Quando em 2015 António Costa, atual PM, se lembrou de transformar uma derrota eleitoral numa possibilidade de liderar o Governo, aproveitando uma maioria de esquerda no parlamento, acenou aos seus parceiros “geringonços” com uma única ideia: lutar contra Pedro Passos Coelho (PPC) e as suas políticas neoliberais, nomeadamente adotando as bandeiras do BE e da CDU. Hoje, vemos um país paralisado, com greves atrás de greves, em que praticamente todas as classes profissionais reclamam de promessas não cumpridas, que desinvestiu na saúde, na educação, nas infraestruturas e com a economia a desacelerar. Os portugueses estremecem e questionam-se sobre os reais benefícios da geringonça.
No entanto, há um assunto que é verdadeiramente representativo do engano em que vivemos que é o das ajudas a bancos e a desresponsabilização do Estado, do regulador e do MP sobre as falcatruas que por aí se têm feito no setor financeiro. Pelo meio, Ricardo Salgado diz, em entrevista, que a culpa não é dele, Freitas do Amaral esclarece, a pedido do Banco de Portugal, que aquilo que tinha dito sobre não existir só um culpado afinal não era bem assim, e Carlos Costa, no parlamento, afirma que não tinha participado em nenhuma decisão de risco quando era gestor da CGD – estava no conselho de administração, mas não participava.
Em 2015, PPC dizia que o dinheiro do Fundo de Resolução usado para recapitalizar o Novo Banco era emprestado pelo Estado e estava a render: “É dinheiro que está a render, por isso não estamos a perder nenhuma oportunidade”. Aliás, acrescentou, “quanto mais tarde esse dinheiro que emprestámos chegar aos cofres do Estado” mais a República vai receber em juros.
Bom, foi o que se viu. O Novo Banco andou de prejuízo em prejuízo (mostrando como foi apressada a resolução e como nem as contas fizeram), o Estado lá foi emprestando dinheiro, “a juros”, como diria PPC, o banco acabou oferecido à Lone Star, com um acordo brilhante em que eles podem ir pedindo dinheiro ao fundo de resolução – emprestado pelo Estado a “juros”, certo PPC? –, até que em 2019, depois de mais prejuízos gigantescos, o banco pede mais 1.2 mil milhões de euros. O Estado, contra tudo o que os “geringonços” prometeram, decide “emprestar a juros” esse dinheiro ao Fundo de Resolução, fixando um prazo de 30 anos. Lá está, fazendo justiça às palavras de PPC: “quanto mais eles demorarem a pagar, mais ao Estado ganha em juros”. E o que diz o novo PM, António Costa, que ascendeu ao lugar porque, dizia, era muito diferente de PPC e, por isso, conseguiu capitalizar com o ódio de BE e PCP ao “governo da troika que entrega os nossos interesses ao grande capital”?
Simplesmente isto (debate quinzenal de 7 de março): “Quanto ao Novo Banco, …, o Estado simplesmente emprestou dinheiro para ser pago em 30 anos pelo Fundo de Resolução. Há uma enorme diferença entre fazer despesa e conceder um empréstimo”. Lá está. António Costa, mimetiza os dichotes de PPC afirmando que o dinheiro “emprestado” ao Fundo de Resolução é um “investimento a juros”, isto é, “quanto mais tarde pagarem, mais dinheiro recebemos”. É, portanto, um bom negócio. PPC estás vingado.
De boca aberta, a deputada Heloísa Apolónia, dos Verdes, que apoia a Geringonça, mas revela muita dificuldade para engolir sapos, ainda lhe atirou à cara: “Como é que tem cara para dizer ao país que não há mais dinheiro para a saúde, para a educação, para a cultura, que não há dinheiro para a contagem de todo o tempo de serviço dos professores e outras classes profissionais, mas depois quando se trata de injetar capital na banca privada, neste caso o Novo Banco, há sempre dinheiro? Já é tempo de deixar de fazer das pessoas tolas … Acontece que o Fundo de Resolução está a ser alimentado pelo dinheiro dos contribuintes. O PSD e o CDS foram responsáveis pelo processo de resolução do BES desastroso” e “o governo do PS terminou o trabalho com a venda a um valor simbólico, com um contrato desastroso”.
“Ora, isso que interessa?”, terá pensado o Primeiro-Ministro ao ouvir a indignada Heloísa. “Você não percebe nada de negócios e isso de enganar as pessoas não é crime. É feio, concordo. É até aborrecido, não digo que não. Mas não é crime e, veja bem sua desmiolada, nós fizemos tudo isso que você diz e ainda subimos nas sondagens. De que te queixas? Os Portugueses não querem saber nada disso, desde que o Benfica ganhe e… sei lá, isto vá andando devagarinho. Somos um país poucochinho.”