Opinião: Descansa em Paz, Bacalhau

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São várias as palavras que nos vêm à cabeça quando falamos de Natal – Família, presentes, doces…e bacalhau, já que uma Consoada sem umas belas postas de bacalhau não sabe ao mesmo! E é do fiel amigo que irei falar nesta crónica ambiental. Há cerca de dois anos, a ONG Marine Stewardship Council publicou um estudo que referia que cerca de 42% dos Portugueses receava não ter bacalhau na sua mesa em 2040. Será que este receio é fundado?
Começo por relembrar alguns conceitos básicos sobre o tipo de recursos naturais existentes. Alguns são não renováveis, como os minerais, outros são renováveis. Dentro destes últimos, aparecem os recursos não esgotáveis, como a energia do sol ou do vento, e os recursos esgotáveis, como por exemplo os stocks de bacalhau. Quer-se com isto dizer que se a exploração de um stock piscícola for feita de forma sustentável este é um recurso infindável, uma vez que o número de exemplares pescados é reposto de forma equilibrada pelo nascimento e desenvolvimento de novos indivíduos. No entanto, se houver sobrepesca, esta balança desequilibra-se e o stock de peixe começa a diminuir, podendo chegar a um ponto em que se considera esgotado por não haver capacidade de reprodução e sobrevivência em cardume.
Portugal, onde se consome cerca de 20% de todo o bacalhau pescado a nível mundial, assume-se como o maior consumidor deste peixe. A quase totalidade do bacalhau consumido em Portugal é proveniente do Oceano Atlântico, na costa do Canadá, do Oceano Pacífico, na Costa do Alasca, e do Mar da Noruega. Uma vez que o bacalhau proveniente da Noruega representa cerca de 70% do consumo Português, centro-me neste stock que, segundo a Sociedade de Conservação Marinha “apresenta evidências claras de que o stock está a ser capturado de forma insustentável e que a biomassa está a um nível tão baixo que o stock está a sofrer com a redução da capacidade reprodutiva e está esgotado” ( 2019 ). Por outro lado, o aumento da temperatura no Mar da Noruega, como consequência do “aquecimento global”, tem empurrado o bacalhau para as águas mais frias, mais a norte, afastando as atividades piscatórias da costa da Noruega, dificultando a fiscalização e fazendo aumentar as pescas descontroladas ou ilegais, tornando a situação ainda mais crítica.
Poderemos então refletir sobre o que fazer para inverter este cenário tão negativo. Claro que deixar de comer bacalhau seria a melhor opção, mas compreende-se que nem todos estaremos dispostos a abandonar esta dieta que está enraizada na nossa cultura. Não eliminando o consumo de bacalhau, a possibilidade seguinte é a de reduzir o seu consumo, quer através da sua substituição parcial por outros alimentos ambientalmente mais sustentáveis, quer pela substituição por outras espécies piscícolas cujos stocks se encontrem estabilizados, mas sobretudo pela redução do desperdício que é o principal fator de insustentabilidade – segundo a FAO, apenas 65% do pescado chega ao prato dos consumidores, para então o desperdício aumentar em cerca de 15%. De qualquer forma, não eliminando o seu consumo, devemos optar por consumir bacalhau com selo de sustentabilidade como o selo azul MSC ou o Alaska RFM, entre outros certificados que avalizem que o peixe foi pescado de acordo com as normas ambientais. Encorajo o leitor a ver um documentário da Netflix, chamado “Seaspiracy”, que desmonta várias crenças sobre a sustentabilidade dos oceanos e das atividades piscatórias.
Enfim, cada um deve comer como entender por bem, mas deve fazê-lo de forma consciente. Despeço-me, desejando a todos um Feliz 2022.

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