Opinião: Sua Senhoria, Senhor Balu, seja dono do seu nariz!

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Antes que vos apresente Sua Senhoria, o Senhor Balu, tenho de deixar-vos o meu protesto acerca de uma enorme injustiça de que tenho sido vítima.
Assim é: cá por casa sou habitual e erradamente retratada como uma ‘pessoa relativamente insensível com a bicharada’, resumindo-se este retrato à alegação de nunca ter autorizado aos meus filhos a adopção de animais, o que – diga-se para início de conversa e como de imediato se perceberá – é inteiramente falso.
E já nem falo da desconsideração que aquela apreciação evidencia pelos peixes ‘guppy’ que sempre tiveram guarida lá em casa…
Ora, na verdade, de cada vez que algum dos meus filhos me apoquentava com lamúrias sobre cães ou gatos abandonados, carentes de afecto e necessitados de cuidados, eu aumentava o povoamento do aquário que até há poucos anos nos acompanhou. E assim, para distrair a miudagem dos desejados cães ou gatos, lá vinha mais um ‘guppy’ – espécie escolhida por não requerer especiais cuidados, para além da água morna garantida pela excelente exposição solar do recipiente que lhes servia de lar. Concedo, no entanto, que, por muito entusiasmo que os ditos peixinhos tenham suscitado, nunca conquistaram o lugar de verdadeiros ‘companheiros’ da rapaziada… nem eles, nem a tartaruga de orelhas vermelhas que, desde cedo, por lá cresceu também (e como cresceu, o animalejo!!, obrigando-nos a mudá-lo para casa dos meus pais, onde lhe garantimos um aquário condigno, apto a enquadrar os quase trinta centímetros de carapaça que entretanto alcançara).
Bem soube eu sempre, portanto, que aqueles bichos eram meros sucedâneos de um autêntico “buddy”, de preferência um qualquer exemplar do ‘melhor amigo do homem’ que amiúde reclamavam. Porém, sabia também que qualquer canídeo, por mais disciplinado que fosse, exigiria uma disponibilidade que eu não podia garantir, e esse pragmatismo – como já adivinharam – deu azo à injusta acusação de que hoje me queixo.
Afinal, ainda hoje tenho saudades da bicharada com quem dividi a infância e a adolescência e de quem bem lembro a lealdade e o companheirismo: o Juá (um pequeno rafeiro de pelo dourado, doce e leal como poucos, que – gostando de mim, estou certa – tinha no meu irmão o seu companheiro de eleição), a Jeanette (a melhor cadela pastora-alemã de todos os tempos) ou o Timmy (o franzino filhote da Jeanette a quem, por azar, no meio de uma corrida de carrinhos de rolamentos, entalámos uma pata e que, desde aí, conquistou um lugar eterno no nosso coração).
Mas já me tinha esquecido da doçura dos seus olhares, confesso, e até me julgava agora imune à arte de sedução daqueles bichos. Pois – para minha surpresa – assim, não é, como rapidamente mo demonstrou o Senhor Balu, o novo ‘buddy’ do meu filho mais velho, um pequeno cachorro de raça indefinida recolhido há poucos dias no canil municipal.
Para já, o ‘moço’ – como lhe vamos chamando – é vivaço quanto baste (os seis meses passados na jaula do canil terão domado, antes do tempo, o típico frenesim de qualquer cachorro) e doce até mais não poder (a memória da dita jaula há-de ser responsável pela gratidão que os seus olhos distribuem), e, assim, dos mais novos aos mais velhos, estamos todos rendidos ao bonito e escorreito Senhor Balu.
A escolha do nome, Balu, é da responsabilidade da sua ‘madrinha’, a mais nova dos meus filhos, e a respeitosa designação que o antecede – e que todos teimam em ignorar – é da minha lavra, na esperança de que o dito se saiba comportar como um verdadeiro Senhor e mereça a pompa atribuída às Nossas, Vossas, ou Suas (tanto faz), mas, sempre, Senhorias.
Em suma, em jeito de homenagem aos ‘melhores amigos do homem’, desejo que o Senhor Balu – tal como o “cão como nós” que Manuel Alegre eternizou no livro com o mesmo nome – se sinta membro da família. Se assim for, imitará com certeza os nossos tiques e trejeitos, permitir-se-á liberdades e exageros, e tornar-se-á “um cão rebelde, teimoso, de certo modo subversivo. Às vezes insuportável”… como todos nós!
– Senhor Balu, nesta família, seja, pois, dono do seu nariz!

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