“A diplomocracia, analisada filosoficamente, presta-se ao riso. Mas infelizmente é uma das característica
estruturais da sociedade portuguesa”
( José António Saraiva, 1917-1993 )
Escrevo este artigo confiante nas opiniões por mim emitidas, em vários jornais e blogues, em que assumo um papel altamente crítico relativamente à extinção das escolas técnicas que formavam excelentes diplomados com conhecimentos teórico-práticos. Exemplifico com os nomes dos diplomados por escolas industriais: António Saraiva, presidente da CIPP, Maldonado Gonelha e Medina Carreira, posteriormente licenciado em Direito, tendo os dois últimos desempenhado cargos ministeriais.
A minha avaliação a este “statu quo” encontrou respaldo confortável num comentário a um dos meus textos de um prestigiado académico brasileiro, Jarbas Novelino Barato, detentor do mestrado em Tecnologia Educacional pela “San Diego State University” e doutorado em Educação pela Unicamp que me ofereceu, poucos dias depois, com um grande abraço, o seu livro “Saberes do ócio e do Trabalho”. Escreveu ele no supracitado comentário:
“Rui, Muito bom ler sua crítica à desfiguração do ensino técnico aí em Portugal. Com pequenas mudanças, para tropicalizar a linguagem, tudo o que você escreve cai como luva para as bobagens que fizeram como ensino técnico no Brasil. Não vou muito longe. Começo com a história da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1971. Essa lei, que profissionalizou todo o ensino secundário no Brasil, sucateou o ensino técnico. Académicos que nunca tinham visto uma oficina em suas vidas começaram a ditar regras para a formação profissional nas escolas. Resultado: um desastre, acompanhado pelo desmonte do ensino técnico que foi construído por gente que entendia de trabalho e gostava do que fazia em oficinas e empresas de aplicação (fazendas, lojas e hotéis escolas, por exemplo).
Conto uma história acontecida logo depois da Lei 5692/71. Com a unificação do ensino, carreiras de dirigentes do ensino geral e profissional foram equiparadas. Graças a tal equiparação, diretores de escolas primárias [formados em pedagogia por onde o trabalho não passa] puderam candidatar-se a cargos de direção das antigas escolas técnicas. Uma senhora, com muito tempo de experiência na educação de crianças, assumiu uma das escolas técnicas, da área de tecnologia agrária, situada numa fazenda. Ao inspeccionar as instalações, a nova diretora viu um touro magnífico, bem nutrido de carnes. Ordenou que o animal fosse sacrificado para churrasco de posse. O touro da história era uma matriz importada, produtor de material genético que vinha sendo utilizado em experiências de reprodução em todas as escolas técnicas agrárias do Estado de São Paulo. Atualmente está em curso um projeto de educação integrada no ensino técnico brasileiro. A proposta é liderada por acadêmicos cujo saber sobre formação profissional é, quando muito, livresco. A consequência é uma desvalorização da técnica enquanto saber. Há muito que comentar sobre isso, mas fica para uma outra ocasião.”
E se, como escreveu Antero, referindo-se a este extremo ocidental europeu, “a nossa fatalidade é a nossa história”, a actualidade luso-brasIleira de ensino técnico obedece a um paradigma de desgraça!