Estive a ler em detalhe os documentos do Orçamento 2018 e das Grandes Opções do Plano 2018-2021 apresentados pelo executivo da Câmara Municipal de Coimbra. Estes documentos mostram, sem nenhuma margem para dúvidas, três realidades que os Conimbricenses devem interiorizar:
1 ) A maioria política que governa a CMC não faz a menor ideia do que é gerir uma câmara, muito menos de uma cidade como Coimbra que tem enormes potencialidades, mas também imensas dificuldades que se foram agravando ao longo dos anos. Mas acima de tudo uma cidade que enfrenta desafios enormes de sobrevivência, dada a competição de outras cidades de média dimensão que, apesar de terem menores potencialidades, se prepararam e foram capazes de dinamizar vantagens competitivas relativamente a Coimbra;
2 ) Não existe no executivo da CMC ninguém que tenha a mínima noção do que é identificar problemas, identificar recursos e, perante a realidade, definir objetivos de médio e longo-prazo e calendarizar, num plano consistente, a forma como vão ser atingidos, mobilizando a cidade para essa tarefa;
3 ) Não há ninguém na CMC que tenha a menor capacidade de raciocínio estratégico e seja, por isso, capaz de antecipar os caminhos que Coimbra pode e deve trilhar para inverter o rumo de degradação e deriva para a insignificância.
Ao ler os referidos documentos fica-se com a nítida sensação de navegação errática (sem rumo definido), provavelmente alterada ao minuto e conforme as circunstância, não sendo possível detetar um vislumbre que seja de reflexão sobre o posicionamento de Coimbra no Centro de Portugal, no país e no mundo, a sua relação com as outras cidades da região, mas também como pode a cidade, perante as enormes potencialidades que tem, ser um elemento diferenciador que permita atrair pessoas, atividade económica e bem-estar.
É um desespero perceber que não há uma única frase, uma tirada mesmo que isolada, uma simples tentativa de formulação de um propósito, um vislumbre de uma ideia (mesmo que não detalhada), etc., que nos permita perceber que há vida, sequer vontade de viver e de se superar, capacidade de transformar e determinação para mudar a sina de Coimbra, na equipa eleita para gerir, por mais 4 anos, a cidade de Coimbra.
Mas, mesmo sabendo que não é preciso ser muito perspicaz para perceber que um dos maiores problemas de Coimbra é a sua economia, a capacidade de atrair empresas, a capacidade de gerar emprego e com isso fixar pessoas, empreendedores, num ciclo virtuoso que ajuda a transformar tudo o resto, fui ver os números para a rúbrica o Orçamento e das GOP relacionada com esta área. Alguma formulação estratégica, como já referi, não foi possível detetar nenhuma.
É inacreditável mas é verdade: Coimbra, uma cidade universitária europeia do século XXI, não tem nenhuma estratégia para atrair investimento. Não faz a menor ideia de como isso se faz, não quer aprender, nem quer ver como fazem as outras cidades por esse mundo fora. Limita-se a meter a cabeça na areia e a declarar, para que todos ouçam (sem conseguir disfarçar o riso), que o iParque é “um sucesso avassalador”.
oimbra não tem estratégia para a Baixa da cidade, pura e simplesmente assiste à sua morte lenta. Coimbra não tem estratégia para o Rio. Coimbra não tem estratégia para o Centro Histórico. Coimbra não sabe que tem uma Universidade e não tira partido dessa mais-valia. Ignora o seu património, monumentalidade e história. Despreza as potencialidades que foi capaz de desenvolver na área da saúde (veja-se o caos que é o CHUC e como aceita que se entre e saia do POLO III da UC através de uma bomba de gasolina).
Não sabendo nada disto, nem querendo coordenar ações, a cidade é um vazio total na capacidade de se diferenciar e, com isso, na possibilidade de desenvolver valências que possam competir com outras cidades e regiões.
Fui ver o detalhe dos números. Senti-me gozado. Não há outra forma de dizer isto. A sério, tudo isto é de uma gravidade SEM LIMITES e não entendo a total ausência de oposição (fico perplexo com o facto de a oposição só dar sinais de si quando há eleições), bem como a tranquilidade com que todos deixam andar.
Vejamos dois casos. Rúbrica 02.001 das GOP – Desenvolvimento Económico e apoio à atividade empresarial. A dotação orçamental para 2018 (total, considerando o financiamento definido e o não definido): 2.4 milhões de euros. Ora, considerando que o orçamento da CMC é superior a 106 milhões de euros, fica claro que este não é, de facto, para este executivo um problema muito grave. No entanto, e vendo em detalhe, verifica-se que desse valor, 661 mil euros corresponde à participação da CMC no Fundo de apoio Municipal e 786 mil euros são para TAPAR o BURACO do iParque, a tal infraestrutura que é um SUCESSO AVASSALADOR. Isto é, restam pouco mais de 800 mil euros para toda a atividade que é, digo eu, o maior problema de Coimbra.
Fico ainda mais perplexo quando registo o valor do financiamento DEFINIDO, isto é, aquilo que é assumido como garantido. Nesse caso o valor para toda a atividade de “Desenvolvimento Económico e apoio à atividade empresarial” no ano de 2018 é 709 mil euros. Olhando em detalhe para as GOP 2018-2021, verifica-se que a CMC se propõe investir: “Marca Coimbra” – 10 euros, “Apoio ao Investimento (iParque)” – 10 euros, “iParque ( 2ª fase)” – 10 euros, “Parque de Taveiro” – 10 euros, “Parque da Palheira” – 10 euros, …, é fantástico aquilo que se imagina que se consegue fazer com 10 euros. Acresce que segundo estes documentos, Coimbra vai investir na “Promoção do Espírito Empresarial da Região de Coimbra” a “exorbitância” de 4.415 euros para todo o ano de 2018: é absolutamente fantástico. No entanto, o “Aeroporto Internacional de Coimbra” (rúbrica 02.008 ) tem outro tratamento orçamental e previsional: 2018 (quase 250 mil euros), 2019 ( 500 mil euros), 2020 ( 2 milhões e quinhentos mil euros) e 2021 ( 9 milhões de euros).
Repito, a situação de Coimbra, a sua degradação e atraso relativamente a outros locais do país é culpa de Coimbra e das opções que faz. Em tudo isto fico abismado com a quase total ausência de oposição, nomeadamente a capacidade de informar as populações sobre esta total falta de senso.
Não querer saber de si próprio é uma coisa que me custa a entender. Não se admirem, portanto, que as empresas, os empreendedores, aqueles que criam oportunidades, escolham outros locais para desenvolver as suas atividades e esta cidade, equipada com uma Universidade de ponta, líder na área da saúde, com uma qualidade de território única, com a monumentalidade e património que possui, com o papel que desempenhou na história de Portugal, continue o seu lento caminho para a insignificância. As cidades antigas não são eternas, também morrem.