Foi criada em março de 2020 uma nova associação de defesa dos consumidores, a Ius Omnibus, a que temos a honra de presidir. A Ius Omnibus nasceu com o objetivo de proteger e defender os interesses dos consumidores europeus de um modo transparente e célere, visando criar um novo paradigma de legalidade e de acesso à justiça para todos, e acabar com a impunidade civil de que as empresas têm beneficiado por toda a União Europeia, quando violam em massa os direitos dos consumidores.
Até há pouco tempo, as práticas anticoncorrenciais levadas a cabo pelas empresas poderiam gerar, eventualmente, a aplicação de uma sanção pela autoridade competente, mas esta sanção não se repercutia nos direitos dos consumidores. A Lei 23/2018, de 5 de junho, veio determinar que a empresa que cometer uma infração ao direito da concorrência fica obrigada a indemnizar integralmente os lesados pelos danos resultantes dessa infração.
As ações de indemnização podem revestir a forma de ações populares, tendo as associações e fundações que tenham por fim a defesa dos consumidores legitimidade para as propor. O que acontece se a ação proceder? Por força da lei da ação popular, todos os portugueses estão representados nas ações propostas, podendo, todavia, excluir-se da representação (direito de opt out).
O Tribunal determinará, então, os critérios de identificação dos lesados pela infração ao direito da concorrência e de quantificação dos danos sofridos por cada lesado que seja individualmente identificado.
As indemnizações que não sejam reclamadas pelos lesados num prazo razoável fixado pelo juiz da causa, ou parte delas, são afetas ao pagamento das custas, encargos, honorários e demais despesas incorridos pelo autor por força da ação. As indemnizações remanescentes que não sejam pagas em consequência de prescrição, ou de impossibilidade de identificação dos respetivos titulares revertem para o Ministério da Justiça.
As “grandes” ações judiciais são ações que exigem investimentos de várias centenas de milhares de euros, o que explica o motivo pelo qual, até hoje, nunca se têm verificado entre nós, não existindo consumidores ou associações de defesas de consumidores com capacidade financeira para suportar tais investimentos, nem fundos públicos disponíveis para o efeito.
A Ius Omnibus supera esta lacuna recorrendo a uma figura ainda pouco usada em Portugal: o financiamento do contencioso (litigation funding). Financiadores internacionais de contencioso aceitam integralmente o risco do sucesso das ações judiciais, o que significa que só investem nas ações que entendem que são sólidas e têm elevadas probabilidades de sucesso.
Os financiadores só recuperarão e serão remunerados pelo seu investimento se a Ius Omnibus ganhar a ação e apenas se e na medida em que tal seja autorizado pelo tribunal, que controlará a proporcionalidade daquela remuneração no caso concreto. Este esquema permite que os consumidores não tenham de suportar qualquer custo com a prossecução destas ações.
Em caso de sucesso, qualquer consumidor que solicite a sua parte da indemnização, determinada pelo tribunal, receberá 100% da compensação a que tem direito, sem ter de abdicar de qualquer parte para pagar os custos da ação. Estes custos são pagos pelas empresas que violaram a lei e pela porção das indemnizações que não sejam solicitadas pelos lesados.