A luta do homem contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento” (Milan Kundera, escritor expulso do Partido Comunista Checo)
Evoco a memória de meu avô materno José Pereira da Silva, presidente da Câmara Municipal do Porto ( 1925 ) num tempo em que esse honroso desempenho estava, apenas, ao alcance de personalidades da sociedade portuguesa com destaque cultural, social e ético e hoje se fica a dever, sem pretender, de forma alguma generalizar (“vade rertro Satanas!”), ao agitar frenético de bandeiras partidárias por parte de uma juventude que vê nisso uma forma de subir na vida perante o espectro do desemprego ou empregos mal remunerados.
Pela sua participação fracassada na Revolução do Porto ( 1927 ) foi ele deportado político para uma inóspita Angola em que as doenças tropicais e o mau clima ceifavam vidas como quem ceifa searas de trigo em terra lusitana, apenas com a roupa que vestia no corpo e com as algibeiras vazias de dinheiro, obviamente, das modernices dos actuais “offshores”, “em que se esconde o equivalente a um quinto da riqueza produzida” (“Jornal de Economia”, 19/09/2017 ) .
Morreu, este meu antepassado, nessa terra africana com escassos bens materiais por ter sacrificado, em nome dos seus ideários políticos, família, posição social, fortuna. Na actualidade, para perpetuar a sua gente no poder, através de votos nas eleições que se avizinham para conseguir uma maioria que permita governar sem uma “geringonça” a desconjuntar-se e a chiar por todos os lados, António Costa, no Congresso do Partido Socialista do mês passado, desfez-se em promessas para com os jovens, sintomaticamente, sem uma só palavra que seja de esperança para com os velhos, talvez, por este estrato populacional, apelidado de “peste grisalha ” pelo deputado do PSD Carlos Peixoto, nem sempre poder votar por dificuldade em se deslocar às mesas de voto!
Na sua prédica vibrante sobre o futuro que diz esperar para juventude socialista, foi ele calorosa e longamente aplaudido pela mensagem de que, num futuro próximo, radioso de alvoradas de esperança, esses jovens futuros profissionais da política, tomem em suas mãos o leme do destino deste país através de uma profissão bem remunerada e de altas reformas que os recompense de uma vida de “ascetismo”, trazida do hemiciclo de S. Bento em nome do povo e em aparente lutas diárias contra tentações demoníacas, nem sempre vencidas, em que mais do que servirem o país dele se serviram nem que seja à custa desonrosa de escândalos que enchem de manchetes os jornais diários. Bem dita e salutar liberdade de imprensa!
Mesmo sem pretender tomar a nuvem por Juno, vive-se hoje, sem generalizar, mais um vez o escrevo, uma época da política portuguesa que dá razão a palavras premonitórias de Ruy Barbosa, membro fundador da Academia de Letras do Brasil ( 1849-1923 )que perpassaram os anos e atravessaram o Atlântico :“ De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantar-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha em ser honesto”.
Pelo andar da carruagem, tempo virá em que os cidadãos honestos serão apontados a dedo (se é que o não são já!) com palavras de espanto ou mesmo reprovativas : “Olha vai ali um tanso honesto!” Pobre país e pobres portugueses em que a desonestidade, substituindo-se a um hábito enraizado, assume um papel normativo que escapa às teias da lei!