Opinião: Modelo de crescimento

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Para muitos dos que vêm a Coimbra neste período de férias é evidente o choque perante o estado de abandono que verificam na cidade, apesar de existirem alguns equipamentos novos que poderiam ajudar a fazer a diferença. O parque verde, os vários esqueletos de casas em empresas um pouco por toda a cidade, o estado calamitoso de passeios e jardins, a falta de asseio e limpeza, a ausência de oferta cultural e de ocupação de tempos livres, o estado de sítio que +e a baixa da cidade, etc., são sintomas evidentes de total ausência de estratégia numa cidade cheia de potencial. Essa estratégia resulta da desadequação do perfil das pessoas que gerem a cidade para os desafios que ela enfrenta, mas também de uma total ausência de modelo de desenvolvimento e crescimento. Coimbra não tem identificadas as suas valências competitivas, não tem definida uma visão de conjunto e atua de forma errática, sinal de total desorientação num mundo global e muito competitivo.

Uma cidade que quer ser a terceira cidade do país tem de se posicionar e definir, de forma realista, como vai obter esse objetivo. É evidente que em termos de infraestruturas Coimbra não poderá definir para si uma estratégia de diferenciação. As duas competências que a poderiam diferenciar, a Universidade e a área da Saúde, não são hoje suficientemente poderosas para justificarem uma estratégia de diferenciação, isto é, somos bons, comparáveis a outros, mas não somos melhores, ou visivelmente melhores. Para além disso, a cidade não cuidou de infraestruturas e serviços que pudessem potenciar essas duas valências: não cuidou a educação que fosse um mecanismo de atração de famílias, não cuidou a cultura, deixou morrer a indústria, perdeu grande parte do dinamismo no comércio e não se diferencia em nenhum tipo de serviço (exceção feita aos HUC que ainda podem ter alguma vantagem relativamente a outros hospitais, mas com relevância decrescente). Quando vejo alguns de nós, até a nível académico, de peito cheio com alguns índices que mostram que não estamos atrás de outros, antes pelo contrário, mas que no essencial dizem que somos comparáveis, mas ao mesmo tempo cegam o discernimento de muitos de nós, apetece-me dizer que isso é só 50%, faltam os restantes que é a materialização desse resultado em atividade económica, no desenvolvimento social e na atratividade.

Ou seja, não tendo condições objetivas para se diferenciar, desde logo até pela sua dimensão e tendência de perda de população, Coimbra vai ter de aprender, com humildade, a associar-se a outras cidades e regiões e desenhar com elas estratégias de complementaridade (sinergia competitiva). Isso é, neste momento, absolutamente crítico para o futuro e o único caminho viável. Eu sei que é um discurso muito pouco popular, pois à imagem de um aristocrata falido, a cidade de Coimbra não se apercebe da sua situação (veja-se as escolhas que faz para gerir os destinos da cidade) e tende a esconder a realidade de si próprio utilizando, aqui e ali, argumentos de circunstância que impeçam uma boa olhada no espelho.

Que estratégia deveria ser essa? Quem anda pelo mundo percebe que a lógica mudou. Hoje o foco é colocado nas cidades e regiões e menos nos países. Grandes cidades, zonas metropolitanas, comparam-se com outras cidades. Escolhemos entre Lisboa e Londres, ou Paris, ou Madrid, e não entre Portugal, Inglaterra, Espanha ou França. Isso significa, como já muito bem identificaram as duas grandes cidades Portuguesas, que é necessário ter valências competitivas que permitam internacionalizar a cidade/região, modernizar, ter uma oferta de vida, cultural, etc., competitiva com outras cidades/regiões do mundo. Isso abre uma oportunidade à região centro, procurando sinergias com outras regiões fronteiriças, dentro de Portugal e com Espanha. A região centro deveria promover reuniões de estratégia em que os vários presidentes de câmara procurassem dinamizar serviços complementares, não concorrenciais, para que a região fosse vista como um todo compacto e organizado e pudesse competir no mundo global. Em áreas como a saúde, a oferta universitária, a indústria e a cultura.

Todas as cidades da região, sendo cidades médias, ganhariam muito com a complementaridade, o que exige dos autarcas visão, capacidade de gerir a agenda da sua cidade, capacidade negocial, muito realismo, humildade e visão do futuro.

Um bom exemplo de algo que poderia mudar esta realidade é a iniciativa “Coimbra, Capital da Cultura 2027”. Deveria estar a ser realizada numa filosofia “Centro, Capital da Cultura 2027”, materializando uma muito interessante e potencialmente agregadora estratégia multipolar para a Capital Europeia da Cultura e para toda a região centro. Isso significa a capacidade de juntar contributos, dando-lhes dimensão, dispersando por várias cidades as iniciativas a realizar, aproveitando as complementaridades identificadas. Bem pensado, realizado com espírito de abertura (e não de competição entre cidades do Centro de Portugal), bem coordenado e vendo a região como um todo, pode ser efetivamente muito interessante, dando de Coimbra uma imagem de realismo, humildade e capacidade de coordenação de toda uma região.

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