Com a discussão do orçamento de estado para 2022, volta a ser debatido o valor a fixar para o salário mínimo nacional (SMN). A opinião geral será que, consoante se trate da entidade patronal ou do trabalhador, o valor será interpretado como demasiado elevado ou demasiado baixo, respectivamente. Mas permitam-me dizer-vos que nem sempre é assim.
Enquanto entidade patronal, reconheço a necessidade de existir esta figura da retribuição mínima obrigatória e que a mesma tenha que ser capaz de evoluir ao longo dos anos para, no mínimo, salvaguardar a manutenção do poder de compra por parte de todos os trabalhadores que dela auferem, bem como para tentar que nos possamos aproximar dos países da Europa onde nos inserimos. Mas esta problemática não se resume em exclusivo a quem aufere do salário mínimo nacional.
Obviamente que todo e qualquer trabalhador tem na sua perspectiva evoluir profissionalmente e que essa evolução tenha correspondência directa naquilo que é o salário de que usufrui. E é neste ponto que se cria um problema de solução mais complexa e que os números demonstram melhor do que qualquer outra forma. Nos últimos 20 anos o SMN quase duplicou passando dos 4678,7€ de 2001 para os 9310€ de 2021 (rendimento anual). Mas se o SMN quase duplicou, o número de trabalhadores que dele auferiu aumentou mais de 5 vezes, sinónimo claro que o nosso mercado de trabalho não conseguiu fazer evoluir os salários superiores ao mesmo ritmo, fazendo com que uma fatia muito significativa dos mesmos fosse absorvida pelo SMN. Quando centramos a nossa análise nas indústrias transformadoras, que são uma percentagem muito significativa do emprego em Portugal e responsáveis por muitos dos bens “exportáveis” da nossa economia, a percentagem de trabalhadores a auferir do SMN é ainda mais significativa.
Quando, na qualidade de empregadores, temos nos nossos quadros colaboradores exemplares a todos os níveis e que sabem que o são, há a obrigação de criar a diferenciação positiva face aos menos capacitados ou de menor grau formativo, tarefa esta que se assume como sendo cada vez mais difícil. A capacidade remunerativa de cada empresa infelizmente não depende em exclusivo da capacidade de trabalho dos seus quadros de funcionários. Muitos outros factores existem que tornam difícil este relacionamento directo e mais ainda numa fase em que o contexto pandémico colocou novos entraves à capacidade de gerar proveitos a grande parte das empresas do nosso país.
Considero que para a realidade do nosso país, e no contexto em que Portugal se inclui como “oferta” no contexto europeu, o SMN existente é suficientemente elevado e não é este o problema principal. O problema é sim, a meu ver, a falta de capacidade que temos em termos económicos para fazer evoluir o salário dos colaboradores para além do mínimo legal e em prazos mais curtos. Não considero que seja desadequado o pagamento de 665€ (vezes 14 salários) a um colaborador em início de carreira. Considero sim desadequado e acima de tudo injusto que um colaborador exemplar (ressalvo o exemplar) se veja a auferir do SMN ao fim de 10 anos de carreira.
É necessário um esforço conjunto para recuperar o valor das carreiras profissionais e não creio que a solução seja a imposição de um aumento do SMN. Ao empresário compete libertar margem da sua actividade e remunerar o melhor possível. Ao trabalhador, procurar a sua constante evolução para merecer melhor remuneração. Mas acho também que ao estado compete não honorar excessivamente os rendimentos do trabalho para que a diferença entre o que é pago por quem emprega e o que é recebido por quem trabalha seja menor.
Não é apenas uma questão do mínimo. É o mínimo, o médio e porque não o máximo.
*Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico