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O parto adiado de Coimbra

05 de novembro às 11 h31
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Coimbra tem tido, desde sempre, um papel central nos cuidados materno-infantis. Mas fá-lo entre paredes cansadas, repartida entre as maternidades Bissaya Barreto e Daniel de Matos, num modelo que o tempo desmentiu. Há, pelo menos, duas décadas que se promete uma maternidade única que não sai do papel: maquetes, plantas, conferências e anúncios sucedem-se sem consequência.

Ministros passaram, compromissos repetiram-se, promessas multiplicaram-se, o calendário mudou, mas o parto não: ficou adiado, preso numa gestação interminável de atrasos, recuos, paralisações e promessas incumpridas.

Porquê uma maternidade única? Porque salva tempo. E tempo, em obstetrícia, é sinónimo de vida. A proximidade às especialidades de apoio evita transportes inter-hospitalares de grávidas, acelera decisões e cuidados, reduz risco e melhora a qualidade. Falamos de urgência 24/7, bloco operatório dedicado, cuidados intensivos maternos, neonatologia e cuidados intensivos neonatais, medicina materno fetal, procriação medicamente assistida, anestesia obstétrica e analgesia do parto, imagiologia e laboratório à porta, psicologia perinatal, apoio social e à saúde mental, e muitas outras valências. Numa só casa, com corredores curtos e não em transferências desnecessárias entre vários pontos da cidade.

Os profissionais existem, menos do que seria desejável, e com competência técnica reconhecida. A equipa está feita, o conhecimento mora cá e a escola de Coimbra continua a ser referência. O que falta não é ciência nem projeto funcional, é lamentavelmente a vontade executiva. O impasse acumula-se num labirinto orçamental de “visto”, “cabimento”, “cortes”. Traduzindo: a luz verde do Ministério das Finanças atrasa-se e prejudica as mulheres e os seus bebés. E o relógio biológico, como sabemos, não tolera atrasos incompreensíveis.

Entretanto, perdemos qualidade e motivação, gastamos em duplicações o que falta em modernização, e aceitamos como normal o que é claramente insuficiente. A cidade, e toda a Região Centro, não pedem privilégios, pedem dignidade clínica, eficiência e humanização para grávidas e bebés.

Num tempo de discursos sobre eficiência na gestão e de cortes cegos na Saúde, a concretização de uma maternidade única traria redução de custos indesmentível e melhor resposta às grávidas, menos redundâncias, menos transferências, melhor utilização de equipas e equipamentos, mais segurança.

Coimbra deve ser exemplo, unindo qualidade e concretização num projeto que ponha a tecnologia ao serviço da vida e a ciência ao lado do cuidado. Uma maternidade única, integrada, aberta à comunidade, onde se investigue, se ensine e se cuide com o mesmo rigor e humanidade. Porque nascer melhor é o primeiro passo para viver melhor.

Adiar é decidir contra as mães, pais e os seus filhos. Num país que se quer justo e progressista, isso não é aceitável. Chamemos as coisas pelo nome, este impasse de décadas é uma vergonha nacional. É hora de nascer a solução.

Autoria de:

Carlos Cortes

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