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Opinião: A Europa à deriva e Portugal sem timoneiro

22 de setembro às 10 h22
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Nos últimos meses, França e Inglaterra têm evidenciado sinais claros de estagnação, com crescimentos anémicos que em nada acompanham o dinamismo esperado de duas das maiores economias europeias. A par disso, as contas públicas permanecem cronicamente deficitárias, ano após ano, sem que se vislumbre uma estratégia credível de consolidação orçamental. O resultado é uma dívida pública que não para de crescer e que, em alguns cenários, ameaça tornar-se explosiva.

Este cenário começa a levantar suspeitas sérias de que, mais cedo ou mais tarde, poderá ser necessária uma intervenção externa.

É verdade que dificilmente será uma “troika” nos moldes do programa de resgate que Portugal conheceu, mas não deixa de pairar a ideia de que instituições europeias e internacionais terão de ajuda e impor medidas corretivas.

Espanha apresenta-se como um caso diferente, mas não menos preocupante. Ao contrário de França e Inglaterra, regista taxas de crescimento económico assinaláveis, mostrando uma economia mais vibrante e competitiva. No entanto, essa expansão não tem vindo acompanhada de disciplina orçamental.

Os défices permanecem excessivos e a dívida pública cresce de forma contínua, alimentando receios de que a sustentabilidade das finanças públicas espanholas possa estar em causa. Com eleições previstas para 2027, com fortes probabilidades de antecipação, será inevitável uma reorientação significativa da política orçamental, sob pena de a credibilidade de Espanha junto dos mercados e das instituições europeias ficar comprometida. O dilema espanhol mostra como, mesmo em contextos de crescimento, a ausência de rigor orçamental pode transformar-se rapidamente num problema estrutural.

Ora, tudo isto representa perigos acrescidos para a economia portuguesa. Os nossos principais parceiros comerciais enfrentam dificuldades que podem agravar-se de forma repentina, limitando as exportações e pressionando ainda mais a já frágil economia nacional. A estes riscos somam-se os efeitos das tarifas impostas pelos Estados Unidos. Embora o impacto global na economia portuguesa possa não ser devastador, alguns setores estratégicos, como o têxtil e a confeção, estão já a viver grandes dificuldades, com margens cada vez mais reduzidas, perda de competitividade e desemprego em alta. Portugal, como economia pequena e aberta, não pode ignorar que qualquer turbulência externa se reflete de imediato no seu tecido produtivo e no bem-estar das famílias.

Neste quadro de incerteza internacional, surpreende a leveza com que em Portugal se prepara o próximo Orçamento do Estado. Em vez de enfrentar de forma responsável os desafios que se avizinham, assistimos a um verdadeiro “leilão orçamental”, em que cada partido sobe a parada com promessas, benefícios e medidas de efeito rápido, sem que exista uma visão clara de futuro. Não vemos equacionadas as consequências de uma crise europeia de dívida, nem o impacto de eventuais mudanças na política económica espanhola, nem sequer uma reflexão profunda sobre a vulnerabilidade dos setores mais expostos às tensões comerciais globais. O debate político permanece preso a lógicas de curto prazo, marcadas pelas pressões eleitorais e pela necessidade de responder a emergências diárias.

É urgente inverter este caminho. A economia portuguesa precisa de uma estratégia de crescimento clara e consistente. No imediato, dificilmente se encontrará alternativa a uma política centrada na habitação: trata-se de um setor capaz de responder a um problema social gravíssimo e, simultaneamente, de dar um “boost” à economia, mobilizando investimento, emprego e inovação. Mas isso não chega. É fundamental começar a desenhar um orçamento que não seja apenas reativo, mas que sirva como instrumento para projetar o Portugal do futuro. Um orçamento que vá para além das pressões partidárias e eleitorais, que estabeleça prioridades claras para a competitividade, a sustentabilidade e o bem-estar coletivo. Sem essa mudança de rumo, Portugal corre o risco de ficar à mercê das crises alheias, navegando ao sabor da conjuntura internacional, sem bússola nem desígnio estratégico.

PS: As reformas pedidas pelo relatório Draghi permanecem na gaveta ao mesmo tempo que a economia Europeia perde relevância no contexto global… Um tema a que inevitavelmente voltaremos.

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