No início de Junho escrevi neste jornal, sob o título “Os bairros da Jamaica”, que muitos profissionais são essenciais na frente de batalha contra a propagação do vírus COVID e que, no exercício das suas profissões, a ele estão particularmente expostos. Insurgi-me contra a restrição subjectiva da orientação emitida pela DGS para que o médico do trabalho responsável pela vigilância da saúde do profissional de saúde com COVID-19 (por exposição no local de trabalho), procedesse à Participação Obrigatória de Doença Profissional, visando a sua certificação, o que permite que esse profissional de saúde usufrua de reparação, em espécie e/ou dinheiro, de acordo com o estabelecido no regime de reparação da doença profissional.
Agora, por intermédio do Orçamento Suplementar, confirma-se a injustiça no artigo 262º-B, ao estatuir-se que os trabalhadores do sector da saúde estão dispensados de fazer prova de que a doença COVID -19 é uma consequência directa da actividade exercida e que não representa normal desgaste do organismo, sendo-lhes automaticamente aplicável o regime de reparação e indemnização de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, qualquer que seja o vínculo laboral, e ainda assegurado o pagamento de 100% da retribuição relativamente às ausências por motivo de doença profissional.
Inexistindo o Inventário Nacional dos Profissionais de Saúde, previsto desde 2015 e que até já foi alvo de uma Resolução da Assembleia da República, assinada pelo seu Presidente Eduardo Ferro Rodrigues em Fevereiro de 2019, a recomendar ao governo o cumprimento da Lei 104/2015, de 24 de Agosto, quem é que pertence ao sector da saúde? Este Inventário, obrigatório para profissionais de saúde das profissões de saúde regulamentadas, bem como para os profissionais das terapêuticas não convencionais, é definido como “um instrumento de planeamento das necessidades de profissionais de saúde no sector público, privado e social, bem como de coordenação das políticas de recursos humanos no âmbito do Serviço Nacional de Saúde”. Se ele não existe, como a Administração Central do Sistema de Saúde, IP, entidade responsável pela sua gestão e actualização, o reconhece, como vamos em rigor saber quem são os trabalhadores do sector da saúde?
No fundo, os profissionais de saúde devem deter uma habilitação apropriada para o exercício da sua actividade. Há as categorias de profissionais sujeitas a inscrição na respectiva Ordem, a saber, enfermeiros, farmacêuticos, médicos, médicos dentistas, nutricionistas, psicólogos. Mas também existem as profissões das áreas de diagnóstico e terapêutica. Beneficiam estas da previsão incluída no Orçamento Suplementar? Enfim, para além desta questão de saber quem se inclui no sector da saúde, é para mim injusto que sejam afastados deste regime outras profissões consideradas essenciais, desde os profissionais que tratam dos resíduos hospitalares, quem conduz ambulâncias ou helicópteros de emergência médica, os serviços de segurança ou guardas prisionais. Não serão eles essenciais e com risco de exposição, à semelhança de quem tem de fiscalizar e trabalha no SEF, ACT ou DGS, acompanhados pela GNR ou PSP? Nem será preciso dizer, por fim, que os serviços de justiça também não podem parar.