1 – Tenho uma triste sina: frequentemente se zangam comigo alguns amigos. Tenho outra má sina: frequentemente quem aprecio mete o pé na poça grande. Tenho ainda outra dor de alma: não perdoo e digo o que penso encaixando as consequências mesmo que se percam amizades. Em boa verdade não sou de acumular rancores e sou bem capaz de gostar de alguém que critico muito. Isto tudo a propósito do Carlos Cortes, Presidente da secção regional do centro da Ordem dos Médicos que por ausência de matéria crítica acaba de enviar para milhares de caixas de correio uma revista em bom papel, onde o Carlos Presidente se exibe em mais de 30 páginas de um total de cinquenta, pago pelo Carlos Presidente e com direcção da revista do mesmo Carlos. Os três Carlos acumulam esta proeza, um escolheu o sujeito e outro pagou a despesa e outro promoveu-se excessivamente. E agora já perdi um amigo, mas o Carlos passou-se. Vamos supor que o Carlos foi mal aconselhado e que não viu a revista antes da edição, então deve repensar os bajuladores que o rodeiam porque falta-lhes fronteira. 68 fotos em cinquenta páginas pagas pelas quotas dos colegas é um destempero. Acho que não há um Maduro dentro do Carlos que eu conheço, mas há culto da personalidade nos que construíram a revista. Carlos Cortes tem feito muito pela Secção Regional, tem realizado eventos, tem visitado instituições, tem imensos méritos, mas nós não dizemos de nós mesmos que somos bons – regar o pé compete aos outros, tal como a oliveira não se rega sozinha.
O elogio do próprio é vitupério. Este artigo é do amigo que paga quotas e é médico e está indignado com este desaire, esta utilização indevida do dinheiro colectivo. Entregar uma faca destas aos inimigos é um falhanço de palmatória. O mal está nesse problema português de não gostarmos dos nossos críticos e dar-mos demasiada liberdade aos nossos apoiantes, seguidores, bajuladores ou outros genuflectidos.
2 – Tudo isto vem a respeito de fronteiras e de certezas na minha vida. Outra que tenho é a de que uma geração em fim de carreira não deve adiar o destino dos que ainda tem para andar. A vaidade que leva alguém de sessenta e muitos anos a ser director de uma estrutura de que tem de sair aos setenta deixa-me surpreso. Para que quer alguém mandar alguns meses? Porque não se projecta o futuro com quem o vai protagonizar?
A geração de mais de sessenta e seis anos que domina os CHUC podia por a mão na consciência e permitir um salto enorme para o futuro deixando o futuro desenhar-se com os actores que lá estarão. Porque há-de o avô decidir onde vai morar o neto? A mesma geração que hipotecou em obras públicas e em construções disparatadas, bancos fraudulentos, Instituições amaldiçoadas, a riqueza da nação também quer o topete de hipotecar-nos o caminho? Quando chegar a minha vez (se algum dia chegar) arranco as lápides todas, apago-vos o nome e o tributo, garanto o “erase” da maioria e chamo os jovens a desenhar a estratégia do amanhã. Garanto também que demito a maior parte de vós e crio leis a impedir-vos de ser produtivos onde criaram inomináveis constrangimentos.
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