Opinião: “A evolução das práticas desportivas e das transformações sociais”

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Encerraram-se os Jogos Olímpicos de Tóquio. Há 125 anos, em Atenas, Pierre de Coubertin iniciava as Olimpíadas da Era Moderna. Progressivamente, o desporto entendido como processo de emancipação da humanidade e harmonia entre nações, metamorfoseou-se com a política e a economia. Talvez que o contexto pandémico em que se realizaram os Jogos de Tóquio tenham atenuado possíveis críticas sobre os desenvolvimentos do desporto, contudo colocam-se-lhe inúmeros e enormes desafios em resultado da evolução das práticas desportivas e das transformações sociais.
Atendendo à forma como o desporto acontece, identificam-se cinco desafios inevitáveis. O primeiro consiste em superar desigualdades e exclusões de um mundo marcado por linhas abissais de desenvolvimento económico e estabilidade política, onde inevitavelmente os representantes dos países mais poderosos se impõem aos demais. A este propósito, sugere-se não nos iludirmos com o medalheiro olímpico, mas que se tenha em atenção quem vence títulos nas diversas modalidades, ou quais os países que nem sequer conseguem os mínimos em diversas modalidades.
O segundo desafio é o da igualdade de género. Muitas entidades desportivas assinalam os avanços feitos pelo crescente número de mulheres em competição. Contudo o desafio não se coloca pela quantidade, mas sim ao nível dos desempenhos e da relação. As mulheres estão a ter desempenhos desportivos muito próximos dos homens, colocando em causa, num futuro relativamente próximo, a existência de competições separadas, pelo menos em algumas modalidades. Acresce a este facto a discriminação salarial ou o investimento desigual feito no desporto praticado por mulheres.
As novas tecnologias constituem o terceiro desafio. Importa aferir a intromissão tecnológica no desempenho dos atletas, começando pela sofisticação dos equipamentos desportivos até ao nível das substâncias que potenciam desempenhos. Por outro lado, a assunção de jogos digitais enquanto modalidades desportivas, equacionam o próprio conceito de desporto.
O quarto desafio é o das identidades. O desporto fundou-se num processo de identificação entre o espaço social e político e um agregado de atletas que envergam os símbolos desse espaço. Contudo, transformações nas mobilidades, seja através de migrações, busca de refúgio ou turismo, transformam as perceções de identidade dos adeptos bem como da cidadania dos atletas. Também a liberalização do desporto, ao converter adeptos em consumidores, mercantiliza supostas identidade à escala global.
O quinto desafio é o da assunção da espessura política do desporto. O gesto desportivo não é um simples gesto físico, contendo sentidos latentes, e por isso a dimensão política de contestação de regimes ou a afirmação de ideais esteve sempre presente nos recintos desportivos. A assunção dessa dimensão por parte dos organismos desportivos, até agora negada ou não assumida, é uma inevitabilidade em face da intensificação dos movimentos ecológicos, LGBT, antirracismo, entre outros, que desafiam conivências e posições institucionais.
O Comité Olímpico Internacional, na agenda 2020+5, propõe um conjunto de medidas das quais se destacam a solidariedade, sustentabilidade, direitos dos atletas, inserção de refugiados e a digitalização, numa estratégia de antecipação do futuro. Num momento de transição paradigmática, novas dinâmicas sociais colocarão novos desafios ao desporto.

Pode ler a opinião de Carlos Nolasco edição impressa e digital do DIÁRIO AS BEIRAS

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