Não são de hoje as queixas de alguns autarcas sobre o sistema de financiamento dos transportes públicos municipais. No longínquo 2007 podíamos ler nos vidros dos autocarros dos Serviços Municipalizados de Transportes Urbanos de Coimbra – SMTUC – que o governo tinha dado no ano anterior à Carris (Lisboa) mais de 45 milhões de euros, à Sociedade de Transportes Colectivos do Porto (STCP) mais de 16 milhões de euros, e aos SMTUC zero euros. Era Carlos Encarnação o nosso Presidente de Câmara e quem liderava este protesto, numa campanha contra a injustiça de vermos os défices dos transportes de Lisboa e Porto cobertos com os impostos pagos por uma país inteiro, situação que não abrange mais nenhum sistema municipal de transportes urbanos, que recebem alguns apoios pontuais que em nada se podem comparar às indemnizações compensatórias entregues à Carris e aos STCP.
Mas não só. Também empresas privadas de Cascais, Oeiras ou Setúbal receberam as ditas indemnizações. Parece que o entendimento é que só existe serviço público merecedor de compensação nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. Muito, e bem, se queixava Carlos Encarnação, fazendo notar a imoralidade da situação que hoje renasce por causa da prevista diminuição do valor dos passes sociais em Lisboa e no Porto, mais uma vez à custa de todos nós. Essa descida até pode vir a cobrir o país inteiro, uma emenda que em nada diminui a injustiça da questão nacional das indemnizações compensatórias nesta matéria e que relegam os transportes urbanos deste país, com excepção do Porto e Lisboa, a terem de viver das suas receitas e da capacidade de financiamento das respectivas Câmaras Municipais, sem o aval do Estado.
É uma profunda desigualdade de tratamento do Estado para com os cidadãos, que distorce a distribuição dos dinheiros públicos a seu bel-prazer. É óbvio que o serviço público de transporte rodoviário não termina nos limites geográficos das áreas metropolitanas de Lisboa ou Porto, mas só estas recebem indemnizações compensatórias destinadas a cobrir prejuízos em áreas onde qualquer empresa eficiente teria receitas suficientes para prestar um serviço de qualidade. É notório ainda que tempos houve, em Coimbra e no país, que a CDU e o BE se associavam ao PSD e ao CDS neste protesto. Tempos houve em que Manuel Machado, o nosso actual Presidente de Câmara, reivindicava, junto da administração central, a indemnização compensatória, tal como fizeram os seus antecessores João Paulo Barbosa de Melo e Carlos Encarnação. Agora os tempos são outros e as vontades têm de agir em conformidade: agora é tempo de ganhar eleições e alguns já se declararam prontos a pertencer a um futuro governo, pelo que toda a medida destinada a conquistar votos parece adequada.