Todo o nosso presente tem uma justificação passada, mais ou menos remota. Um dos efeitos da pandemia ocorrida este ano 2020, foi o de acelerar tendências e encurtar a distância entre futuro e passado. O próximo ano, mesmo com a vacina, vai acentuar esta aceleração e as suas consequências. Socialmente, muitos adultos nunca imaginaram ter os filhos em idade escolar com aulas não presenciais, ou sem os amigos para brincar no recreio. Outros nunca tinham pensado em trabalhar em casa, sem “picar o ponto” e gerindo o seu tempo entre fazer as camas e aspirar a sala, com um olho nas notícias. A tantos, nunca tinha acontecido a exposição à manutenção de despesas familiares e diminuição abrupta de rendimentos, ao mesmo tempo que não podiam falar com ninguém sem ser numa sala de chat ao computador, à espera de novas medidas para acorrer à emergência e à calamidade.
As prioridades alteraram-se com novos hábitos adquiridos. O ritmo com que nos afastámos uns dos outros foi estonteante, previsões esfumam-se, mesmo as que são em nosso benefício, como a rapidez da vacina e o esforço conjunto para a sua aquisição e administração. Mas o primeiro trimestre de 2021 vai ser duríssimo e a mudança estrutural nas relações laborais pode ter vindo para ficar. A tendência, agora acelerada, era a de deixar de olhar para o trabalhador como alguém que espera instruções, mas como uma pessoa que organiza e gere o seu tempo e força de trabalho, e que assimila os fins da empresa como os seus. As restrições impostas pelos governos são legítimas e a essas devemos obediência, a bem de todos. Quer seja o lay off, teletrabalho, horários em espelho, restrição na circulação, ou até imposição de um dia de férias à empresa para fazer “ponte”.
De um lado, e de uma forma generalizada, temos os computadores a tomar conta das nossas vidas. De outro, temos as dificuldades financeiras das famílias e o desemprego a aumentar, também por causa da evolução tecnológica. Por outro lado ainda, vemos propalado um desígnio de salvação, em que o bem-estar e a saúde do conjunto populacional se sobrepõe a tudo o resto. Não será por isso difícil de imaginar que a discussão sobre o rendimento básico universal regresse, não sob a forma de promoção do emprego ou evolução na carreira, mas como mínimo de subsistência de saúde, bem-estar e felicidade que a todos, sem stress, interessa.
Pode ler a opinião de Paulo Almeida na edição impressa e digital do DIÁRIO AS BEIRAS