Opinião: Viva Odessa
Vi na televisão uma reportagem sobre a cidade de Odessa, prestes a ser invadida pelos russos comandados por Putin. Na peça jornalística, realçava-se o contraste entre o sarcasmo que os munícipes de Odessa dedicam aos soldados russos e a tristeza de duas mulheres que disseram nunca na vida terem imaginado a possibilidade de serem refugiadas. Mesmo em tempos de guerra, o humor é uma “arma”. Se algum dia formos invadidos, nunca seremos refugiados, ao contrário dos ucranianos. A única fronteira terrestre portuguesa é com Espanha, pelo que seremos, no máximo, náufragos, nunca refugiados. E como pouco ou nenhum humor temos, arma alguma teremos para atirar ao inimigo. Estamos “feitos ao bife”.
A única maneira de nos safarmos, se formos invadidos, será pelo desenrascanço, a única e genuína arma portuguesa. A alta virtude do desenrascanço é, em primeiro lugar, usar as mesmas letras da palavra “alta” (que pouco tem a ver com o povo português) e transformá-la em “lata”, a faculdade de agirmos desobrigados de quaisquer ligações morais. Há que desenrascar a qualquer custo, e a moral nem preço tem.
Se falharmos em demonstrar a priori a fraude de qualquer invasão, pois ninguém imagina o que um país invasor pode querer de Portugal, teremos de avançar em força na publicidade do constrangimento do invasor, evidenciando que se enganou, que obviamente não alcançou nenhum dos seus objectivos, porque alicerçados em falsas premissas.
Seremos, contudo, tolerantes. Negociaremos a sua saída como se de uma rendição nossa se tratasse. Pura poesia da aparência, sob pena de nos tornamos “chatos como a potassa”, pois não temos por onde fugir, nunca seremos refugiados. Colocar-se-á então a questão ao invasor: ou “sai de fininho”, ou tem de “nos gramar”. A nossa capacidade de sermos insuportáveis ultrapassa qualquer hábito casamenteiro, não tem válvula de escape, nenhuma compensação mínima. Seremos o pior dos terrores para o invasor.
E quando nos deixarem, voltaremos às nossas tricas e intrigas, aos nossos segredos mais bem guardados que despertam a paixão dos nossos sentidos. Exaltaremos então, mais uma vez, o nosso amor por Portugal, o amor que sem hesitar despreza qualquer lei para sobreviver. Da mesma forma devem sentir os ucranianos pela sua pátria. Um amor que todos devíamos sentir para impedir o desaparecimento da humanidade.