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Opinião: À Mesa com Portugal–Ovos da Páscoa

30 de março às 12h18
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Já lá vai o tempo em que, ainda estávamos no Carnaval, e já as senhoras andavam a guardar os ovos que as galinhas diligentemente deixavam, entre a palha, no galinheiro. Para que durassem até à Páscoa tinham o cuidado de os colocar em sítio fresco e seco, e por isso, o arcão do milho ou do centeio era um lugar fantástico para a tal. Guardados entre os grãos daqueles cereais, os ovos ficavam a salvo da humidade e do calor.
Em Quinta-Feira Santa, não se vivia só a azáfama das cerimónias da Paixão de Cristo, era também o corrupio dos Folares. Primeiro, havia que fazer o fermento ou o crescente. Com um restinho de massa de uma amassadura anterior, fazia-se o isco que ia dar vida à massa nova. Depois, era juntar ovos, muitos ovos, todos os que se tivesse conseguido armazenar. É claro que tal, dependia muito mais das condições económicas de cada família, do que da vontade individual. Contudo, das múltiplas receitas que recolhi, salta à vista que a quantidade não estaria tanto na receita ideal, mas no equilíbrio mais que perfeito entre os ovos recolhidos e o resto dos ingredientes. Provei folares com mais ovos e outros com menos, e todos me deram o sabor maravilhoso da Páscoa.
Noutras geografias mais a Norte de Portugal, o destino dos ovos guardados entre o cereal era fazer o Pão de Ló. Muitos ovos batidos com açúcar, quase até os braços não darem mais, e o cuidado de pôr pouca farinha numa massa que se queria leve. Por isso, a migração da receita para a Beira entre serras, ficou com o nome de Pão Leve.
Mas, dos ovos que se guardavam, alguns ficavam para decorar a mesa. E aí é ver como o nosso povo é lindo na expressão do que sente. Tingidos, ora com casca de cebola, ora com tinta de um pedaço de tecido, nalgumas situações até se faziam com “feitios”, utilizando as plantas da Páscoa, como o alecrim ou rosmaninho, para o efeito. Uma gracinha a mostrar a abundância da casa.
Sei o significado do ovo, promessa de vida num tempo de deitar a semente a terra e confiança na fertilidade do novo ciclo. Mas, o mais bonito de tudo, é a materialização dessa crença em alimento capaz de nos seduzir somente pela cor. Dos Folares ao Pão de Ló, amarelos, visão linda de morrer e a fazer crescer água na boca. Boa Páscoa!

Pode ler a opinião na edição impressa e digital do Diário As Beiras, edição de 29 de março

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