A candidatura de Coimbra a Capital Europeia da Cultura será decerto uma boa iniciativa. Previsível e inevitável, porquanto a cultura coimbrã se apresenta como uma porta aberta a séculos de história. Mantê-la derradeiramente fechada seria, pois, incompreensível. E notícia invulgar seria Coimbra não se apresentar a concurso, seria não pegar nesses séculos de história para projetar o seu futuro.
Sobre a candidatura, quase nada conhecemos. Pouca mobilização tem gerado e o que sabemos é o que vai sendo publicado pelos jornais. Reuniu com agentes culturais locais, criou conselhos, fez visitas e mais uma série de coisas. Mas parece estar a brotar uma preocupação assente no facto de Coimbra ter descartado agir em comunidade, de forma agregadora e inclusiva, velando pelo apoio regional para evitar aquilo que acabou por acontecer: vários distritos próximos concorrem “contra” nós. Fico com a perceção de que pode ter sido mais uma oportunidade perdida para afirmar a liderança de Coimbra no contexto da Região e do País.
As dezenas, senão mesmo centenas, de associações que em virtude das minhas funções profissionais tenho visitado, e com quem diariamente cultivo um diálogo com a proporção de quem tem uma boca e dois ouvidos, não falam no assunto, não se entusiasmam com o tema. Praticamente ninguém! – ninguém é pronome indefinido mas palavra bem definida. Vejo-os de costas voltadas para este sonho. E isso entristece-me. Reconheço o esforço que a comissão responsável pela candidatura – com gente tão capaz e plural – tem feito para produzir um trabalho sério. Mas algo falha retumbantemente e pergunto-me qual a razão…
Mede-se a eficácia das políticas culturais não pelos foguetes lançados mas pelo que estas projetam no futuro. Se nada restar no dia seguinte é porque o entretenimento venceu o essencial, triunfando a espuma dos dias que borbulha e desaparece como num passe de mágica.
Por esta altura, meses volvidos, já deviam as traves mestras da candidatura ser conhecidas, a fim de nortear a ação de quem nela se empenha e para que os eixos programáticos possam florir em convergência. Julgo haver duas iniciativas que a valorizariam, uma de forma e outra de conteúdo.
A possibilidade de reservar uma parte substancial do orçamento para acomodar as ideias geradas pela massa crítica coimbrã, com o formato que é seguido nos orçamentos participativos, é uma ideia que merece ser trilhada. Isso sim, seria ação. A coragem não pode ser uma palavra de retórica. É preciso ousar. E não ter medo do que daí possa vir. Imagine-se um maestro que não deixa tocar os músicos com medo de que assim não se ouça a sua batuta…
A imprensa, enquanto serviço público de inclusão, tem sido a verdadeira força de divulgação do que acontece no mundo. Coimbra é talvez o mais importante baluarte da imprensa regional, com vitalidade e mobilização. Regista-se inclusivamente sucesso em plataformas noticiosas digitais, revelando uma reação à dificuldade dos tempos atuais. Será um ato menos conseguido se esta candidatura não cuidar da inclusão dos agentes da comunicação num plano que robusteça a sua vocação de liberdade, se não servir de alavanca a novos projetos, se não expuser a simbólica história desta mesma imprensa e se com isso não lhes propuser ousar um futuro arrojado.
Com a idade vou ligando cada vez menos às palavras vãs e cada vez mais aos atos e à força que mobiliza. Aprendi – nem sempre da melhor maneira – que a natureza deu ao homem a capacidade de, através do discurso, esconder as suas ideias (ou a ausência delas). Como defendo Coimbra, quero que esta candidatura lhe faça bem. Quero e torço por ela. E para isso não pode ser apenas o evento, mas uma marca que perdura, que fica e alavanca muito mais. Tem de ser uma árvore e não uma folha. Tem de dar fruto, tem de ser uma árvore. Uma árvore.