Quando a almejada mudança está prestes a acontecer, tudo se conjuga para que tudo ou pelo menos coisas demais a prejudiquem tal como aconteceu a Almeida Garrett, que saiu de Coimbra para estar no centro da Revolução Liberal, mas a sua recaída numa doença forçou-o a uma imobilidade de onde saiu um texto, o seu primeiro texto, onde se amargurava, dizendo só:
“Passarei em silêncio a miserável decadência da Universidade de Coimbra, a ignorância de um grande número dos seus mestres, a pedantearia deles, o espírito de partido que impede o progresso das ciências, e mil outras vergonhosas misérias que sofre um tão antigo e respeitável corpo literário”. ( 1 )
E o que se seguiu à Revolução, que mergulhou o país numa falta geral de unidade, conduzindo-o a uma persistente guerra civil que o bloqueou e não lhe permitiu avançar tanto quanto Almeida Garrett e muitos outros desejavam na cultura e na ciência.
Muitos de nós sonhámos também com a Mudança Necessária, ou seja, uma Revolução Libertadora que nos libertasse de uma “miserável decadência” de séculos e acabámos frustrados. E se rebobinarmos o filme das nossas vidas, sabemos que isso aconteceu por haver gente que tem “o vicio e o crime arreigados no coração” e não são portugueses. Diz Garrett.
Contudo face às leis que a Justiça não faz cumprir são mesmo portugueses. Têm até privilégios que lhes dão direito à impunidade, restando aos portugueses honestos e trabalhadores aguentar com sacrifício e dor os seus desmandos.
Agora que vivemos em pandemia, vemos bem claramente os pontos em que falha a nossa sociedade, tanto na economia, como na sociabilidade que queríamos mais humanizada e atenta aos outros. Verificamos até melhor como as falhas da governação presente e pretérita provocaram mortes escusadas e falências de empresas, que são imprescindíveis ao nosso viver presente e futuro e isso preocupa cada português com sentimentos, patriotismo e bom senso. Mas, o o governo bem se preocupa em embaralhar o jogo e voltar a jogar as mesmas cartas. Mas, não é isso que queremos.
Queremos um novo jogo social, em que todos os vícios antigos não tenham lugar e possamos voltar a sonhar um mundo perfeito, aquele em que possamos dar o melhor de nós para no retorno justo recebamos o bem que semeámos e cultivámos com carinho e afinco. Talvez seja só isso que a experiência presente da pandemia nos quer ensinar, mostrando o mal que fizemos à natureza tal como a paragem do louco processo produtivo mostrou.
E agora que muito aprendemos, saibamos aplicar o saber adquirido para nos libertarmos da “miserável decadência” de séculos e começar a viver com honesta clarividência em harmonia com a natureza.
( 1 ) Almeida Garrett – O Dia 24 de Agosto de 1820, 2ª edição comemorativa do 2º Centenário da Revolução do Porto, Bibliographias, Livraria Editora, 2020, p. 42.