e as Ordens Religiosas, assim como entre ordens religiosas, em que umas ganhavam os que as outras perdiam, tal como aconteceu quando a Companhia de Jesus ganhou propriedades de ordens religiosas que substituiu na propaganda da Fé.

O Padre José Maria Félix conta no seu livro “Fátima e a Redenção de Portugal” como este fenómeno mariano serviu para a conquista do poder político por Salazar, que cita abundantemente, assim como refere o papel de Nunes Formigão na construção ideológica de Fátima, assumindo que Fátima foi a arma eficaz na luta contra o liberalismo e a democracia. Curiosamente, neste livro não refere a conversão da Rússia que entrou na historiografia do fenómeno de Fátima bem mais tarde.

Contudo, este fenómeno canalizou para este lugar antes pobre e economicamente deprimido multidões de fiéis, rivalizando com, e até secando a religiosidade dos lugares tradicionais da Fé Tradicional. Mas, isso foi pensado e dirigido por Bispos como D. Agostinho de Jesus e Sousa, que foi primeiramente de Lamego e depois do Porto, com o objetivo de substituir Lourdes como lugar de peregrinação, havendo por isso em “Fátima e a Redenção de Portugal” um VII Capítulo com o título “Lourdes, a Fátima de França”.

Não admira que alguém como João Paulo Freire enunciasse que há em Fátima “dois casos distintos: um, o facto religioso; outro, a perspetiva turística comercial. O segundo entra nas soluções progressivas duma região, dum concelho, ou simplesmente de um lugar” (João Paulo Freire – Fátima, Livraria Civilização, Porto, 1940, pág. 23 ).

E esse é o verdadeiro milagre de Fátima. Ironizam alguns.

1 José Maria Félix – Senhora Nossa, Senhora Minha, Grandes Oficinas Gráficas “Minerva”, Vila Nova de Famalicão, 1948.

Leave a Reply

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

*

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.