A cerca de um mês do Natal, abraça-nos uma lágrima de um azul imaginário e luminoso, num vazio muito amplo para perceber que nessa lágrima se descobre uma beleza que nos pertence: a VIDA.
A criação de sistemas políticos que tentam regressões aparentemente democráticas deve ser analisada, mas transversalmente. Vivemos momentos em que a democracia se exerce com governantes a desafiar-nos com agravamentos e desconfiança em relação a dias futuros. Governantes que param de olhar o mundo! Governantes que não sabem olhar o mundo! E, por vezes, muitas vezes, esse mundo é uma paisagem desenhada sobre a vertigem de violinos desafinados, de becos sinuosos, de órbitas assimétricas, de poeira dos desperdícios de conflitos.
Há grandes desigualdades e retrocessos em áreas que deviam estar consolidadas.
Há utopias em discussão, o secundário vira fundamento, o fundamental é removido para o esquecimento, a ignorância domina a realidade, a responsabilidade vira palavreado, a verdade é subjugada pela eloquência, a nuvem tem maior força do que a claridade!…
Longe vai o tempo em que filósofos e pensadores do século XVIII definiam a democracia como sendo o direito de o povo escolher e controlar o governo de uma nação!… Longe vai esse tempo!…
Hoje, é inequívoca a deterioração da democracia (e já se fala em “democracias”!) quando se limita a legitimidade de oposição (e, então, se fala em “oposições”!), se restringe a independência do poder judicial, se controla o pluralismo dos media, quando são as chamadas “redes sociais” a discutir o conceito de “verdade democrática”, tanto denunciando a “verdadeira verdade”, como “criando verdades” que desfavorecem ou subvertem a democracia.
Hoje, é indiscutível uma progressiva interiorização por parte de muitos cidadãos de um descontentamento, de uma impotência, de um desinteresse pelo “direito de o povo escolher e controlar o governo da sua nação”!
Neste desvio que fiz para uma análise cada vez mais necessária, sinto-me agora à solta para percorrer um pequeno caminho onde brota a beleza da VIDA . . . mas com um movimento impróprio e em sobressalto que me emudece num grito de espanto que não quer ficar sufocado!…
Quando o Sol perde luz, surge uma cruz pesada que carrega os olhares peregrinos que deambulam pelo mundo . . . enquanto eu bebo uma chávena de café que adoço com a colher de um poema embaciado por versos de silêncio ou palavras desnudadas:
Uma mulher vivia na insónia coberta pelo medo, despida de autoestima, pintada como natureza morta.
A vida ordena-lhe ligação à Morte, enquanto lhe retira a esperança de soprar ao coração a Vida. Não quer ajuda nem comunicar. Vive sem morada na acidez da pobreza.
Com companheiro ou sem companheiro, tudo cresce oculto. Como cresce o momento de dar à luz um filho que se chama VIDA, ensaiou a fuga e ensopou a alma com o espectro mais negro do mundo:
Rejeitou o NATAL, trocando as palhinhas pelo lixo de um contentor!…
O pensamento não se desliga da dor … mas brotou a beleza de uma Vida com um movimento impróprio no jogo do reflorescer!
A Lei julga porque é Lei …
Eu não sei julgar as feridas desse mundo oculto…
Nicolau Tolentino diria que não é fácil reconhecer que se tem sede porque a sede é uma dor que se descobre pouco a pouco.
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