Tem circulado nas redes sociais um hilariante cartoon do Henrique Monteiro que retrata o nosso Primeiro-Ministro de braços abertos num abraço que dum lado cinge Catarina Martins e do outro estreita Jerónimo de Sousa, enquanto de mão estendida, sob o olhar do Presidente da República, vai apalpando o traseiro a Rui Rio.
É hilariante e, como se espera de um bom desenho, ilustra a atitude do líder socialista que desde há muito se mostrou esperto como o Alho, negociador nato, esperto, sagaz e astucioso, capaz de, no mesmo chi-coração, juntar gregos e troianos. É uma habilidade política relevante que tem assegurado a este governo a estabilidade que, noutras circunstâncias, já lhe teria faltado.
Goste-se ou não, é, pois, notável o engenho do Chefe do Governo que tão depressa conseguiu que doravante – por proposta do líder da oposição, pasme-se! – o Parlamento lhe exija menos e mais espaçadas justificações, como, no último debate do Estado da Nação, voltou a piscar o olho e a prometer casório às suas ex-concubinas.
O tal cartoon é muito explícito e, por isso, dispensa outras explicações acerca do despudor de António Costa, deixando para a nossa imaginação uma longa lista de teorias explicativas da disponibilidade dos restantes para cederem às suas libertinas investidas. Contudo, a verdade é que, sejam lá quais forem as motivações de uns e de outros – quiçá, na expectativa da grande boda -, ninguém desdenha galanteios de outrem e todos desculpam afoutezas alheias.
Pelo contrário, porventura com o intuito de caírem na graça de Costa e de se distinguirem dos rivais, um a um, os pretendentes vão mostrando a sua devoção ao líder socialista com agrados cada vez mais surpreendentes.
Uns, justificando-se com o imperativo de impedirem o regresso do bicho-papão da Direita (como se a governação de Costa não fosse um mero sucedâneo das políticas de Passos), deixaram passar os orçamentos de que, entretanto, já tinham dito cobras e lagartos…
E os outros foram mais longe ainda e mandaram o Parlamento às urtigas, esquecendo-se de que, por este andar, a democracia nelas se picará em breve também.
Não posso dizer que o desrespeito que Rui Rio evidenciou pelo parlamentarismo me tenha surpreendido muito, já que o líder social-democrata nunca escondeu o enfado que a Casa da Democracia lhe causa, mas confesso que me surpreenderam as suas justificações, numa versão requentada do célebre “Deixem-me trabalhar” de Cavaco Silva.
E admito ainda que nunca julguei que tantos deputados (não só sociais-democratas, mas também socialistas) votassem a favor do fim dos debates quinzenais com o Primeiro-ministro, viabilizando aquela inqualificável proposta, pois nunca supus que o Parlamento aprovasse com tal ligeireza uma efectiva diminuição dos seus próprios poderes.
Não obstante, realço que a restante oposição votou contra o fim dos debates quinzenais e noto ainda que da bancada socialista houve 28 votos contra e 5 abstenções a que se juntaram 7 votos contra de deputados eleitos pelo PSD. A todos presto a minha homenagem, em especial a todos os que votaram contra a indicação do seu partido. E, a propósito, lembro que Rui Rio já confirmou que de imediato tinha comunicado aquela quebra de disciplina ao órgão partidário com competência para instaurar processos disciplinares e aplicar sanções (Conselho de Jurisdição Nacional).
É a celebração da política da carneirada, sem debate nem discussão, com as pequenas bestas alinhadas em direcção ao redil. E um dia destes alguém virá dizer que aquelas são as melhores práticas dos Partidos… enfim!
Poucos dias depois da sua morte, é tempo de ponderar seriamente sobre as palavras de John Lewis, que aos 25 anos liderou a manifestação pelo direito de voto dos negros, em Selma, no Alabama, no tristemente conhecido Domingo Sangrento: “A minha filosofia é muito simples. Quando vês algo que não está certo, que não é justo, diz alguma coisa, faz alguma coisa! Mete-te nos problemas, nos bons problemas, nos problemas necessários!”.
É simples, de facto, o critério para agirmos, e, por isso, quando é preciso defender o certo e o justo, é nosso dever metermo-nos em sarilhos. Quem não o fizer, terá de se avir com a sua cobardia.