25 Abril: Livro sobre mudanças em 50 anos realça que o ócio perdeu valor
O ócio enquanto parte da realização individual perdeu valor nos últimos 50 anos, afirmou João Gouveia Monteiro, coordenador científico de uma obra sobre o que mudou em Portugal desde a revolução do 25 de Abril.
“Na nossa relação com o tempo, esquecemos a importância dos ócios, o que nos retira do controlo sobre a nossa própria realização pessoal”, disse hoje o historiador à agência Lusa.
O professor da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC) falava a propósito do livro “Portugal 50 anos depois do 25 de Abril. O que mudou? O que falta fazer”, cujo lançamento em Coimbra está marcado para terça-feira, dois dias antes de o país completar meio século sem a ditadura fascista.
A obra reúne as intervenções dos participantes num ciclo de sete tertúlias, promovido no ano passado pela Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra (BGUC), sobre as mudanças em Portugal no período de 1973 a 2023.
Por exemplo, o debate de encerramento, com André Barata e Manuela Cruzeiro, em 06 de julho, foi subordinado ao tema “Utopias: A liberdade. O tempo”.
Essa sessão, “conduziu-nos aos conceitos de revolução, de memória e de utopia, levou-nos a pensar o tempo e o uso que dele fazemos na hipermodernidade em que vivemos”, escreveu João Gouveia Monteiro numa das sínteses da série.
Com a participação de convidados de diferentes áreas do conhecimento, foram discutidas as principais transformações ocorridas em Portugal desde o fim da ditadura.
“Juntos, pensámos como contrariar a aceleração do ritmo das nossas vidas, que nos impede de viver em plenitude. Também se falou da recriação de lugares habitáveis, capazes de enraizar hábitos, e das implicações sociopolíticas que isso tem, em termos de políticas de promoção da estabilidade profissional e da habitação que evitem que desertemos do nosso próprio país”, resumiu.
O diretor do projeto, que inicialmente não previa a publicação das intervenções em livro, incluindo as do público, lembrou que “a etimologia ‘lugar’ reconduziu-nos, por fim, à revisitação da ideia de utopia (o ‘não lugar’) e à importância que esta tem na reconstrução do nosso quotidiano”.
Trata-se, afinal, da utopia “como ideal que conduz a nossa ação, que faz com que não deixemos de caminhar, por um país e um mundo melhores, em que sintamos … a alegria de ser parte”.
“Os debates foram muito acalorados”, tendo o livro “ficado com uma enorme quantidade de informação atualizada sobre o Portugal de 1974 e o de hoje”, disse à Lusa o docente e investigador da FLUC.
Os temas dos debates são os mesmos dos capítulos da obra: “Demografia e ordenamento do território”, “Cidadania e direitos individuais”, “Ser jovem em Portugal”, “Literacia, cultura e artes”, “Jornalismo, ‘fake news’ e redes sociais”, “Saúde mental e envelhecimento” e “Utopias: A liberdade. O tempo”.
“A juventude enfrenta hoje dificuldades que nós não enfrentávamos há 50 anos, sobretudo no acesso à habitação e ao primeiro emprego”, afirmou João Gouveia Monteiro.
Em 1974, os jovens representavam 30% da população portuguesa. Atualmente, salientou, “não chegam aos 13%”, o que traduz “uma diferente radical”, enquanto tem aumentado o número de idosos: em 50 anos, passaram de 10% para 24%.
O livro inclui textos de Abílio Hernandez, André Barata, António Leuschner, Boaventura Santos, Clara Santos, Diogo de Abreu, Eduardo Castro, Helena Roseta, Joaquim Furtado, Margarida Lima, Maria Vlachou, Manuela Cruzeiro e Paulo Marques.
Editado pela Manuscrito, será apresentado no auditório da Universidade de Coimbra, no dia 23, às 18:00, numa sessão promovida pela BGUC, dirigida por Manuel Portela, também professor da FLUC.