Opinião – Vista aérea

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A organização, o planeamento, a agricultura, a limpeza urbana, é algo que se vislumbra sempre que chegamos a qualquer país da europa (entre Espanha e Polónia, escolha qualquer um deles). Aterrar em Lisboa é sempre regressar a casa, mas desde a entrada no país até à aproximação ao aeroporto – quando se consegue observar sem neblinas ou nevoeiros – mostra-se o país que somos a quem o vê de cima: hortas, quintas, campos agrícolas, construções, vias de acesso, urbanismo… enfim, são um complexo de unidades multiformes e desconexas num país geograficamente pequeno que não tem de o ser no mundo nem na vida. Diversidade e distinção, é certo. Mas será somente sinal de diferença, eventualmente positiva, ou revelará muito mais do que isso: uma peculiar forma de ser, de estar, de fazer e pensar o país, também ela desconexa e desestruturada tal como a sua paisagem física?
Portugal subiu uma posição no índice de desenvolvimento humano (de acordo com o relatório da ONU, de 2018 ). Está agora na 41.ª posição, a par com a Letónia. Atrás estão países como o Bahrain, a Hungria, a Croácia, o Chile. Os problemas estruturais do país são graves e difíceis de resolver.
Talvez o maior de todos os problemas resida na ausência: de princípios, de cultura humana, de uma cosmovisão mais consciente. Daqui se edificam egos e egoísmos, ganâncias e vaidades fúteis. Daqui emerge o princípio da acumulação, porque nestes estádios primários nunca há suficiente e mesmo o muito é pouco e há sempre necessidade de mais.
Esta postura simples elementar, por um lado, ou até notoriamente elaborada, por outro, manifesta-se em vários setores e círculos sociais. Deles temos tido repugnantes demonstrações e revelações: dos negócios à política; da banca à justiça, do futebol ao protecionismo legislado… Relações promíscuas nas cúpulas e nas elites que minam a prosperidade global do país. Há um polvo que prende e revolta. Que afasta os eleitores da política, que promove os populistas e os populismos, que cega e ludibria as massas.
A proteção a alguns rostos esconde círculos, redes e canais de relacionamento que gravitam em torno de rostos que são uma espécie de “pivots de distribuição”. Exige-se, portanto, lucidez e clarividência para a capacidade de leitura dos eventos e factos. Os espetáculos degradantes a que temos assistido, preconizados por alguns desses “pivots de distribuição”, revelam toda a verdade e demonstram o quanto estão protegidos e bem relacionados.
Sintomatologias idênticas enformam as dinâmicas estabelecidas no país nos vários setores. Os círculos sociais – sejam eles de que natureza forem – reprimem a emergência de alternativas, ideias novas, conceitos diferentes e dinâmicas diversificadas; toldam a nossa imagem e a nossa reputação internacional; envergonham-nos e projetam-nos para uma representação de desconfiança a todos os níveis.
O futebol é o único setor que constitui um efetivo agremiador das massas. Mais uma vez, a futilidade e o trivial. O vazio. Por isso, foi tão refrescante a intervenção de Bruno Lage na conferência de imprensa sobre a vitória no campeonato nacional de futebol. O treinador do Benfica fez um dos maiores serviços públicos à tomada de consciência cívica, ao referir a importância de cada cidadão na alteração do estado da nação. Bruno Lage defendeu que se a ambição, a determinação e a exigência dos adeptos do futebol for trazida para o plano político e social, “seguramente vamos ser um país muito melhor”.

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