Opinião: Matilde

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Fevereiro de 2015 foi dos períodos mais difíceis da governação do ministro da Saúde Paulo Macedo, hoje presidente da Caixa Geral de Depósitos. Enquanto negociava a aquisição de um novo medicamento capaz de curar o vírus da hepatite C, no Parlamento gritava-se e a pressão mediática era para lá de intensa. O medicamento veio mesmo a ser adquirido e mais de uma dezena de milhar de pessoas puderam dele beneficiar. E hoje continuam a beneficiar.

A questão não é nova e há-de colocar-se mais vezes no futuro: surgem medicamentos com preços exorbitantes para os contribuintes portugueses, que suportam esforçadamente com os seus impostos a quase totalidade do custo SNS. Podia naquele momento Portugal pagar os 100 mil euros que a indústria farmacêutica pedia pelo medicamento para curar cerca de 10 mil doentes? Ou seja, deveria Portugal naquele instante despender € 1.000.000.000,00? Com os recursos limitados que temos, e que sempre iremos ter, que outros tratamentos seriam suspensos, ou que outros orçamentos do Orçamento Geral do Estado deveriam ser afectados? Há momentos em que é mesmo muito difícil governar.

Conseguiu-se ao nível europeu ganhar peso negocial e a empresa não só reduziu o preço para 25 mil euros, como aceitou que só receberia em caso de cura do doente. Foi um acordo que permitiu salvar milhares de vidas num curto espaço de tempo. Mas recordo-me que houve uma vítima mortal, uma fatalidade sem preço que pode ter permitido a erradicação deste vírus a breve trecho. O custo/benefício de um medicamento quando integra o valor da vida é uma ponderação demasiado cruel, mas os Estados são obrigados a traçar limites no que podem gastar.

Quem não conheceu limites foi a bondade dos portugueses que ajudaram a Matilde a angariar o montante necessário para que ela possa comprar o medicamento que lhe pode salvar a vida. É o dinheiro de cada um, que o destinamos como quisermos, ao contrário do dinheiro que é de todos e que os responsáveis por ele não podem decidir sem regras. Se não for possível cumpri-las e obter a autorização excepcional para utilizar em Portugal esse medicamento de que a Matilde precisa, fica a alegria de saber que, mais uma vez, a sociedade civil demonstrou a sua generosidade.

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