Opinião: A transformação digital e a(s) liberdade(s)

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Escrevo este artigo em Varsóvia, na semana em que comemoramos 49 anos de democracia e liberdade. Antes de 74 estava vedado às portuguesas o direto de saírem do país sem autorização dos maridos ou – se solteiras – dos pais. A esse propósito, vale a pena ver o documentário “O ideal feminino do Estado Novo” (embora de 2014 ), disponível na RTP Ensina. Em 74, a % de portugueses com habilitações superiores era de 0,9% (as mulheres apenas 0,5% da população, dados de 1970 ) sendo que, hoje, 16,8% da população é licenciada, as mulheres representam 60% dos licenciados e são também mais a doutorarem-se: em 1974 doutoraram-se 87 portugueses – 75 homens e 12 mulheres – e em 2021 concluíram 2080. Assim, muito do que faço hoje não me seria permitido há 49 anos só por ser mulher. Muito caminho há ainda a percorrer em Portugal (a igualdade salarial e a liderança feminina, por exemplo) mas há que reconhecer que progressos existiram. Todavia, pelo mundo, não faltam casos em que a tendência é voltar a tempos “medievais”, reduzindo/inibindo o papel das mulheres na sociedade, limitando o seu acesso ao conhecimento, às profissões e, consequentemente, à sua autonomia durante toda a vida.
Muito se tem discutido sobre a forma como a tecnologia nos está também a condicionar as liberdades. Refletir sobre isso, nesta semana da Liberdade, parece oportuno. Para além do tempo gasto por ano em redes sociais (superior ao número de dias de férias/ano), há as estratégias viciantes desenhadas com recurso a algoritmos alimentados por dados que incluem todas as nossas atividades online, para além de nos apresentarem conteúdos “alinhados” com outros que já pesquisámos. Esteja atento, por exemplo, às sugestões dos vídeos do Reels no Facebook e perceberá como se perde a pluralidade e o efeito “serendipity”.
Há cerca de 3 semanas, Elon Musk cumpriu a promessa sobre tornar abertos os algoritmos do Twitter. Ficámos a saber que os likes são o mais importante para o algoritmo, os tweets com imagens/vídeo e texto têm mais alcance, a reputação é contabilizada, ser seguido por pessoas com muitos seguidores dá-lhe visibilidade e, se usar intensivamente hastags (#), o seu ranking irá diminuir. Já se suspeitava que Elon Musk tinha obrigado os seus engenheiros a mudar o algoritmo para impedir que tweets de outras pessoas pudessem gerar mais visualizações que os seus (e a “ira” foi gerada por Joe Biden que o ultrapassou, segundo o Público de 15/02 ). Há 2 dias, não restou a Elon Musk outra opção que não fosse aceitar as exigências da Comissão Europeia, sujeitando-se a uma auditoria prévia às novas regras – previstas para setembro – para plataformas digitais, como condição para aí continuar a operar. O Comissário Europeu Thierry Breton, responsável, na UE, pelo mercado das plataformas digitais, informou que centenas de peritos vão estar envolvidos nesta tarefa, garantindo: “vamos verificar o que se passa com os seus [do Twitter] algoritmos (…), quantos moderadores têm, se são bons em cada uma das línguas” (SAPO, 23/04/2023 ). A promoção da liberdade e das garantias dos cidadãos em relação a informação de qualidade é uma prioridade para a UE que, uma vez mais, afronta as grandes empresas.
E, por falar em grandes fenómenos: porque é que as nossas crianças, adolescentes e jovens adultos (e alguns adultos…) estão viciados no Tik Tok? Falarei disso – e do “desespero” dos pais – na próxima crónica.

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