Grande entrevista – “Já pagámos mais de 31 milhões às empresas” na reconstrução das casas ardidas

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Qual é o ponto de situação do processo de reconstrução das casas ardidas nos incêndios de outubro de 2017?
Nós recebemos, até este momento, 1311 pedidos de apoio para reconstrução de habitações ardidas. Destes, foram aprovados 823 pedidos, sendo que 25 são de apetrechamento – para famílias que viviam em casas arrendadas e não têm direito à reconstrução da habitação, mas têm direito ao apetrechamento de uma nova casa arrendada – e 798 são de reconstrução de habitações, e incluem também o apetrechamento. Quanto à reconstrução de casas ardidas, 446 pedidos são relativos a reconstruções parciais e 350 a reconstruções totais. Isto significa que houve 488 pedidos de apoio que não tiveram acolhimento no Programa de Apoio à Recuperação de Habitação Permanente.

Em que fase estão os pedidos de apoio aprovados?
Dos 798 pedidos de apoio aprovados, 458 habitações estão concluídas, 332 estão em execução e 7 não têm qualquer execução. Estas 7 representam uma verba de 80 mil euros e são apoios em dinheiro que concedemos às famílias, ou seja, as famílias assumiram fazer estas obras e ainda não fizeram. Mas em outubro este número era de 150 mil euros. As famílias reportam grandes dificuldades em contratar empreiteiros para fazer pequenas obras. Das 455 habitações já concluídas, 340 foram reconstruções parciais – mas há reconstruções parciais que são obras grandes – e 115 são reconstruções totais.

Que razões levaram a que parte dos pedidos de apoio, 488 até agora, não fossem aprovados?
É muito importante explicar, porque isto levantou alguns problemas. É preciso perceber que estas pessoas também foram vítimas, perderam a sua casa de férias, de fim de semana, mas o problema é que o programa de apoio não as considerou prioritárias, deu prioridade à habitação permanente. E o que é a habitação permanente? Segundo acórdãos de tribunais e o que é comummente aceite, a habitação permanente é aquela casa onde dormimos, onde fazemos as refeições, onde recebemos os amigos, de forma diária. Por exemplo, uma pessoa trabalha em Lisboa, onde vive numa casa arrendada, e a única casa própria que tem é na Pampilhosa da Serra, onde vai ao fim de semana. Neste caso, a sua habitação permanente é em Lisboa e a casa que tem em Pampilhosa da Serra não deixa de ser uma segunda habitação. Ou um emigrante que tem o domicílio fiscal em Portugal, até tem consumos de eletricidade na casa – porque tem os sistemas de rega ligados ou as arcas frigoríficas a funcionar –, mas a verdade é que a sua habitação permanente é no estrangeiro.

Muitos pedidos de apoios recusados são relativos à segunda habitação?
Dos 488 pedidos de apoio recusados, 206 casos são de famílias que não viviam na habitação de forma permanente. Isso aconteceu com maior expressão em Pampilhosa da Serra, onde arderam muitas casas que não eram habitações permanentes e algumas até estavam devolutas.
Depois há outro problema. Em 169 situações as famílias não conseguem comprovar a titularidade das casas, não conseguem provar que são donas das habitações. É natural que algumas destas situações ainda se venham a resolver, por exemplo com as partilhas de heranças que ainda não foram feitas, mas há outras situações mais complexas, em que os herdeiros e os familiares não se entendem, que dificilmente se resolverão. Mas à medida que estas situações se resolverem, o apoio será concedido.
Há situações muito complicadas. Por exemplo, temos uma família em Tábua que vive naquela habitação há 30 anos e não sabe quem é o dono da casa nem tem contrato de arrendamento. Sugerimos que recorressem ao usucapião, mas a família não quer, porque não quer tomar posse de algo que não é seu. E não é a única situação. Temos ainda casos em que as habitações são de familiares, e quem lá vive só pode ter apoio à reconstrução se esses familiares lhes fizerem o usufruto da casa, e eles não querem.

Houve pessoas que desistiram do apoio?
Temos 57 situações de desistência. Há pessoas que se candidataram a apoio mas depois concluíram que o seguro cobria a totalidade dos danos e desistiram do pedido. Há também situações em que pediram 1000 euros, mas depois viram que legalizar as casas ficava mais caro e desistiram. Noutros casos, houve instituições de solidariedade que ajudaram as famílias a fazer as pequenas obras.
Temos ainda 27 casos de recusa de apoio por ilegalidade urbanística, ou seja, as habitações estão em áreas da Reserva Ecológica Nacional (REN) ou da Reserva Agrícola Nacional (RAN), e não é possível legalizar, mesmo com base nas regras da altura em que as casas foram construídas, pois hoje as regras até são bem mais apertadas. Este problema surge muito com estrangeiros, por exemplo em Arganil e Seia, que tinham casas reconstruídas totalmente ilegais. No início estas situações de ilegalidade urbanística eram o triplo ou o quádruplo, e conseguimos legalizar muitas.

Portanto, há uma multiplicidade de situações.
Há depois outras situações em que as casas estão penhoradas, as famílias entraram em falência e as casas passaram para a posse dos credores. Nestes casos os apoios iriam para os credores. Este processo é um arco-íris, a sua complexidade corresponde às cores do arco-íris, reflete o que é o nosso país, o interior rural, o nosso Portugal. Muitas famílias não têm as casas em seu nome, constroem em locais onde não podem construir e ampliam as casas sem registar na caderneta predial. Temos casas em que na caderneta predial tinham 300 m2, mas na realidade tinham 600. Nestes casos, se é possível legalizar a área efetiva, permitimos que a família o faça, mas tem que pagar o respetivo IMI.

E a situação das pessoas que estão em lares?
Pode chocar-nos considerarmos que um lar é a habitação permanente, mas pela lei é assim, e a casa passa a ser a segunda habitação. A lei determina que quando uma pessoa muda de habitação, ou quando muda para um lar, passado 15 dias deve mudar o seu domicílio fiscal. É das situações que mais nos custa, dizer que não apoiamos, porque muitas das vezes a casa que ardeu é o único reduto de ligação à terra, à família, aos vizinhos. Mas devo dizer também que, sobre estas situações, tivemos muitas denúncias. Houve casos em que quando iniciamos as demolições das habitações – porque há empresas que em simultâneo estavam a fazer os projetos e as demolições – os vizinhos vinham dizer que as pessoas já não viviam lá à data do incêndio, viviam num lar ou com um filho.

Se não fossem as denúncias estas reconstruções tinham avançado?
Poderiam até ter avançado, mas o processo tem outras fases que nos permitem detetar estas situações como a fase de elaboração dos projetos. Os projetos têm que ser aprovados pelas famílias e tivemos que reunir com as pessoas, para saber se pretendiam manter a casa em altura ou não, como se fazia a casa de banho, que muitas não tinham, o que por vezes nos obrigou a fazer ajustes ou até a aumentar a área das casas. Demora muito tempo, até chegarmos a um consenso, mas não podemos deixar de dar este tempo às famílias e não podemos avançar sem que elas aprovem o projeto. Muitas das vezes, nestas reuniões com as famílias, num ambiente mais informal, nós percebemos que as pessoas já não viviam lá mas num lar ou com os filhos.

FOTO DB/CARLOS JORGE MONTEIRO

E como é que fazem essa gestão?
Temos que conciliar a urgência com a complexidade do processo e o cumprimento da lei. Tínhamos duas formas de executar este processo. Podíamos fazer a análise documental e ir ao terreno fazer a verificação física antes de lançar os procedimentos concursais, mas precisaríamos de mais de um ano só para isso. Então o que é que fizemos? Fizemos a análise documental e as situações que estavam completas, com confirmação por escrito do senhor presidente da câmara, foram incluídas nas empreitadas, mas também colocamos nos procedimentos consensuais a possibilidade de revermos os critérios de enquadramento no Programa de Apoio. Ou seja, quando lançamos as empreitadas, cujo preço base previa um valor por metro quadrado, as demolições e os projetos de arquitectura e especialidades, no próprio procedimento concursal estava prevista a possibilidade de revisão do número de metros quadrados. Porquê? Porque nós sabíamos que iríamos ter que reconfirmar, nas reuniões com as famílias, nas visitas aos locais, se estavam cumpridos os critérios de apoio. Decorrente deste trabalho de maior proximidade, retirámos das empreitadas 67 casas por não cumprirem os critérios para apoio, num universo de 410 habitações. Assim, inicialmente a empreitada lançada pela CCDRC era de 410 casas, neste momento são 343 casas.

Há casos em que têm que indemnizar empreiteiros?
Não, porque a revisão dos metros quadrados estava prevista no próprio concurso que o Tribunal de Contas visou. Reduzimos o objeto contratual – teríamos problemas era se tivéssemos aumentado – por motivo não imputável às empresas de construção nem à CCDRC, conciliando a lei e a urgência de fazer chegar o apoio apenas a quem precisava, nós lançamos o procedimento com a salvaguarda de que durante a execução, até antes do início das obras propriamente ditas, pudéssemos reconfirmar as condições de apoio. Mal seria que num processo como este, nunca visto, as empresas de construção pedissem indeminizações, mas nunca nenhuma delas sequer usou esse termo.

Quais as verbas envolvidas neste programa de apoio à recuperação das casas que arderam?
O Programa de Apoio à Recuperação de Habitação Permanente envolve verbas, de Orçamento do Estado, de cerca de 57 milhões de euros, que incluem as demolições, projetos de arquitetura, projetos de execução, licenças, empreitadas, apetrechamento e fiscalização. Neste momento a nossa execução física e financeira é de 57%, porque já pagámos às empresas mais de 31 milhões de euros. A Inspeção Geral de Finanças tem que validar estes números, porque, para este programa de apoio, o orçamento da CCDRC teve que ser reforçado em 60 milhões.

FOTO DR

Recuperação das casas “deverá ficar totalmente concluída em junho”

Disse que este processo está agora numa nova fase?
Neste momento temos as obras no terreno e o trabalho é sobretudo de acompanhamento, fiscalização e monitorização. A nossa obrigação é acompanhar as famílias que estão a fazer as obras por elas próprias, fazendo as verificações e pedidos de pagamentos. Para verificar as obras das empreitadas da CCDRC – onde entraram as obras com orçamento superior a 25 mil euros -, temos uma empresa de fiscalização, mas também andamos no terreno. É muito gratificante este trabalho de acompanhamento no terreno, de proximidade, porque nas várias centenas de visitas que fiz até agora não tive ninguém que reclamasse. As pessoas entendem que uma casa não se faz num dia, num mês, em meio ano, demora a fazer. Se acrescentarmos a isto as complexidades legais, a contratação pública, o visto do Tribunal de Contas, os projetos, etc…. mas são passos que não podíamos saltar. Agora todas as semanas estamos a entregar casas. Temos 334 casas em obra, mas em diferentes fases de execução, algumas já nos acabamentos. O ideal era que na Páscoa a esmagadora maioria das famílias estivesse já nas suas casas.

Afirmou, logo a seguir aos incêndios, que seria muito bom se este processo estivesse concluído no verão de 2019?
O processo só deverá ficar totalmente concluído em junho, no máximo. Os contratos de empreitada tinham a data de 31 de dezembro, mas como em qualquer contrato, as duas partes podem, em acordo, alterar as condições do contrato. Nós já fizemos a prorrogação graciosa dos contratos, porque os empreiteiros justificaram o facto de não terem cumprido o prazo de 31 de dezembro com motivos atendíveis, que a lei prevê, e que foram analisados juridicamente. Devo dizer que a data de 31 de dezembro era uma data ambiciosa, mas foi uma maneira de colocar pressão no processo. A data máxima de prorrogação foi junho de 2019. Alguns contratos acabam antes, em março, abril ou maio, mas a data mais alargada, o limite, é junho. Em centenas de casas é difícil ter um conhecimento absoluto de todas as situações. Por exemplo, as habitações de estrangeiros estão tão isoladas que não têm sequer vizinhos. Depois houve dificuldades para comprovar a titularidade das casas. Temos uma casa, em Gouveia, em que a família demorou cinco meses para aprovar o projeto. Volto a reafirmar que se no verão de 2019 tivermos o processo concluído, se estas famílias já tiverem um lar, mais do que uma casa, todos poderemos considerar que foi um sucesso.

Apesar das dificuldades, considera que este processo é um sucesso?
É um sucesso que se deve às juntas de freguesia, em primeiro lugar, que têm um trabalho extraordinário junto das pessoas, às câmaras, e à CCDRC e ao Governo. Mas à CCDRC chega muito trabalho já feito pelas juntas de freguesia e pelas câmaras, e devemos lembrar que as autarquias têm equipas pequenas, que não foram aumentadas para fazerem este trabalho extraordinário, e que continuam a fazer todo o restante trabalho, como as outras autarquias, como por exemplo as candidaturas ao Portugal 2020, as suas festas, os seus projetos, evidentemente com prejuízo da vida pessoal dos seus funcionários. Devo dizer que até final do ano passado os nossos sábados eram passados em reuniões nas autarquias, e às vezes começávamos às nove da manhã num sítio e acabávamos às duas da manhã noutro sítio.

A CCDRC também tem uma equipa pequena?
A CCDRC agarrou este processo de corpo e alma, mas também nós temos uma equipa muito pequena – são 10 pessoas – a trabalhar nesta área, o que reforça o que vos disse, que não conseguiríamos fazer isto sem o apoio das autarquias. São as autarquias que recebem os pedidos de apoio e validam a informação, é obrigatória a validação pelo senhor presidente da câmara, a dizer que devemos conceder o apoio, mas a responsabilidade final é nossa, a última pessoa a pôr a assinatura é a presidente da CCDRC.
Felizmente, para além daquelas situações que detetámos antes do início da obra – o que não obriga as pessoas a devolver as verbas –, só há duas situações que já detetámos com obra, mas não avançada. Nas situações complicadas e nas que forem surgindo, se se vier a detetar que há apoios indevidos, atuaremos de acordo com a lei. Temos tido várias denúncias, todas são investigadas, e muitas são infundadas.

A não aprovação de alguns pedidos gerou descontentamento?
Nós só temos duas pressões, que são fazer chegar a ajuda a quem precisa e cumprir a lei. De resto, nada nos demove disto, nem as peças de televisão, nem as peças jornalísticas, nem as manifestações. Nós aceitamos as críticas numa perspetiva de nos fazerem melhorar. Há pessoas que receberam um não, manifestam o seu descontentamento, e temos que entender, porque essas pessoas foram vítimas e estavam convencidas que iriam ser apoiadas, até pela maneira como politicamente o programa foi transmitido. Não devemos pensar que estas pessoas se tentaram aproveitar quando fizeram o pedido de apoio. Por isso, quando me perguntam se mandei esses casos para o Ministério Público, digo “era o que faltava, as pessoas serem vítimas duas vezes”.

O MAAVIM – Movimento Associativo Apoio Vítimas Incêndio Midões tem dito que há casas que são entregues inacabadas, sem terem as ligações à rede elétrica e de esgotos.
O que é para si uma casa inacabada? Falta uma janela, a porta, não tem telhado? Quando compra uma casa, quem é que pede a ligação da água e da luz? É quem compra a casa. E nestes casos, ia ser a CCDRC a pedir? Por lei, quem é obrigado a pedir a luz e a água, até porque é obrigado a identificar-se, são as pessoas que têm a casa em nome delas. A MAAVIM não tem qualquer papel institucional no processo de reconstrução das habitações. Aceitamos e agradecemos as críticas quando fazem sentido. De resto, guardamos a energia para ajudar quem precisa.

Como está a decorrer o processo relativo à recuperação das segundas habitações?
Esse processo é da alçada das câmaras, não da CCDRC. Para a recuperação das segundas habitações o Governo criou um apoio diferente, através do Fundo de Apoio Municipal (FAM). Cada município definiu um regulamento para apoiar a reconstrução das segundas habitações, que é diferente de autarquia para autarquia. Este processo já começou em Pampilhosa da Serra, Arganil, Tondela e vai também iniciar-se em Oliveira do Hospital. A CCDRC apenas confirma se as habitações indicadas estavam na lista das casas danificadas pelos incêndios. É preciso dizer que os apoios que as câmaras decidem dar são a fundo perdido, não são empréstimo, por isso as câmaras estão a endividar-se, através dos empréstimos do FAM, para apoiar a reconstrução das segundas habitações.

FOTO DB/CARLOS JORGE MONTEIRO

“O maior sucesso foi a união da região em torno de um projeto”

Se voltasse a iniciar este processo, fazia tudo da mesma maneira ou mudava alguma coisa?
Em primeiro lugar não sei se o aceitaria. Eu devia estar um pouco louca quando aceitei um desafio destes. Acho que as pessoas ainda não entenderam que quem trabalha nestes processos deixou de ter vida e eu e a minha equipa vivemos obcecados com isto, é impossível quem tem um coração não viver. Eu faria as coisas mais rápido ainda se fosse agora, por causa da experiência que tenho. Mas apesar de o processo ter sido feito com muita urgência, foi sempre muito ponderado, assessorámo-nos juridicamente, com apoio externo, temos todas as decisões juridicamente fundamentadas.

E faria tudo da mesma forma?
Em geral, sim. Não estou a ver áreas onde eu mudaria. Contudo investiria muito mais tempo no contacto com as famílias porque, no início, deixámos isso às câmaras e as câmaras padecem do mesmo problema que nós: têm poucos recursos, nem sempre conseguiam estar presentes na vida das famílias. E houve ali um momento em que eu tenho a noção que devíamos ter dado um bocadinho mais de acompanhamento. Mas nós não conseguíamos, não tínhamos equipa, mas tínhamos que arranjar maneira. Onde eu tinha apostado mais era num contacto muito mais próximo com as famílias. Deixámos isso às câmaras, e bem, até porque o que está previsto na lei é que sejam as câmaras a interagir com as famílias, mas cuidava de termos um apoio permanente e muito, muito presente no território. Porque as famílias só querem saber que estamos a cuidar delas, demore o tempo que demorar.

Pensa que houve um tempo em que as famílias acharam que ninguém queria saber?
O que eu hoje teria feito de diferente era, desde o início, ter equipas permanentemente no terreno a informar as famílias, era um trabalho de maior proximidade. Porquê? Porque notei, e isso é uma crítica que assumo, que houve um momento em que as famílias deixaram de acreditar e foi difícil voltar a conquistar as famílias.

Vitórias e derrotas?
A maior derrota, até pessoal, foi a determinado momento sentir que as famílias já não acreditavam, sentir que com um bocadinho mais de tempo e de esforço nós tínhamos evitado que as famílias se tivessem sentido abandonadas.
O maior sucesso foi a união da região em torno de um projeto. Apesar de todos os ataques, de todas as críticas, algumas legítimas, nós estivemos sempre unidos neste processo. O que nos uniu foi servir as pessoas que precisavam. Uma coisa que eu levo para toda a vida é uma gratidão extraordinária à equipa da CCDRC, às equipas das autarquias, aos autarcas, e o facto de terem trabalhado de forma tão leal connosco. Aqui não há equívocos, não se esconde informação, partilhamos tudo, sofremos em conjunto. Este é o meu maior sucesso de vida: num processo complexo, com tantos atores, ter a solidariedade e a lealdade desses autores.

Em relação às empresas como está o processo?
Está bom. Abrimos um aviso de concurso que é o REPOR, que terminou a 31 de outubro, para a reposição da capacidade produtiva diretamente afetada pelos incêndios, que tinha uma dotação de 100 milhões de euros de Orçamento do Estado. Na reposição das condições anteriores aos incêndios não houve fundos comunitários. Foram submetidas 422 candidaturas, foram aprovados 342 projetos que representam um investimento de 115 milhões de euros e um apoio do Orçamento do Estado de 90 milhões de euros. Já temos pagamentos num montante de 35 milhões. Isto permitiu reter mais de 3000 postos de trabalho. Temos ainda em análise 38 projetos.Foi um dossiê que correu muito bem. As empresas estão mais organizadas, mais habituadas à parte burocrática.

Houve uma aposta em revitalizar estes territórios?
Na altura, o Governo criou um programa que se chama “Atrair investimento empresarial”, só para o território dos incêndios, com fundos comunitários. E qual foi a ideia? Em vez de repormos só o que ardeu tentamos diversificar a base económica destes territórios e atrair empresas novas e permitir às que cá estão, se quiserem, aumentarem a sua capacidade de produção e inovarem. Tinham de ser novos projetos e só nos territórios afetados pelos incêndios, e já aprovámos 479 projetos de investimento que envolvem um investimento de 330 milhões de euros e envolvem de fundos comunitários 196 milhões de euros, já pagámos 10 milhões de euros e os postos de trabalho a criar estima-se que sejam de dois mil. Estamos a falar de territórios que estavam martirizados pelos incêndios e tivemos uma procura louca. Mais, houve empresas que tinham projetos no REPOR e submeteram candidaturas no Atrair.

Os empresários e as pessoas estão preparados para esse desafio?
Uma coisa que me marcou muito neste processo foi a força extraordinária das pessoas, então dos empresários e das famílias, esta resiliência e este não baixar de braços…
E uma coisa que me choca muito neste processo é a solidão dos mais idosos que não se resolve com a reconstrução das casas. Nós estamos a fazer o mais fácil que é reerguer o que caiu, mas estes territórios precisam de uma estratégia de desenvolvimento integrado a sério. A maioria das mulheres não têm dentes. Isto é algo que nos devia chocar enquanto portugueses. Há pouca coisa que me emociona agora, mas isso é algo que me faz sangrar o coração.

Ficou mais fria depois deste processo?
Fiquei, mas continuo a acreditar na Humanidade e que vale a pena ser generoso.

A partir de junho, quais vão ser as prioridades da CCDRC?

Começarmos a preparar o Centro 2030. A presidente da CCDRC para além de ser a responsável da equipa dos incêndios, continuou a fazer o que os outros presidentes das CCDR fizeram. Reprogramámos o Programa Operacional Regional, tive uma fase muito intensa de trabalho com várias reuniões em Bruxelas, ainda tivemos tempo de ganhar prémios internacionais na Europa e a CCDR tem projetos financiados por iniciativas comunitárias e continuou a trabalhar para que possamos usar o que resta do Centro 2020 para começarmos a preparar o Centro 2030, o próximo quadro comunitário plurianual. Também conseguimos regularizar todas as situações dos trabalhadores precários, o que é muito bom, porque não basta exigir trabalho às pessoas, é preciso dar-lhes condições de trabalho, e tivemos ainda muito envolvidos na definição do Plano Nacional de Investimentos 2030, fizeram-se muitas reuniões na região.  E estamos a executar o Centro 2020 que tem neste momento uma taxa de compromisso de 59% e de execução de 20% que, não sendo a execução que gostaríamos de ter, é dos programas operacionais regionais com maior execução na Europa. O nosso grande objetivo é tentar aproximar a execução ao compromisso e continuar a aprovar porque o nosso objetivo é ter 95% dos fundos do centro 2020 comprometidos em 2019 e ter uma taxa de execução de 40%. É uma tarefa ambiciosa e um ano de muito trabalho em diferentes frentes.

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