Opinião: À procura de uma visão para Portugal

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Foi nos anos 90 que um ministro da economia de Cavaco Silva, Mira Amaral, encomendou um estudo a Michael Porter sobre a economia portuguesa. 100 000 euros depois, o relatório acabou basicamente “na gaveta”. As conclusões não eram muito apelativas: apostar nas indústrias tradicionais, aumentar o valor acrescentado da produção portuguesa e adensar os clusters económicos que o estudo identificava. Na verdade, os governantes à época esperavam sugestões mais “sexy” como as apostas na tecnologia e nos semicondutores. Naturalmente, o relatório foi muito pouco falado, muito pouco trabalhado e, se produziu alguns resultados, eles foram escassos. O insucesso dos investimentos na antiga Quimonda, para produzir semicondutores, é um bom exemplo de como os governos portugueses deveriam ter dado mais atenção a este relatório.
Volto hoje a este assunto porque, como se não tivéssemos aprendido nada, ao longo destes últimos 30 anos, e depois de 125 mil milhões recebidos da EU, nos encontramos hoje, na mesma situação: completamente perdidos e de olhos esbugalhados na expectativa da “bazuca europeia”. O PRR é mais um exemplo de um trabalho desconexo, despido de uma estratégia e que parece responder apenas aos desígnios de curto prazo da governação.
Onde começa o problema? Não podemos dizer que não dispomos de abundantes diagnósticos sobre Portugal e a sua economia. Em paralelo, a trajetória descendente da economia portuguesa, por comparação com os países de Leste que aderiram depois de Portugal à UE, mostra o quão urgente é uma clara mudança de rumo. Ainda assim, o atual PRR terá inevitavelmente o mesmo destino de planos anteriores, se é que estamos mesmo a falar de um plano. Na verdade, a ausência de uma verdadeira liderança e a incapacidade de mobilizar o país para um desígnio que não existe, vão continuar a deixar-nos parados.
Portugal não foi capaz de produzir ou deixar emergir, nos últimos anos, uma liderança clara, sólida, inspiradora, capaz de desenvolver uma visão para o país e de o conduzir na direção de um objetivo claro e mobilizador. Quando vemos que uma parte dos agentes económicos acusou o PRR de falta de ambição e de estratégia, isso reflete precisamente esta ausência de liderança, esta falta de uma visão, de um desígnio e de saber exatamente para onde queremos caminhar, onde queremos chegar. Quando não temos uma visão e um objetivo estratégicos, um plano serve para quê… leva-nos para onde? Na verdade, 30 anos e 125 mil milhões depois, continuamos absolutamente parados enquanto Malta, República Checa, Eslovénia, Lituânia, Estónia nos ultrapassam e a Polónia e outros o farão muito em breve.
As escolas de Economia e Gestão oferecem hoje uma formação sólida nas áreas da liderança, da estratégia e do planeamento e não se compreende como todo este conhecimento acumulado não se materializa numa governação mais profissional e visionária. A falta de uma liderança sólida e inspiradora está a condenar-nos à pobreza. Sem uma liderança e uma visão para este país, os planos não terão outro papel que o de servirem de cobertura à atividade corrente da governação. A governação deste país deve apostar mais na formação e conhecimento oferecidos nas escolas de economia e gestão (e em todas as outras áreas de conhecimento, certamente) do que nas universidades de verão dos partidos. Porque, na verdade, não temos que nos resignar e suportar a vergonha de não conseguirmos construir um país de sucesso.

 

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