Opinião: A boa notícia. Mas cuidado com os choques… e com as promessas!
“Salvo choques adicionais, as taxas não continuarão a aumentar”. “Acredito que atingiram o seu pico”. “Se vencermos a batalha contra a inflação, ou seja, se tivermos a certeza de que a inflação estará nos 2%, então as taxas começarão a cair”. Estas declarações são da presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde. Não é que se tratem de nenhum achado extraordinário, nem mesmo de algo inesperado, mas trata-se sim de pela primeira vez, desde o início do ciclo de aumentos das taxas directoras para combate ao aumento da inflação, ouvir da boca da mais alta líder do BCE que estas não deverão continuar a aumentar e que há perspectivas para que em breve possam começar a baixar. Estas declarações foram ditas pela presidente do BCE esta quinta-feira, em entrevista ao canal de televisão France 2.
Também na quinta-feira, a conhecida agencia global de rating Standard and Poor’s (S&P), divulgou prever que o BCE venha a baixar as taxas de juro por três ocasiões ao longo do ano de 2024, sendo a primeira das descidas para meados do ano e as duas seguintes antes do final do ano. Durante a apresentação do relatório anual de perspectivas, intitulado “Economic Outlook 2024”, Marko Mrsnik, director da Sovereign Ratings, afirmou que a S&P não espera que a inflação na zona euro atinja o objectivo de 2% antes de 2025, mas reconheceu que o BCE “fez o seu trabalho de casa” nos últimos meses.
Numa altura em que muito se fala da redução da dívida, em particular da dívida pública, associado naturalmente ao período de pré-campanha eleitoral que se vive no nosso País, importa nunca deixar de lembrar que apesar do rácio do endividamento da economia face ao produto interno bruto (PIB) estar a cair paulatinamente desde Outubro de 2020 por conta do crescimento do PIB, o stock de endividamento de particulares, empresas e sector público continua a engrossar. No global, em valor absoluto, a economia Portuguesa deve cada vez mais – isto segundo os dados (mais recentes) disponibilizados pelo Banco de Portugal. Apesar do discurso político ter interesse que se percepcione o contrário, não devemos hoje menos que aquilo que devíamos no passado, nem mesmo na dívida pública. Na última década, a dívida pública passou de cerca de 224 mil milhões de euros em 2013 para 276 mil milhões em 2023. Isto não é dever menos. Poder-se-á dizer sim, e isso é verdade, que sobre a riqueza que produzimos anualmente, a dívida pública é hoje menor. Mas dessa forma, até quem deixou de pagar ao banco e continua a dever o mesmo, sobre o PIB, passou a dever menos. Os records obtidos pela fiscalidade em Portugal e o superavit das contas públicas não têm servido para pagar dívida, que não haja ilusões a esse propósito.
Foram divulgados também na passada quinta-feira pelo Eurostat, os dados relativos às taxas de poupança e de investimento das famílias na zona Euro. Portugal continua a apresentar as mais baixas taxas de poupança e de investimento entre as famílias. Em relação às poupanças, para além de apresentar a mais baixa taxa de poupança das famílias da zona Euro, apresenta também taxas que são cerca de metade da média ( 7,07% face a 14,02%). No investimento a média da zona Euro é de 9,67% do rendimento bruto e em Portugal é de apenas 5,72%.
Enquanto economia sobre endividada e com comprovada dificuldade em poupar e investir, a perspectiva da redução das taxas de juros é de fulcral importância para o nosso País. Que não apareçam os ditos choques (internos e externos) para que haja alguma tranquilidade na vida dos Portugueses.
Enquanto isso, por cá, está aberta a época da promessa. Já há quem prometa que sobre a sua governação, Portugal será um País de topo na Europa. Gosto do entusiasmo e acho difícil que alguém supere esta promessa, mas vá lá, para que não pareça só anedótico, sejam um pouco mais contidos. Sejam acima de tudo verdadeiros. Portugal precisa, Portugal merece.
*Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.