Opinião: Vernon Subutex

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Virginie Despentes, escritora e realizadora francesa, escreveu uma trilogia, entre 2015 e 2017, intitulada “Vernon Subutex”. Em 2019, foram publicados em Portugal, os dois primeiros volumes (um em março e outro em setembro).
Virginie Despentes, nasceu em Nancy, em 1969. Realizou diversos filmes e publicou vários livros. Atualmente é uma das escritoras mais populares em França, sendo membro da Academia Francesa e da Academia Goncourt. Escreve sobre a moderna sociedade urbana, os seus paradoxos, perplexidades, hipocrisias e contradições, tendo recebido diversos prémios pela sua obra (Prix Goncourt des Lycéens; Prix Renaudot; Molière Award for Best Playwright).
A trilogia “Vernon Subutex” foi galardoada com os prémios: Prix Anaïs Nin; Prix Laderneau; Prix La Coupole; e foi finalista do Prémio Man Booker Prize Internacional, em 2018 (uma das seis finalistas presentes na shortlist). Esta edição do Booker Prize 2018, seria ganha pela polaca Olga Tokarczuk, vencedora igualmente do Prémio Nobel da Literatura em 2018.
O Man Booker International Prize é um dos mais importantes galardões literários internacionais, atribuído de dois em dois anos a um autor de ficção, vivo, de qualquer nacionalidade, com obra publicada em língua inglesa, original ou traduzida.
Vernon Subutex é a personagem principal desta obra que relata a evolução da sociedade urbana, em Paris, ao longo das décadas mais recentes, numa transição do analógico para o digital, dos jornais para as redes sociais, das ideologias para o consumismo e para o domínio da economia financeira, para a desilusão com boa parte da política tradicional, dos anos 80 do século XX até aos anos 10 do século XXI.
Vernon Subutex era dono de uma loja de venda de discos, muito frequentada e que marcou uma geração. Trinta anos mais tarde, a loja foi à falência e fechou as portas, o comércio da música alterou-se radicalmente e o famoso Subutex passou a ser um Sem Abrigo, sem nada, totalmente miserável e excluído socialmente, a viver na rua junto com muitos outros excluídos desta sociedade devoradora.
Aos cinquenta anos, muitos dos seus conhecidos e amigos já morreram, por motivos vários, por consumos vários, por excessos vários. Aqui se abordam temáticas urbanas, suburbanas e subterrâneas, que sempre existiram e que subsistem, evoluindo de formas diversas, como o consumo de drogas e suas consequências, a indústria e o consumo de pornografia, a impunidade e o domínio dos poderosos que tudo controlam.
Uma comédia humana ao seu melhor nível. Um retrato pungente da sociedade atual, muito cáustico, por vezes comovente. Uma descrição da moderna condição humana e urbana. Paris no século XXI. Paris sem o Louvre e a Torre Eiffel. Paris sem os turistas.
Uma outra visão de Paris, com muitas pessoas a viverem na rua, na mais absoluta indigência, alcoolismo, drogas, prostituição, doenças, patologias mentais, vidas desfeitas. Um retrato implacável de uma parte quase invisível desta moderna sociedade urbana, tão tecnológica, tão inovadora, tão empreendedora.
A partir de Vernon Subutex e dos seus amigos, Virginie Despentes descreve uma incrível panóplia de personagens, que na sua maioria são os falhados, os excluídos desta nova sociedade, da inteligência artificial e das maravilhas tecnológicas, sendo o produto de uma sociedade que gera desigualdade e exclusão. Despentes apresenta um discurso avassalador à medida que vamos tomando contacto com as vidas privadas de tantas pessoas, sempre num ritmo cativante, imparável e bastante perturbador.
“Dans cette peinture d’une France qui dégringole dans la haine et la précarité, Virginie Despentes touche au sommet de son art”, escreveu Alexis Brocas, na revista “Le Magazine Littéraire”.

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