O filme Milagre na Cela 7 está no top e tem posto toda a gente a chorar. Dizem que é fantástico, marcante, verdadeiro e genuíno amor e mais uma data de coisas, todas boas. Apesar de estranhar tanta unanimidade, vi o filme. Não é uma desgraça, mas também não o achei nada de especial. Vou dar as minhas razões. Em primeiro lugar, é um remake de um filme coreano recente, de 2013. Fazer melhor que o original não é fácil, e neste caso confirma-se. Mas até aqui tudo normal.
Depois vem a história: o protagonista Memo é portador de uma deficiência mental e tem uma filha – Ova – que não é deficiente e que até percebe que o pai não é bem aceite pela sociedade, mas ama-o incondicionalmente, defende a sua palavra e acredita na inocência do pai, acusado e condenado por ter morto uma miúda filha de um tenente do exército, o que já sabemos ser falso. O homem é só um pobre coitado sem um grama de pecado naquele corpo. Este tipo de histórias em que os bons imaculados triunfam sempre me fez “confusão”, muito especialmente quando o protagonista tem uma deficiência mental. Considero até que pode ser, em alguns casos, desrespeitoso para com os que realmente têm essa condição. Mas não vou entrar por aí, por que um filme é um filme, e este é passado há alguns anos atrás num meio rural. Sem prejuízo, todas as pessoas são merecedoras de respeito, independentemente da sua condição.
Do que não gosto mesmo é da elevação do amor e da bondade à custa de quem nem sequer percebe o mundo que o rodeia e que, por isso, não se pode dizer que toma decisões, pois o que faz é seguir o seu instinto puro, que contrasta obviamente com a sociedade onde há malvados que não deveriam existir porque a humanidade é naturalmente boa e ingénua. Ou deveria ser, não fosse a corrupção civilizacional. Uma utopia rousseana, portanto. Até posso estar a exagerar na crítica, mas a verdade é que é fácil aderir à história. É mais ou menos como aquela série parva do médico autista em que nem se dão ao trabalho de lhe dar o nome The Autistic Doctor. Não. Porque é autista, é certamente boa pessoa, e a série chama-se The Good Doctor.
Bem, eu cá gosto muito mais de filmes onde as decisões são tomadas livremente, o que implica serem racionais e consequentes no mundo que nos rodeia. Ou tomadas em consciência e em função de uma determinada realidade. Por último, há a técnica, com demasiados planos em câmara lenta e clichés que, verdade seja dita, acredito que sejam usados mais por razões orçamentais.
Para não me ficar só pela crítica, indico as minhas preferências. Sobre amor incondicional entre pai/mãe e filho(a), nunca mais me esquecerei do Dancer in The Dark, realizado por Lars von Trier, interpretado por Bjork (também responsável pela banda sonora) e Catherine Deneuve. Ou o complexo, inteligente e extraordinário, para além de tecnicamente brilhante, filme japonês Shoplifters (Assunto de Família é o título em português). Não conto as histórias. É ver e comparar! Para matar a curiosidade de alguns, o filme que me pôs a chorar “do início ao fim” intitula-se A minha Vida de Courgette e é de animação.
Pode ler a opinião de Paulo Almeida na edição digital e impressa do Diário As Beiras