Opinião – Parar para pensar

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No seu livro “Ensaio Sobre A Lucidez”, José Saramago reporta-nos uma situação que me faz recordá-lo hoje: Numa manhã de eleições, na capital de um País imaginário, os funcionários de uma das secções de voto deparam-se com uma situação espantosa: todos os eleitores votaram em branco!… Ao narrar as providências do governo, polícia e imprensa para entender as razões de tal “epidemia branca”, o autor faz uma alegoria com a fragilidade dos rituais democráticos do sistema político e das instituições que nos governam.
Hoje, a nossa Assembleia da República nunca foi tão plural na diversidade dos partidos aí representados … (e talvez até seja muito bom) … mas importa não esquecer de, a essa soma, acrescentar a grande parcela da abstenção que realmente foi a grande “epidemia branca”!
Não me interessa o rigor numérico das percentagens, uma vez que todo o País teve acesso a elas através dos meios de comunicação social ou sobre elas já ouviu discussões dos vários comentadores políticos, inclusivamente já depois de somados os resultados dos eleitores residentes fora de Portugal. Importa-me antes reflectir sobre elas através de interrogações e alertas que é obrigatório serem feitas, sobretudo sobre três das principais percentagens que o povo português escolheu: Abstenção de cerca de 50 % (informações que vão variando entre os 46 % e os cerca de 51 %), com Eleitores inscritos, cerca de 10 milhões; Votantes, cerca de 5 milhões. Partido Socialista, partido vencedor, 36,6 % dos votantes!
Mais do que o rigor dos números (mais dezena menos dezena), interessa reflectir sobre o “cartão de visita” destas eleições, cartão de visita que, quer queiramos ou não, se chama “cartão cerca 50 % de abstenção”! E abstenção significa que quase metade do nosso Portugal deixou de intervir, de opinar, de participar voluntariamente em qualquer escolha. Que quase 50 % dos portugueses renegaram ao seu direito de escolha dos seus governantes! Será que agora têm algum direito de os criticarem?! Ou, pelo menos, autoridade moral para o fazerem?!
Postas estas interrogações, vem-me à memória Tolentino de Mendonça, quando diz que a fé é uma história de fidelidade que se constrói e não o mero entusiasmo de um momento … e solta-se-me mais um alerta para os entusiasmos desmedidos de alguns momentos ou de algumas pessoas em alguns momentos: Vejo gerações de gente nova com ambições que não encontram resposta no nosso País… e depois emigram!… Vejo gerações desmotivadas e, por isso, facilmente encaminhadas (desencaminhadas…), por pseudo-líderes, pseudo-intelectuais ou pseudo-evoluídos, para princípios morais ou de conduta que levam a “manifestações de rua” (por quem e com que finalidades?), a discussões que confundem sexo com género (querendo chegar onde? destruir o quê?), feminilidade e direitos de igualdade com feminismo (sabe-se lá com que intenções!), direitos com deveres (e cada vez mais todos parecem ter direitos e ninguém ter deveres!)!
E, nessas reflexões e alarmes, vejo professores a serem agredidos nas escolas, por palavras e fisicamente, como vejo todos os dias funcionários dessas escolas a serem insultados e injuriados, ou aquele caso do aluno a quem o professor agrediu por desobediência ao negar entregar-lhe um telemóvel! Mas vejo que o professor foi imediatamente suspenso e logo a seguir presente, em tribunal! E pergunto-me: Porque se actuou imediatamente com um professor (e muito bem) e não se actua do mesmo modo com as dezenas de alunos? Porque são menores … e, porque são menores, são irresponsáveis? Mas então porque não se responsabilizam os seus “encarregados de educação”? Leia-se bem: “encarregados de educação”!… Se são “encarregados de educação” pressupõe-se (ou será que não é assim?) que já são eles os encarregados da educação quando os alunos vão para a escola… que a educação começou … em casa … na família!… Depois, só irá ser continuada na Escola! Será isso que está a acontecer?
Porque é que isso não é um problema político muito sério … a incluir nos programas partidários e a merecer prioridade de discussão no Parlamento? Não … 50 % dos portugueses parece que se desinteressaram de dizer isso aos nossos deputados … e veja-se (e pasme-se!!!) quais foram os primeiros diplomas presentes para discussão nesta legislatura!…
E “paro para pensar”: O que está a acontecer aos portugueses?… Metade dos portugueses já não está interessado na construção do seu futuro?… E não será que a verdade (doa a quem doer) é que metade dos portugueses não tem autoridade para criticar o que está a acontecer com o seu futuro!…

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