João Gabriel Silva deixa a reitoria da Universidade de Coimbra (UC) no próximo dia 1 de março, oito anos após ter assumido o cargo pela primeira vez. Fê-lo num período difícil: em 2011, a instituição tinha um saldo negativo orçamental de quase sete milhões de euros. E, nesse mesmo ano, era assinado o memorando da troika. Agora, já com as contas equilibradas, lembra que quem o suceder terá de enfrentar uma quebra demográfica “catastrófica”. A solução é atrair mais estudantes internacionais. E premiar a meritocracia.
Entrevista: Vai deixar a reitoria da UC no próximo dia 1 de março. Que balanço faz destes dois mandatos?
Saio satisfeito. Saiu-me na rifa um período difícil, porque entrei em março de 2011 e, uns meses depois, era assinado o memorando da troika. Não estava nos planos. E, mais do que isso, a universidade, na altura, estava financeiramente com dificuldades – em 2011, o saldo negativo orçamental da universidade foi de quase 7 milhões de euros. Portanto, como imaginará, iniciar um período da troika com as contas desequilibradas é quase a tempestade perfeita. Mas conseguiu-se.
Como?
No primeiro mandato, o desafio foi conseguir aguentar e evitar os efeitos dos cortes orçamentais, que foram grandes. E no segundo mandato, que foi quase todo com o atual governo, as coisas não têm sido mais fáceis porque os cortes orçamentais continuaram. A maior parte das pessoas pensa que houve aumento – e, do ponto de vista nominal, houve alguma reposição do orçamento. Mas, só para dar dois ou três exemplos, quando voltámos a pagar os salários por inteiro, o governo só nos repôs parte daquilo que era necessário para pagar. Por exemplo, as propinas, de que agora se fala muito, estão congeladas há três anos, o impacto em 2019, é algo na casa dos 600.000 euros. E compensação? Zero até ao momento. Estive, recentemente, a fazer as contas e entre 2010 (portanto o ano anterior à minha chegada) e o ano de 2018, a diminuição de financiamento efetivo de 18 milhões de euros. Ou seja, neste momento, em 2019, temos menos 18 milhões de euros em, termos efetivos, do que aquilo tínhamos em 2011.
E porquê?
Quando houve corte nos salários, se nos tivessem retirado do orçamento apenas aquilo que correspondia aos cortes salariais, era neutro do ponto de vista da universidade. Mas não: o corte orçamental foi superior aos cortes salariais e nós tivemos que aguentar a diferença. E agora, ao repor, como só nos dão parte do dinheiro, nós temos que aguentar a outra parte. Somando estas discrepâncias, desde 2011 até agora, é que dá os 18 milhões de euros, numa base anual. Significa que este ano temos menos 18 milhões de euros, em termos de efetivos, do que tínhamos em 2011. Dezoito milhões de euros é muito dinheiro.
Então concorda com um CRUP quando diz que ensino superior passou por uma fase de estagnação…
Sim, absolutamente. Do ponto de vista orçamental, têm sido anos de decréscimo contínuo. A velocidade do decréscimo é mais baixa agora, com o governo atual. Mas continua a ser de decréscimo: como as expectativas estão super elevadas, é muito mais difícil de gerir do ponto de vista das pessoas e daquilo que elas estão à espera, do que no primeiro mandato.
Felizmente, na UC, temos conseguido, não só escapar às agruras piores da troika, como agora conseguir ir bem mais longe do que aquilo que os meios financeiros que o governo nos colocou à disposição permitiriam, porque conseguimos angariar muita receita que não existia antes. Portanto, nós temos conseguido, em receita própria, compensar aquilo que têm sido os sucessivos cortes de financiamento do Estado.
Toda a entrevista na edição impressa de hoje, 23 de janeiro, do DIÁRIO AS BEIRAS