Opinião: Não sou professora, mas a luta deles é minha também

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No final do ano passado, um pequeno sindicato convocou uma greve de profissionais da Educação por tempo indeterminado. Depois dessa primeira greve, outros sindicatos juntaram-se à luta e o segundo período escolar do ano letivo arrancou com mais greves agendadas. O gatilho disparou com o início da negociação da revisão do processo de recrutamento de docentes. A possibilidade de municipalização dos concursos (apesar dos desmentidos do Governo) fez com que os professores portugueses chegassem ao limite, mas isso foi só a gota de água que fez transbordar o copo, a encher há anos, e dar início a uma luta que não é apenas dos professores. É de todos nós.
Os motivos de descontentamento são múltiplos: anos de serviço por contabilizar; o caso dos professores contratados, que inclui docentes há vinte anos a contrato (que só recentemente, com a regra dos três anos de serviço, completos e consecutivos, têm a oportunidade de entrar no quadro, o que acontecerá, muito provavelmente, efetivando a centenas de quilómetros de casa); as avaliações de desempenho, com critérios altamente discutíveis e subjugados por cotas; as alterações no acesso à reforma; o excessivo trabalho burocrático – que acresce às tarefas de dar e preparar aulas, corrigir testes, avaliar trabalhos, dar apoios e, em alguns casos, gerir direções de turma – e retira o foco do objetivo principal: os alunos. Os problemas da carreira, os ordenados baixos (especialmente para fazer face às despesas de deslocação), a precariedade, o envelhecimento da classe, as más condições de trabalho e a falta de proteção a docentes com doenças incapacitantes. São estas as lutas dos professores – são estas as nossas lutas.
Ser professor é, mais do que uma profissão, uma vocação. Um bom professor faz magia: ensina um aluno a pensar, mostra-lhe que o conhecimento é uma paixão e um fim em si mesmo, fá-lo amar as letras, os números, a história, as artes. Um bom professor faz bons alunos, faz da escola uma casa de saber e das aprendizagens uma felicidade. É um recurso que não pode ser desperdiçado, tem de ser valorizado e reconhecido. A Educação é mesmo a arma mais poderosa para mudar o mundo, e essa revolução – a do conhecimento – só é possível com professores. Quando os professores lutam por melhores condições, lutam por melhor Ensino e melhor Escola e, com isso, lutam pela Democracia – e essa luta é de todos.
Uma classe feita de homens e mulheres que vivem com a casa às costas; professores itinerantes, sem dinheiro, a viver a centenas de quilómetros das famílias, sem saber como será o ano seguinte; com a marca do cansaço e do desrespeito do país, que tanto lhes deve, não tem condições para cumprir a sua missão, que é uma das mais importantes missões da Democracia. A Escola Pública é, juntamente com o Serviço Nacional de Saúde, a grande conquista de Abril. É o garante de que ninguém tem o destino traçado à nascença e que, mesmo arrancando de uma casa de partida menos favorável, ninguém fica por cumprir. É o garante de que podemos ser mais, e maiores, do que as nossas circunstâncias iniciais. A Educação é um direito fundamental que o Estado tem a obrigação – e o imperativo moral – de garantir e defender. E o Estado somos todos nós. Que a consciência nos pese a todos, e sempre, na defesa deste tesouro. Eu não sou professora, mas a luta dos professores é a minha luta.

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