Opinião: A Pandemia de 1918 ( 3 )

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No dia 4 de outubro de 1918, foi publicada, no Diário do Governo, uma Portaria, contendo seis instruções e recomendações, redigidas por Ricardo Jorge, Diretor-Geral de Saúde, relativamente às necessárias ações a empreender no combate à pandemia de gripe.
Em primeiro lugar, deveria ser organizado um sistema de recolha de informação. Todos os médicos deveriam participar o número de casos que fossem surgindo.
Em segundo lugar era referido que não existia uma profilaxia específica contra o contágio. Apelava-se ao cumprimento das diversas regras de higiene e desinfeção assim como ao isolamento e à restrição dos contactos sociais.
O terceiro ponto abordava a questão dos hospitais. Os doentes mais graves deveriam ser hospitalizados e isolados. Para aumentar o número de camas dever-se-iam improvisar, noutros edifícios, hospitais temporários.
O quarto ponto dizia respeito à necessidade de procurar aumentar o reduzido número de médicos, fazendo apelo ao regresso dos que já estavam reformados assim como à inclusão dos médicos militares.
O quinto ponto dizia respeito à organização das estruturas médicas e farmacêuticas, procurando alargar os serviços de modo a conseguir apoiar toda a população, sobretudo os mais pobres. Garantir a existência, em armazém, de produtos e medicamentos, impedir aumentos abusivos dos preços e tornar os medicamentos gratuitos para a população com mais carências económicas.
Finalmente e em sexto lugar, referia-se a necessidade de organizar a assistência e a caridade junto de uma população maioritariamente analfabeta e paupérrima. Alimentação deficiente e higiene quase inexistente não favoreciam o combate à pandemia.
Em 1918, Portugal, nesta conjuntura, estava a desenvolver um enorme esforço financeiro, debilitando ainda mais as já tradicionais e crónicas dificuldades orçamentais.
Em Lisboa e em plena segunda vaga epidémica, “a capacidade da rede hospital foi rapidamente excedida”, sendo necessário improvisar novas estruturas.
Neste final do ano de 1918, o Diretor dos Hospitais Civis de Lisboa dizia que a capital era, “uma cidade suja e infecta, sem higiene e quase sem água, rica de toda a casta de espécies mórbidas”. O Liceu Camões e outros edifícios e até Conventos, foram transformados em hospitais improvisados.
Os hospitais estavam sob muita pressão e cometiam vários erros. A imprensa comentava a suposta amnésia e algum desconhecimento geral, escrevendo que até parecia que já ninguém se recordava da anterior epidemia de gripe, ocorrida em 1889 e 1890. Havia que recordar e aprender com os erros do passado. Afinal, cerca de trinta anos antes, Portugal tinha sofrido uma terrível epidemia de gripe. Esta epidemia de 1918 não era a primeira nem seria a última.
Como medida de prevenção foram encerradas escolas e universidades. “Em Coimbra a sala de leitura da Biblioteca da Universidade também encerrara devido à epidemia bronco-pneumónica que então grassava com uma certa intensidade”. Em Lisboa, o Parlamento também encerrou.
A Direção-Geral de Saúde, muito prestigiada, considerava que, “a causa da gripe era um vírus por identificar e que o único remédio seria a descoberta de uma vacina específica, como acontecera para a varíola. Também assim pensava a maioria dos médicos espanhóis”. O vírus só seria identificado em 1933.
No dia 11 de novembro de 1918, em plena segunda vaga da pandemia, a mais mortífera, terminava a Primeira Guerra Mundial, onde participavam dezenas de milhares de portugueses, num esforço de guerra que ultrapassava as possibilidades económicas do país. Neste mês ocorreu em Portugal uma greve geral.
Politicamente, o país estava profundamente dividido. O ditador Sidónio Pais suspendera o regime democrático. Seria assassinado, na Estação do Rossio, em Lisboa, no dia 14 de Dezembro de 1918. Cerca de um ano antes, tinha tomado o poder, liderando um golpe militar que destituíra o Presidente da República, Bernardino Machado, obrigando-o ao exílio.
Pedro Mota Curto

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