O Ministro da Saúde, reconheceu (e bem) que está preocupado com a greve dos médicos marcada para 8 e 9 de março, acreditando mesmo ser possível encontrar “pontos de consenso suficientes” nas negociações para evitar mais greves.
É verdade, existem “muitas plataformas de entendimento” para se renovar e revitalizar o Serviço Nacional de Saúde (SNS) para que essas formas de luta não sejam necessárias. Basta para isso, implementar o programa do Governo, assumindo o Ministro da Saúde uma liderança política que clarifique a estratégia na saúde para transformar de vez o SNS.
Infelizmente, os médicos e os restantes profissionais do SNS, têm razão no protesto e luta por melhores condições de trabalho (carreira) e remuneração digna, o que inclui obviamente o recurso à greve. Greve que ocorre devido ao “impasse” de um processo negocial sem propostas reformistas.
Os médicos têm reclamações de que não abdicam. Estas passam por criar condições para atrair e reter os médicos no SNS: a carreira médica deve ter pelo menos mais um grau/categoria, sendo o internato médico o primeiro grau da carreira, horário base de 35 horas com uma remuneração equiparada aos magistrados e repristinação do regime de dedicação exclusiva.
Outras das exigências passam pelo descongelamento imediato da progressão na carreira e a revogação do atual regime de avaliação de desempenho dos médicos, redução de 18 para 12 horas semanais de trabalho no serviço de urgência e o fim das quotas para abrir mais Unidades de Saúde Familiar (USF) de modelo B, generalizando o modelo em todo o país e à carreira hospitalar.
Julgo que são justas estas reclamações e possíveis de acordar e implementar ao longo desta legislatura.
É verdade que o sector da saúde pública (SNS) está particularmente bem posicionado para atrair e reter trabalhadores, incluindo médicos. Estes desejam qualidade de vida, equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, uma carreira previsível e flexível com oportunidades de desenvolvimento contínuo, reconhecimento e valorização do trabalho realizado. Os médicos não querem o multiemprego, a precaridade, trabalho extraordinário atrás de trabalho extraordinário e a ausência de uma carreira multicategorial.
Para isso, o Ministro da Saúde e o Diretor Executivo do SNS não se podem continuar a esquecer que estamos num novo mundo do trabalho que requer uma postura inovadora e antecipatória no recrutamento (concursos sempre abertos), no sistema retributivo misto a generalizar aos hospitais e na escolha transparente das lideranças dos serviços, que exige que quem gere superiormente, apresente uma estratégia viável, reformista e sustentável.
Por exemplo, onde está a criação de uma Academia de Liderança em Saúde para apoiar o desenvolvimento de competências de liderança dos membros dos órgãos das Unidades Locais de Saúde (ULS), Centros de Saúde e Hospitais fortalecendo a capacidade de liderar, valorizando os trabalhadores, a comunicação, a melhoria dos processos e dos resultados na prestação de cuidados de saúde compatíveis com uma gestão pública eficiente? Não está!
Apesar do tema salarial ser um fator básico e aquele em que se centram as atenções, sobretudo numa época de crise, é imprescindível que não se perca o foco em todas as dimensões importantes para atrair, manter e motivar os médicos do SNS.
Tudo isto, escrito no próprio relatório das carreiras médicas, que foi recentemente apresentado pelo Bastonário da Ordem dos Médicos ao Ministro da Saúde.
O SNS precisa de reformas urgentes que mobilizem os profissionais. Precisa de lideranças competentes e sem quaisquer conflitos de interesse!
Esta greve médica pode ser um “alerta” de viragem na governação da saúde, ficando claro que o país precisa de um acordo coletivo para a década entre a classe médica e o governo que passa por uma nova carreira médica, reforçando o SNS,
Mais greves, por falta de capacidade negocial, será a bomba-relógio que levará o SNS a apagar-se.