Opinião: Viva Norberto Canha!
Ontem Coimbra, e a Ortopedia Nacional despediram-se de um dos seus Médicos mais notáveis: o Prof. Doutor Norberto Jaime Rego Canha.
Este transmontano de Alfandega da Fé, nascido em 1929, foi no inicio de vida zagalo de um rebanho de cabras e guardador de vitelos. Tal como o próprio escreve na sua autobiografia, foi assim que aprendeu a observar a natureza, e o que nela se movia. Com os pés na Terra mas a cabeça no Universo, Norberto Canha iniciou a sua procura pelo “outro mundo” e rumou a Angola onde fez a Escola Primária e os estudos liceais. Teve aqui a sua primeira relação especial com “as Africas” que ficariam para sempre no seu coração. Regressou a Portugal para ingressar na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, onde de acordo com o referido por Carmona da Mota, foi o “estudante de referência do seu tempo”.
O seu Curriculum Vitae é exemplar tendo atingido os mais altos graus académicos, cargos médicos ou reconhecimentos institucionais: Professor Catedrático da Faculdade de Medicina, Cirurgião e Ortopedista pela Ordem dos Médicos, Fundador e Director do Serviço de Ortopedia dos Hospitais da Universidade de Coimbra, Presidente e Sócio Honorário da Sociedade Portuguesa de Ortopedia, Socio Honorário da Sociedade Espanhola de Cirurgia Ortopédica e Traumatológica, Presidente do Conselho de Administração dos Hospitais da Universidade de Coimbra, Medalha de Ouro do Ministério da Saúde, Medalha de Ouro da Cidade de Coimbra, são apenas alguns exemplos.
Como seu aluno e mais tarde como seu discípulo, tive a honra e a fortuna de ter estado às ordens do mais prestigiado Director do Serviço de Ortopedia dos Hospitais da Universidade de Coimbra, numa altura em que este serviço era o maior Centro Ortopédico do país e um dos maiores da Europa. Tive a honra e a fortuna de ter usufruído dos aprendizados de um dos maiores Mestres da Ortopedia Nacional, que escreveu vários livros e deixou uma Escola Ortopédica que durante anos deu os seus preciosos frutos. A ele se devem a criação e desenvolvimento das sub-especialidades em Ortopedia e a instalação em Coimbra, nos HUC, daquele que é, ainda hoje, o único Banco de Ossos e Tecidos existente em território nacional.
Mas a maior riqueza de Norberto Canha foi sempre a sua frontalidade, a sua elevada dimensão humanista e uma personalidade que empenhava todo o seu esforço na defesa de Causas.
Tal como escreveu Miguel Silva, um amigo comum com o qual Norberto Canha realizou vários projectos solidários na Guiné, a melhor definição de Norberto Canha “ foi ser um filantropo, num mundo cada vez mais desumano; foi ser um homem frontal, num mundo cada vez mais hipócrita; foi ser um Homem recto, num mundo cada vez mais de gente curva, foi ser um Homem honesto, num mundo cada vez mais cheio de trapaça.”
Foi com enorme emoção que ontem, família, colegas e amigos se despediram do marido, do pai, do avô, do médico e do académico. E fizeram-no com um grito académico, com um enorme e sentido FRA… Porque ontem, não foi um dia de luto… Foi dia de celebrar a vida do meu antigo Director, do meu antigo Mestre, do meu eterno amigo…