O caminho que leva ao desenvolvimento de objectos nómadas deslumbrantes permite pensar na revolução total dos costumes quer em saúde, comunicação, aplicação tecnológica, quer em desejos e anseios de cidadania. Um telefone com um conjunto de aplicativos pode incorporar programas que permitam ecografias, monitorização cardíaca, análises. Imaginem o que isto será: um médico sozinho num espaço confinado, pode aceder a meios complementares de diagnóstico que cabem todos na palma da mão e pode ouvir opiniões de outros especialistas que se prestem apenas a plataformas de discussão. A “nuvem” permite armazenar tudo infinitamente. O saber está à distância de um botão. O que pode falhar neste mundo novo é a percepção do que é boa e má informação. Para isso nasceram filtros que codificam ou analisam os graus de credibilidade e os resultados.
Esta revolução democratiza, torna transversais os saberes e carrega muito mais complexidade à comunicação. Os ignorantes terão acesso a pequenos saberes que os confundirão mais que os analfabetos. A aproximação iletrada para os novos saberes é outro patamar da ignorância. Uma informação pantanosa (como a bula de um fármaco) só permite mais obsessões e pânicos a quem constrói seus saberes com medos e inseguranças. Os formados em conhecimentos próximos, como um podologista, um ortopedista, um fisioterapeuta e um enfermeiro, debruçar-se-ão sobre um pé utilizando abordagens que se interpenetram mas podem não coincidir. Todos licenciados, todos com seus telemóveis carregados de meios complementares e todos protegidos por suas ordens e seus pares e clãs, mas cada um carregando suas certezas. O confronto será inevitável. A posição impenetrável do diagnóstico médico é colocada em causa rapidamente e não saberemos, sem a experiência, se bem ou mal. A utilização e prescrição transversal de fármacos trará responsabilidades acrescidas a outros profissionais. Mas o que digo sobre saúde será interessante em desporto, em arquitectura, em economia. Colocados os dados e permitido a utilização de aplicativos que dão mais corpo à máquina, os telemóveis serão o objecto mais importante das próximas décadas na Saúde. Posso ter um a servir de monitor do meu familiar, em casa, directamente ligado ao seu médico. Os telefones continuarão a sua performance na internet e até a permitir conversar com os amigos.
Entre objectos nómadas (carros, relógios, rádios, etc.) há o multiusos telefónico que já constrói novos hábitos, novas causas de acidente viário, novas formas de morrer, novos padrões de amar, conhecer, descobrir saberes, converter a realidade online, motivar denuncias, distrair das relações. Temos de trilhar este caminho na linha da frente, em todas as suas possibilidades e consequências. Não deve projectar-se saúde sem perceber a importância deste objecto no seu futuro. Temos de ser parte integrante da revolução e desenhar estruturas onde ele é um pilar de desenvolvimento.