Opinião: Aparências que iludem

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Imagine que a indústria automóvel seria, doravante, obrigada a pagar pelo tráfego das diferentes marcas nas autoestradas europeias. Ou seja, as concessionárias receberiam a portagem paga pelos utentes-condutores e, também, proporcionalmente de cada marca automóvel que por ali circule. Teria isto algum sentido? Não!
Simplificando, aquele exemplo serve para descrever o que as operadoras de telecomunicações conseguiram convencer a Comissão Europeia a fazer: a pensar numa iniciativa que obrigue os provedores de conteúdo na internet a pagar proporcionalmente pelo tráfego gerado e pela ocupação da banda larga. Evidentemente, que os principais destinatários são as grandes empresas de tecnologia, mas também todas as que prestam serviços audiovisuais (vídeo on demand) ou de streaming (música, por exemplo). Aparentemente até poderia ter sentido, mas será apenas isso: uma aparência.
As empresas de telecomunicações já recebem dos utilizadores-consumidores um pagamento pelo uso da rede. Muitas vezes – está sobejamente documentado – as operadores não entregam sequer o contratado… Não teria sentido receberem duas vezes pelo mesmo serviço, sendo que a infraestrutura sem conteúdos não teria o mesmo valor económico.
Acresce, que esta pretensão das operadoras de telecomunicações fere, aliás, um princípio fundamental e fundador da internet: o da neutralidade da rede, que garante que todos os dados que circulam na rede sejam tratados de forma igualitária, sem discriminação ou preferência por parte dos provedores de acesso à internet. Isso significa que todos os sites, aplicativos e serviços em linha têm, independentemente da sua natureza, a mesma oportunidade de alcance dos utilizadores finais. Esta regra tem sido fundamental para assegurar a inovação, a competitividade, a abertura e a liberdade de funcionamento da internet.
O objetivo concorrencial das operadoras de telecomunicações poderá ser alcançado por outra duas formas: a primeira será por via tributária, através de uma taxa digital a pagar na Europa pelas grandes empresas de tecnologia (essencialmente não europeias) com base nos lucros aqui gerados, tal como tem sido discutido na OCDE; a segunda, com um reforço claro das operações anti-pirataria, cujos serviços (essencialmente de vídeo e música) representam uma percentagem muito considerável do tráfego gerado.

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