Opinião: “Legislativas 2022: Portugal precisa do Centro, não de centralismo”

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Todos sentimos que, nas últimas décadas, Portugal se tem vindo a tornar um país cada vez mais centralizado. Em paralelo, neste mesmo período, Portugal sofre de uma generalizada estagnação. Incapaz de crescer e de se desenvolver, o país assiste a uma emigração significativa, em especial dos mais jovens, e, para os que cá ficam, nota-se a contínua deterioração dos serviços públicos (apesar da crescente carga fiscal!). Os resultados estão à vista e são indesmentíveis. Portugal tem vindo a ser sucessivamente ultrapassado pelos países de leste, à medida que estes vão aderindo à União Europeia e aproveitando as oportunidades que esta lhes proporciona.
Não restam hoje dúvidas que a estratégia de centralizar o crescimento em duas áreas metropolitanas – de Lisboa e do Porto – desconsiderando todo o restante país, não produz os efeitos certos. Portugal não só não cresce em termos gerais, como acentua as desigualdades ao longo do seu território, dos vários pontos de vista: económico, social e demográfico.
Na campanha eleitoral em curso, tem-se discutido muito as políticas setoriais – para a saúde, a justiça, etc. – e tem-se discutido muito pouco as políticas territoriais e como é que o território pode ajudar a harmonizar as iniciativas de crescimento de forma a construir um Portugal globalmente mais forte, mais sustentável e mais coeso.
É imprescindível repensar a estratégia de desenvolvimento do país; e o desenvolvimento é indissociável do território onde acontece. O Centro, o Norte interior, o Alentejo, o Algarve, e as regiões autónomas podem ser a chave para abrir um novo ciclo de crescimento. Todos somos Portugal e Portugal precisa de todos nós.
Neste contexto, é primordial afirmar a contribuição que a Região Centro pode dar para o crescimento de Portugal e como esse crescimento, acontecendo aqui, no Centro, irá contribuir para um país mais igual e coeso.
O Centro é a única região de Portugal cujo interior já foi fortemente industrializado. No Norte e no Alentejo, a estrutura económica sempre se baseou na agricultura e na produção animal. Pelo que resta destas raízes industriais, pelos mais de dois milhões e duzentos mil residentes (massa crítica da ordem de grandeza da das áreas metropolitanas), e pelo seu sistema urbano policêntrico único (que assegura uma melhor distribuição geográfica da população e das oportunidades do que em qualquer outra região), o Centro é, neste preciso momento, das Legislativas 2022, a região portuguesa com maior potencial para a criação de valor e para contribuir para o crescimento generalizado do país.
De facto, apesar do exacerbado centralismo das últimas décadas, a Região Centro continua a dar provas de dinamismo e de vitalidade verdadeiramente notáveis e distintas. Com três breves exemplos, de vários âmbitos e a várias escalas, se demonstra isto mesmo. Primeiro, de entre os sete “unicórnios” tecnológicos com raízes portuguesas, a Feedzai é a única destas novas empresas que está sedeada em território nacional. Não é nem em Lisboa, nem no Porto. É aqui, em Coimbra. Segundo, o melhor exemplo nacional de desenvolvimento territorial, na ligação entre o litoral e o interior do país, é a região de Viseu e Dão Lafões, bem aqui, no Centro. Terceiro, os mais extraordinários exemplos de renovação empresarial a partir dos recursos endógenos no interior “profundo” são o ecossistema de inovação do Fundão (em termos gerais) e a Burel Factory (em termos particulares), bem aqui na Covilhã e em Manteigas. Muitos outros exemplos se poderiam dar, como a existência de competências únicas em setores como os moldes, as tecnologias de informação, comunicação e eletrónica, a saúde, etc.
O que falta então à Região Centro?
Numa palavra, união. União, para esquecer os bairrismos, de vista curtas, que se centram em “a minha migalha é melhor do que a tua”, e apenas resultam na afirmação do centralismo. União, para alcançar a força necessária à obtenção dos recursos essenciais à promoção do crescimento. No fundo, falta assumir-se como uma verdadeira região, forte e coesa, que alavanca o crescimento através do respeito e do aproveitamento da sua diversidade.
Há décadas que Aveiro sonha com um Porto de Aveiro capaz de competir com os restantes portos principais da fachada atlântica. Este desígnio de Aveiro tem de ser um desígnio da Região.
Há décadas que a Guarda anseia por uma plataforma logística e porto seco de relevo. A propósito do centralismo, note-se que o projeto do porto seco da Guarda está associado ao Porto de Leixões, não ao de Aveiro! Este desígnio da Guarda tem de ser um desígnio da Região.
Há décadas que Coimbra idealiza uma estação intermodal moderna (e capaz de receber a alta-velocidade), que alavanque o desenvolvimento e integração urbanística da zona norte da cidade, e tem um plano para isso. Mais recentemente, combate sozinha contra o desmantelamento da capacidade instalada na área da saúde. Estes desígnios de Coimbra têm de ser desígnios da Região.
Há décadas que Viseu não tem acesso a nenhum serviço ferroviário e que Leiria, apesar de servida pela Linha do Oeste (uma das mais degradadas do país, e não eletrificada), não está integrada na rede ferroviária principal do país, cuja espinha dorsal é a Linha do Norte. Estes desígnios de Leiria e Viseu têm de ser desígnios da Região.
Há décadas que a Covilhã reclama uma ligação condigna a Coimbra e ao Centro litoral. Esta ligação tem sido incluída nos vários planos nacionais – de fomento, rodoviários, etc. – dos últimos cinquenta anos, mas não é ainda uma realidade. É fundamental concluir as obras do IC6. Este desígnio da Covilhã tem de ser um desígnio da Região.
Há décadas que Castelo Branco ouve promessas eleitorais sobre a construção do IC31, fundamental para uma melhor ligação ao mercado espanhol. Este desígnio de Castelo Branco tem de ser um desígnio da Região.
Imagine-se como seria a Região Centro hoje em dia se tivesse recebido estes investimentos públicos na altura devida. Que desenvolvimento teria alcançado? Que volume de população não teria perdido e poderia até ter atraído? Que contribuição significativa não teria dado para o crescimento de Portugal?
Quando Aveiro cresce, o Centro cresce. Quando Viseu cresce, o Centro cresce. Quando Coimbra cresce, o Centro cresce. Da mesma forma, quando Leiria, Guarda, Covilhã e Castelo Branco crescem, o Centro cresce. E quando o Centro cresce, Portugal também cresce, mais coeso e mais resiliente. Portugal precisa do Centro, não de centralismo.

Pode ler a opinião de João Bigotte na edição impressa e digital do DIÁRIO AS BEIRAS

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