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Opinião: Economismo como ideologia única

25 de setembro às 12h30
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Norberto Bobbio aponta como principal traço qualificativo da distinção esquerda-direita o ênfase colocado, pela primeira, nas políticas de igualdade e, pela segunda, nas políticas de liberdade.
A distinção de Bobbio, estabelecida no quadro das democracias parlamentares da década de 70, correspondia adequadamente, na generalidade dos países europeus, à repartição da influência política entre a social democracia, à esquerda, e a democracia cristã, à direita.
No início dos anos 80, contudo, o declínio do prestígio académico das ideias keynesianas, e o correlativo ascender dos economistas filiados na Escola de Chicago, vieram corroer esta fronteira distintiva, com a apologia libertária das virtudes do mercado.
No mundo anglo saxónico, as vitórias de Tatcher e Reagan deram conteúdo político a esta tendência, traduzida, entre outros aspetos, na desconstrução sistémica do poder dos sindicatos, no erigir de novas políticas de desregulação económica e financeira e na construção de leis laborais ditas de flexiseguras.
O fim do bloco de leste, em 1989, na verdade, apenas veio acelerar esta longa marcha do capitalismo associal.
A “terceira via” desenhada pelo sociólogo Anthony Giddens e levada à prática, antes de todos, pelo trabalhista Tony Blair, mais que representar um instrumento ideológico superador da tradicional dicotomia esquerda-direita, representou o capitular definitivo da esquerda social e da direita social, e da substância ideológica dos partidos social democratas e cristão democratas que as encarnavam, a uma nova ideologia que, de modo transversal, capturou a totalidade do espectro político do campo democrático: o economismo.
A astúcia da “terceira via” consistiu, justamente, em atribuir à economia de mercado livre um estatuto de dogmático princípio científico, assim facilitando a sua tradução em ideologia única universalmente válida à esquerda e à direita.
Este triunfo consensual do economismo, que representa, ainda, a substituição do materialismo histórico marxista por um novo materialismo histórico de raiz individualista e liberal, esvaziou de sentido, no essencial, a clássica distinção esquerda-direita, que passou a ter, na maioria dos casos, um valor puramente retórico, quando não folclórico.
À esquerda e à direita, as narrativas políticas e as mundivisões foram substituídas por micro-causas, espetaculares mas efémeras, de tom e cor variados, dominadas por um princípio de moda e, em consequência, temporalmente caducas logo que enunciadas.
Micro- causas que mal beliscam, se é que beliscam, o inamovível pano de fundo das sociedades da produtividade, da aceleração e da exaustão exigidas pela nova, e única, ideologia do economismo.

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