Opinião: Desejos
Amanhã são 198 milhões de euros no maior sucesso da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Os portugueses vão jogar, vão gastar talvez duas vezes este valor. O Estado vai arrecadar metade da receita do jogo directamente, e depois vai buscar 25 % daquilo que os ganhadores recebem. Resumidamente o maior beneficiário do jogo é o Estado. No tabaco as coisas são mais ou menos iguais.
O Estado arrecada a maior parte dos gastos com consumo tabágico. Porque acabaria o jogo e o tabaco? O Estado está cheio de trabalhadores, de funcionários e nem todos são políticos, esses são aliás a ínfima minoria. Os funcionários públicos estão nos Ministérios, nas Câmaras Municipais, nas empresas públicas, nas estruturas de serviços e vigilância, saúde e justiça, educação e repartições.
A larga maioria cumpre com zelo e afinco a sua missão, mas claro que há ovelhas tresmalhadas, cabras flausinas, bodes velhos instalados, borregos deslumbrados. A coisa permite muitos caprinos e ovinos, chegados ao repasto dos salários garantidos pela via da cunha, do compadrio, da solidariedade de cartão. Na actividade do serviço público já houve caprinos grandes que mataram gente. Os excessos da autoridade. As cadeias portuguesas apresentam um índice de mortalidade elevadíssimo e estamos a falar de cidadãos à guarda do Estado.
Mas a administração pública não se construiu em exemplos maus. Diariamente dezenas de milhares de pessoas tentam galvanizar as suas instituições, dão o seu melhor para vencer a adversidade, lutam contra os computadores velhos, contra o imobilismo, conta o excesso de atendimentos.
Medimos o descontentamento com um barómetro inovador. Se te sair amanhã o Euro milhões continuas a trabalhar? A larga maioria saía. Uma ínfima parte ficava. Ficavam os que não estão no atendimento, os que não se cansam muito, os que não sabem o que fazer com o tempo. Quem está cansado zarpava.
Acho mesmo que fica bem afirmar convicto: “eu ia embora amanhã” Já agora, esta sexta feira se sair ao Diogo Cabrita aquela barbaridade de dinheiro, ele disse-me que já não trabalhava mais e até as crónicas do jornal acabavam. Seria um tratado de cumplicidades para cumprir, com os familiares, com os amigos e com instituições solidárias, abnegadas, entregues à luta dos direitos humanos e pela dignidade. E era um forrobodó de viajar.
Então mas o Euromilhões não é um jogo europeu? Muitos desses milhoes não são para as "santas casas" dos outros países? E a Santa Casa não é o Estado…