Opinião: Afonso de Albuquerque IV – Coimbra e a região

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O que se passou na saúde, na justiça, no ensino, no trabalho? E o que se passa sem o funcionamento do Estado?

Regozijo logo que se anunciou e triunfou o 25 de Abril. Prontamente se realizou uma assembleia geral no Teatro Académico de Gil Vicente. Foi constituída uma mesa ad hoc, para a qual seguiu a seguinte moção: “Angola para o MPLA, Moçambique para a FRELIMO, Guiné e Cabo Verde para o PAIGC”. Só houve um voto contra e de pé.

Pouco tempo depois, nova assembleia geral no Teatro Académico de Gil Vicente. O mesmo sistema para a constituição da mesa. Tema: saneamentos. Só um voto contra, de pé, e no palco. É saneado o professor Joaquim Rodrigues Branco.

Nós, um grupo de 25 doutorados da Faculdade de Medicina, mandámos um telegrama ao Ministério da Educação dizendo que, se mais alguém fosse saneado, aceite a nossa demissão a partir desse momento. Os 25 subscritores tiveram o seu nome afixado na antecâmara de vidro da porta principal da Faculdade de Medicina, numa folha intitulada “Os 25 fascistas”.

Gonçalvismo e encerramento do Jornal A República, símbolo da liberdade. Realizou-se uma manifestação a favor do jornal, convocada ou organizada pelo PS. Os organizadores, com a braçadeira do PS, eram meus amigos. Estive presente com os meus amigos e éramos mais que os militantes do PS.

Em outra ocasião, realizou-se uma manifestação em Braga de repúdio contra o vexame feito, no aeroporto, ao arcebispo. Indo para o Brasil, obrigaram-no a despir-se e a ficar só em cuecas. Segue-se manifestação idêntica em Aveiro e outra em Coimbra, que se iniciou na Praça 8 de Maio, junto à Igreja de Santa Cruz, até à Sé Nova, sem PS que, a sorrir, sorriram de repúdio enquanto passava a manifestação.

Segue-se manifestação na fonte luminosa em Lisboa, convocada por Mário Soares, a atenuar a pena de ter dito “Nem mais um soldado para as colónias”. O que se faz aos retornados? “Atiram-se aos tubarões…” Não se devia dizer náufragos do império em vez de retornados?

Como consequência, e disso milhares, as elites são fuziladas em todos os locais do império. Em Portugal não aconteceu devido ao 25 de Novembro e a minha gratidão é eterna para esses homens corajosos.

A partir daquele momento, foi só gastar e o ouro progressivamente a ser esvaziado do Banco de Portugal. A ruína acentuou-se, o receio e o desespero a prevalecer.

Vejamos então as consequências do acontecido e que continua por falta de honestidade política, mas, sobretudo, de partidarice. Os cargos públicos não são por concurso, mas por partidarice. Arranjar lugar para os do partido é cada vez mais admitido, nas Câmaras, começando pelas Juntas, para prosseguir nos Governos. Os nomeados e nomeadas nos cargos aumentam desmesurada e desnecessariamente. Cada vez são mais os feriados e menos as horas de trabalho. Até para arranjar emprego as reformas eram antecipadas e, agora, querem aumentá-las.

O Serviço Nacional de Saúde, como foi projectado e previsto, está em agonia. Querem responsabilizar os médicos, é isso que se deduz dos discursos dos ministros e das intervenções dos responsáveis.

No meu tempo, no que diz respeito aos HUC, como Director (ou seja, Presidente do Conselho de Administração) dizia: “O primeiro responsável sou eu. Depois se averiguará”, e como director de serviço, “O primeiro responsável sou eu e depois se verá”. E agora? Quem deveria assumir, não assume qualquer responsabilidade e a situação está a agravar-se.
Trouxemos para Coimbra o centro da medicina portuguesa. E agora, o serviço? Quando tomei conta dele tinha 49 camas e uma sala de operações duas vezes por semana. Deixei-o com 350 camas e 15 salas de operações e operavam-se pelo menos 30 doentes por dia. E agora?

Enquanto se reduzia a nada, hoje, 40 doentes traumatizados estão dispersos pelo hospital e, em consequência disso, muitos deles a morrerem ou infectados. De quem é a culpa?

Acorrem à urgência entre 400 a 600 doentes diariamente. Não se queixem dos médicos, senhores doentes. A culpa é do Estado. Penalizem-no a ele. Tudo o resto tem a mesma justificação, desde a agricultura, justiça, ensino, trabalho, até às ciências.

Pode ler a opinião do médico Norberto Canha na edição em papel desta sexta-feira, 24 de janeiro, do Diário As Beiras

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